Entrevista: Tatá Aeroplano

Músico paulistano comenta sobre seu novo álbum e próximos projetos

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“Não tenho problemas com biografias, inclusive a minha”. Foi assim, em tom de bom humor, que começou meu papo com Tatá Aeroplano, que veio até a redação do Monkeybuzz para conversarmos um pouco sobre seus novos projetos, a banda Cérebro Eletrônico, seu recente envolvimento com trilhas sonoras e seu recém-lançado segundo disco solo, Na Loucura & Na Lucidez.

Ao longo do bate papo, Tatá nos contou também que veio andando até a redação e encontrou no meio do caminho a cantora recifence Rogéria. Nos disse isso mostrando o disco Futuro Em Cores que acabara de ganhar das mãos da musicista, com quem já havia combinado de beber uma cerveja assim que a entrevista acabasse.

Com passagens como essa e com surpressas a todo momento, Otávio (nome de bastismo do músico) nos mostrou que sua obra vai muito além de persona, quase caricata, que ganha vida com as histórias contadas em suas músicas – inclusive fazendo questão de nos entrevistar também ao final da sabatina, hora em que pudemos conversar livremente sobre outros assuntos que não estava programados previamente.

Abaixo, além de poder ouvir o novo registro de Tatá, você pode ler os melhores momentos dessa ótima conversa que tivemos com o músico.

Monkeybuzz: Você é uma pessoa que parece não parar de produzir nunca, seja em sua carreira solo ou em qualquer outra banda que esteja envolvido. Como você faz pra dar conta de tudo isso e compor em cada projeto diferente?

Tatá Aeroplano: Só agora que eu me dei conta disso. Porque eu sempre criei muito e desde pequeno eu componho, isso foi tomando uma dimensão cada vez maior na adolescência e aí eu fui perdendo o controle de tudo que eu fiz – quer dizer, eu tenho tudo isso guardado. Produzindo tanto, você acaba perdendo o controle, mas eu encontrei agora uma maneira para dar margem de pelo menos uma parte dessas criações, “encavalando” um disco no outro. Isso começou a acontecer mais ou menos quando eu lancei em 2008 o Pareço Moderno (com Cérebro Eletrônico) e já tinha o disco do Jumbo [Elektro] engatado. Fui aprendendo a colocar boa parte das canções que eu acho que fazem parte de um momento signficativo e direcionar para um disco ou projeto. Tem sido assim o meu processo e atualmente eu consigo organizar bem meus projetos dessa forma.

Você vai pegando também os traquejos de entrar no estúdio, gravar e ficar cada vez menos tempo para já sair com material pronto. E, dentro desse processo, cada vez mais eu consigo, junto com as pessoas incríveis que estão trabalhando comigo, dar conta de tudo. Aí, fico mais tranquilo para pode pensar no próximo disco. Agora mesmo, já tenho um trabalho que eu estou finalizando e vou lançar no ano que vem. É um disco de “embromations”, que seria um disco do vocalista do Jumbo Elektro. Não sei ainda se é ele quem vai assinar o disco, mas essas músicas já existem.

Mb: Você comentou que está produzindo muito e que já termina um disco pensando no outro. Você acha que isso é uma fase ou que você vê a sua vida sempre assim, produzindo bastante?

Tatá: Se eu tivesse a experiência que tenho hoje em dia há dez anos, eu faria dois ou três discos por ano. E eu compus muito nos últimos dez anos e tenho tudo gravado. Se eu parasse de compor agora, teria uma gaveta cheia de fita cassete, mais o que tenho em telefones. Então, se eu revisitasse esse material, teria faixas o suficiente para compor duas ou três obras por ano. Para o Pareço Moderno, eu descobri grande parte em garimpando fitas cassetes. Agora, faz tempo que eu não faço isso, porque as músicas estão vindo. Mas é sempre importante continuar compondo.

Mb: Seus discos sempre contam histórias tão intimas e às vezes tão lúdicas que não sabemos o que é um exagero lírico e o que realmente aconteceu com você. O quanto esses histórias refletem você ou são somente uma história que você está contando?

