“Fur And Gold” e seu Mundo Onírico e Precioso

Bat For Lashes traz um disco de estreia que surpreende e instiga

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Sabe aquele disco lançado há algum tempo que você carrega sempre com você em iPod, playlist e coração, mas ninguém mais parece falar sobre ele? A equipe Monkeybuzz coleciona álbuns assim e decidiu tirar cada um deles de seu baú pessoal e trazê-los à luz do dia. Toda semana, damos uma dica de obra que pode não ser nova, mas nunca ficará velha.

Bat For Lashes – Fur And Gold (2007)

Pra quem tem uma queda (ou abismo, como eu) pelo lirismo, o sombrio e o teatral, Fur And Gold, disco de estreia de Bat For Lashes, é um prato cheio – ou uma refeição completa. O projeto, que tem o nome artístico da cantora e compositora inglesa Natasha Khan, mistura isso tudo com uma dose de sensibilidade, o que deixa o álbum ainda mais irresistível e cativante. Pra mim, é o melhor trabalho lançado por Khan, além de ser o mais expressivo e puro.

Natasha é dona de uma voz única e muito característica que, aliada às letras e melodias, fazem com que cada canção te conte alguma coisa. É como a narração de uma história intrigante e sombria com diferentes cenas e ambientações. Os personagens imaginários estão sempre caminhando e dançando dentro um mundo próprio fantasiado ali. A atmosfera criada pela voz, instrumentos e batidas, te faz entrar numa floresta escura e descobrir um novo e misterioso universo.

O tom onírico de algumas canções é outro fato que chama muita atenção. Apesar de Fur And Gold ter uma vibração mística, Khan enfatiza uma realidade própria e mágica, onde ela faz parecer perfeitamente normal cantar “drink his blood and he’s our leader”, em The Wizard (por mais que aqui no texto isso pareça ser mais pesado do que realmente é). Mas durante a audição, essas coisas passam com uma leveza inexplicável, e passam a fazer parte de você.

Enquanto existe esse lado fantasioso, existe também um muito real e palpável. Khan traz uma qualidade de conto de fadas e um ar de mistério à sua música, num ato de equilíbrio delicado entre as emoções diárias e o poder da fantasia e imaginário. A cantora fala de sentimentos reais, de um jeito que só ela sabe fazer. Tem uma coisa linda ali, pura e preciosa, mas ao mesmo tempo crua sobre suas músicas, que voam e passam por um Pop obscuro com uma pegada clássica e lírica.

Aliás, um dos pontos interessantes (e que eu particularmente gosto muito) é essa influência mais clássica, com o piano e violino de fundo em muitas canções. A ascensão e o clímax também parecem ser colocados no momento certo, fazendo com que até as canções mais calmas se tornem dramáticas, mesmo que sejam “controladamente expansivas”, expandindo em seus próprios limites. Prova disso é a canção Sad Eyes, um dos destaques do álbum, que é basicamente focada na voz e piano, e tem um crescente esplendoroso. A faixa é tão frágil e sensível que se parte ao meio quando Natasha canta “Trying to hold it together/ Keep my love as light as a feather” e tira o fôlego de quem está submerso nesse mundo à parte que a canção te transporta. A mesma sensação está presente em The Bat’s Mouth, que ainda ganha a companhia marcante de violinos e tem um dos crescentes mais bonitos de todo o registro.

As notas mais graves no piano de Trophy dão um tom sombrio e acho que é uma abordagem que, na minha opinião, não tem erro. Também é uma das faixas que trazem a voz de Khan em maiores variações, do grave ao agudo. Isso dá uma dramaticidade muito única ao trabalho, apesar da voz da cantora ser muito marcada e característica. A canção, assim como outras do álbum, parece estar dentro de uma bolha de ar, que faz com que a voz da cantora ecoe e cresça.

Ainda existem canções que trazem o empoderamento feminino de heroínas, como Prescilla (mais Folk) e Sarah (com uma pegada mais puxada pro Rock). Para mim, não existe um momento exagerado no drama todo que envolve Fur And Gold, e até a balada/trovoada/sessão de descarrego de I Saw a Light parece estar na medida certa. A última faixa é um cover de I’m on Fire, de Bruce Springsteen, que mostra o quão vulnerável é a alma velha e voz de Khan, levada ao seu melhor. Esta é uma muito bem realizada estreia de Bat For Lashes, que transporta os corpos dos ouvintes para um mundo singular, que só quem está disposto a se envolver com a sonoridade proposta, pode ser levado.

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MARCADORES: Fora de Época

Autor:

Largadora por vocação. Largou faculdades, o primeiro namorado e o interior. Hoje só quer saber de arte, cinema, música, fotografia e sair correndo pelo mundo.