Ativismo, Crítica Social e Pluralidade: Os Dez Anos da Estreia de M.I.A.

“Arular” foi um capítulo importante não só na carreira de Maya, como também no da música contemporânea

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Nesta semana, comemora-se uma década do lançamento de Arular, primeiro disco de M.I.A.. Apesar de esta ser sua estreia no formato LP, não é exatamente seu primeiro lançamento, já que parte dele foi mostrado em uma mixtape cerca de um ano antes – ainda sem o respaldo de uma grande gravadora (XL Recordings) e dos colaboradores que viriam a aprimorar o que foi visto ali. A obra pode até não ser apontada com o melhor de sua carreira, mas foi com ela que a cantora chamou a atenção de todo o mundo para seu som bem complexo em referências e letras, ainda que fácil aos ouvidos.

Porém, antes de falar mais sobre o álbum em si, vamos falar de Mathangi “Maya” Arulpragasam, nome por trás do projeto. Nascida no Sri Lanka e criada em Londres, morando ainda parte de sua vida na Índia, M.I.A. viveu na pela parte desse pluralismo étnico que seus discos representam. Essa vontade de representar a música do terceiro mundo sob uma mais visão ampla, globalizada, parece ter nascido não só de sua vida nômade, mas também de sua educação formal, cinema e produções audiovisuais. Esse histórico, além do seu encontro com produtores renomados, como Diplo, trouxe ao seu álbum uma pluralidade estilística enorme, unindo sob uma só bandeira estilos como Hip Hop, Dancehall, Funk Carioca, Reggaeton e Electroclash, só para citar alguns.

Mais que suas batidas e o liquidificador estilístico de que se tornou Arular, o que mais chamou a atenção na época foi o teor ácido do álbum, fazendo críticas religiosas, políticas, étnicas e ideológicas. Com tremenda inteligência, a cantora soube expor seus pontos de vistas e mostrar seu engajamento aos ouvintes de forma a fazê-los dançar uma música extremamente carregada de combatividade política – o hit Bucky Done Gun é um ótimo exemplo disso, além dos outros singles, Galang e Sunshowers.

Essa atenção às questões sociais veio do berço, sendo Maya filha de um ativista de um partido do Sri Lanka, Arul Pragasam, também conhecido, durante a revolução que acontecia no país, por Arular. Isso mesmo, o “nome de guerra” do pai de M.I.A. é também o nome do seu primeiro álbum. Mais tarde, ela explicou isso em uma entrevista dizendo que se Arul procurasse seu próprio nome no Google, poderia encontrar o disco de sua filha. Talvez uma forma de reatar a relação tão conturbada entre os dois.

A capa do álbum também é repleta de elementos que complementam o teor crítico das letras de Maya. Tanques, bombas, armas, bandeiras e mais outras referências a um dos episódios da revolução no Sri Lanka, estampavam essa arte que foi muito discutida na época. Apontada por alguns como “estúpida” e por outras “puramente artística”, ela de certa forma sintetizava o conteúdo do próprio álbum, mostrando seu pluralismo, certa inconstância e o teor combativo. Esse estilo, ao mesmo tempo bélico e cosmopolita, foi traduzido também em alguns de seus videoclipes, como é o case de Galang.

Arular

É claro que isso não resume a carreira de M.I.A. ou confina sua criatividade a simples desdobramentos desse álbum, mas certamente Arular não só impulsionou sua carreira, como garantiu no mercado musical espaço para outros artistas seguirem seus exemplos, se não pelo todo, pelo menos na parte da pluralidade estilística, como apontou Pedro Ascar em um artigo sobre a moça. Mesmo sua identidade visual em clipes, e vela lembrar ela se graduou em produções audiovisuais, se tornaram influência para outros e um pouco desse mundo imagético da cantora já foi abordado por André Felipe de Medeiros.

Como já dito, esse pode até não ser seu melhor disco ou mesmo o registro que melhor resuma sua obra, mas sem ele nunca teríamos a chance ver seu ápice em Kala (2007) ou ainda o ótimo Matangi (2013). Certamente esses já são motivos mais que suficientes para se comemorar os dez anos de uma das obras mais icônicas dos anos 2000.

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ARTISTA: M.I.A.
MARCADORES: Aniversário

Autor:

Apaixonado por música e entusiasta no mundo dos podcasts