Tatá: Já faz um tempo que eu comecei a me envolver com esse tipo de narrativa confessional, talvez o Pareço Moderno seja o “big bang” da parada, ou um dos, pelo menos. Isso aconteceu bem quando eu encontrei compositores que tinham essa caracateristica de serem bem confessionais. César Sampaio é um deles, o Júpiter [Maçã] também; e se você parar para analisar tem muito dele nas canções. E eu já compunha há algum tempo, e basicamente escrevia sobre as coisas que eu vivia. Eu não tenho muito controle sobre isso, mas agora eu to entendendo esse processo de composição. Eu sempre compus muito intuitivamente, então quando estou em casa ou na rua e me vem uma melodia, uma letra, eu pego logo isso e gravo com violão. Às vezes vem uma história toda que eu vivi nessas letras. De vez em quando, mudo uma palavra ou outra, mas geralmente a música já está pronta a partir daí, depois eu volto nela e vejo quando e onde vou lançar.

Mas, voltando à pergunta, eu acho que é o universo que eu vivo e não tenho nenhum tipo de problema em dizer isso. A gente vive intensamente e eu vivo intensamente na noite, tocando e discotencando, então tenho contato com todo o tipo de gente. Acho que, quando estou fazendo uma canção, ela tem a ver com o meu universo e com todas as pessoas que vivem nele. Acho que essas faixas falam da minha vida, mas também da vida de todas essas pessoas. Não é nem a questão de ser boêmio, isso é o de menos. Eu acho que as coisas que estão nessas canções acabam funcionando para as pessoas que moram muito distante, pessoas que estão conhecendo a vida agora, na transição da adolescência para vida adulta, então isso cria imagens e vontades nessas pessoas. Quando era pequeno e morava no interior, eu vivia com as imagens, com as vontades daquilo que eu escutava. Então acho que a música funciona assim, não só a arte, mas a vida em geral, as pessoas são assim.

Mb: Então você se inspira para poder inspirar outras pessoas?

Tatá: É, acho que é isso. Porque eu sempre procurei viver inspirado e não é só música que me inspira. Uma caminhada me inspira, vir pra cá foi inspirador quando encontrei a Rogéria, por exemplo. Porque quando você tá na rua, quando vive dessa maneira, é importante se deixar levar e se inspirar o tempo inteiro, entendendo que a gente tem que se relacionar com o mundo de uma maneira muito positiva. Eu acho importante a gente viver de uma maneira consciente e tentando preservar, tentando entender, por exemplo, a relação que a gente tem com a água. Falta muito isso pro rolê que a gente vive hoje.

Mb: Você acha importante a música ter uma mensagem? Porque você fala isso eu consigo ver na música essa coisa de viver dessa maneira, de viver inspirado […]

Tatá: […] Sim. Mas não com mensagem explicitas. Nada como “vamos cuidar da águar” e fazer uma música sobre a água. Isso fica institucional e eu acho que a gente tem que desinstitucionalizar as coisas, a alma inclusive. Desinstitucionalizar total.

Mb: Na minha resenha de Na Loucura & Na Lucidez, eu percebi uma espécie de linha narrativa que leva o protagonista do álbum a percorrer esses extremos e passar por algumas desventuras enquanto lida com o fim de um relacionamento. Contar uma história foi realmente sua intenção para esta álbum?

Tatá: Em outubro do ano passadom eu estava selecionando as músicas que iam pro disco. Na Lucidez eu já tinha composto em janeiro ou fevereiro de 2013 e foi uma música que eu demorei quase um ano pra capturar de novo, então o meu objetivo era gravar essa música. Na Loucura foi uma das primeiras músicas que compus e estaria no disco, mas, até então, ainda não sabia como o álbum seria, se iria começar Na Loucura e terminaria Na Lucidez ou se seria o contrário. No meio do caminho, descobri A Hora Que Eu Te Espero e até deixei umas canções de fora, inclusive músicas tão difícieis quanto Na Lucidez. Quando fui grava-la, já tinha grande parte do disco pronto, quase que faltava só ela. E foi bem no dia que eu gravei essa música que saiu o título do disco e a ordem das faixas.

Otávio Carvalho, do Estúdio Submarino Fantástico, que batizou o disco. Ele me perguntou como estava o álbum e se já tinha nome. “Eu não sei ainda, mas sei que começa Na Loucura e termina Na Lucidez”. Aí ele falou, “Ah, então pode ser Na Loucura & Na Lucidez” e pronto, tava lá o tempo o todo. Quando outras pessoas que não estavam envolvidas no processo ouviram o disco, falaram “Nossa, Tatá, é um filme, né? Um filme musical” e foi aí que eu me antentei que a ordem do disco, as faixas, as histórias das faixas criam mesmo uma narrativa. E esse disco, no fim das contas, é meio cinematográfico. Não foi pensado assim, mas inconscientemente tava tudo ali. Tenho pirado muito nessa coisa de agir inconscientemente. Eu componho muito assim.

Mb: Por falar em cinema, você esteve envolvido recentemente com a trilha sonora do longa De Menor. Como foi pra você estar envolvido com o cinema, já que suas músicas são de certa forma tão cinematográficas?

Tatá: Foi muito legal. Esse é um filme muito inspirador, então foi fácil o processo na hora de criação. Eu já tinha parte desse material escrito e, quando eu vi o filme, percebi que tinha trechos que cabiam direitinho. A gente gravava a canção e retirava aquele trecho para pôr no filme. Deu tão certo que mandamos pra Caru [Alves] o primeiro corte de som e ele não voltou nunca mais, foi de primeira.

Eu quero fazer isso mais vezes, mas, é claro, com diretores que entendam que eu não vou ficar fazendo muita firula. Eu pego o meterial e vou compor em cima disso, então tenho que encontrar diretores que conheçam meu trabalho, meu jeito de compor e que role essa afinidade. E foi o que rolou com essa trilha. Eu até compus a canção Agarro A Ti, que foi inspirada no filme e ela não estava no script.

Inclusive, eu criei neste ano um projeto como se fosse um musical, chamado Purpurine Nights. Era um daqueles dias que eu estava inspirado. Aí liguei pra minha namorada, Julia Valiengo (Trupe Chá de Boldo), e falei “prepara aí uns cenários, que a gente vai fazer um filme, um musical”. Cheguei lá e gente criou a noite inteira, ela fez a direção de fotografia, compusemos violão, teclado e outros instrumentos e registramos tudo. Ela me passou esse material e, na semana seguite, eu, em uma noite em que eu estava sem sono, peguei tudo e editei, montei uma história com começo meio e fim. Chamei ela pra assistir e falei “agora é só botar os créditos”. Eu quero lançar isso na primavera. Ele foi gravado no inverno, mas combina bem com a primavera.

Mb: Então, lidar com a parte visual do seu trabalho também é natural para você? Quando compõe uma música já pensa logo em um clipe?

Tatá: Eu nunca tive ideias pra imagem, sempre fui ruim com ideias pra videoclipe das minhas canções. Nunca tive essa pretenção de fazer uma música e já pensar no vídeo. Mas de um tempo pra cá, eu quero muito fazer um clipe da música Aventureiros, do Luiz Gayoto, que é uma canção incrível e eu acho linda.

Eu nunca pensei muito no clipe e acho que isso foi uma coisa que faltou no primeiro disco, que demorou bastante pra sair. Rolaram muitos convites, muita gente com boas ideias, mas aí a gente esbarra no ponto econômico. Custa caro e o dinheiro que faria um clipe (algo em torno de 10 mil reais) sai da minha “conta disco”, da grana que pagaria meu próximo álbum (algo em torno de 30 ou 40 mil). Então você tem que encontrar pessoas que vão trabalhar contigo “na guerrilha” e foi assim que aconteceu com Te Deseja Mas Refuto e Par de Tapas, que foram clipes em que as pessoas que estavam dirigindo estavam na parceria total. Quem sabe no futuro role de outra forma.

Mb: Sobre último lançamento com o Cérbero Eletrônico, você comentou que as composições “não tinham freio” quando transportadas para o palco. Como foi recriar o novo álbum para os shows?

Tatá: Foi bem tranquilo. Foi tão intenso o processo de gravar disco que tava tudo ali já na mão de todo mundo. A gente fez dois ensaios, no primeiro ensaio a gente passou os detalhes e foi isso. O show foi muito foda. Estávamos muito tranquilos e já conseguindo criar em cima do palco. Porque esse processo ainda está muito recente e muito vivo. Com o Cérebro é um pouco diferente, porque a gente não vê sempre. Temos que ensaiar bastante e repegar as coisas, isso leva um tempo. É igual time de futebol, que tem que treinar e depois pegar ritmo de jogo.

Nesse show do Na Loucura & Na Lucidez, eu tive que tocar violão sozinho e nunca tinha tocado dessa maneira. São quatro faixas, metade do disco, e são violões dificeis. Quando cheguei na passagem de som, minha única preocuparação era em como ia soar. Eu tinha deixado as unhas crescerem e elas estavam rasgando as cordas, tive que roer elas ali na hora e consegui tirar o som do disco. Mas no final deu tudo certo e isso é o mais importante.

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Apaixonado por música e entusiasta no mundo dos podcasts