“Disintegration”: Uma Nova Relação com The Cure

Disco icônico da banda influenciou uma geração e resiste muito bem à prova do tempo

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Sabe aquele disco lançado há algum tempo que você carrega sempre com você em iPod, playlist e coração, mas ninguém mais parece falar sobre ele? A equipe Monkeybuzz coleciona álbuns assim e decidiu tirar cada um deles de seu baú pessoal e trazê-los à luz do dia. Toda semana, damos uma dica de obra que pode não ser nova, mas nunca ficará velha.

Disintegration

Disintegration continua até hoje sendo meu contato mais profundo com The Cure. Há alguns anos, um amigo se desfez de uma pilha de CDs e por nunca ter sido um grande fã dos hits mais Pop da banda, foi um dos últimos que parei pra ouvir. Alguns anos depois, estava na minha primeira edição do Pitchfork Festival que cobrimos aqui pelo Monkeybuzz, quando uma tempestade típica do verão de Chicago interrompeu as apresentações e fui me esconder embaixo de uma tenda. Foi olhando a chuva, numa das experiências mais legais que havia vivido até então, fazendo minha primeira cobertura de um festival internacional, que ouvi os quase três minutos de introdução de Plainsong, tocada na barraca de vinil ao lado, e passei a enxergar a banda de Robert Smith de uma outra forma.

Naquele contexto, um misto de alegria e melancolia chuvosa, aquilo foi muito marcante. Em alguma análise que li do disco na época, – sim, ao chegar no hotel me empanturrei de The Cure – me lembro do jornalista ressaltar que a cópia original de Disintegration vinha com um aviso de ser um disco feito para ouvir bem alto e na hora pensei que talvez este fosse o motivo de ter demorado tanto pra ser fisgado pelo álbum.

Sempre associei The Cure à imagem de Robert Smith e confesso que isto foi uma das barreiras que, quando mais jovem, sempre me afastaram da banda. Não me identificava com tudo aquilo, mas hoje, ouvindo um álbum como Disintegration, com a carga emocional das letras e o jeitão épico das melodias, não consigo medir o quanto este sinergia entre som, estilo e comportamento teria me afetado se fosse um adolescente no final da década de 80, começo dos anos 90. É um álbum coringa, que consegue te deprimir ainda mais quando você já está mal ou te dar esperanças e motivação em momentos importantes da vida. Difícil é ouvi-lo por completo e manter-se indiferente.

Hoje, a experiência de ouvir Disintegration é outra, descontextualizada, mas não menos espetacular. A grande vantagem que a música Pop tem perante outros estilos é a possibilidade de viver aquele zeitgeist, poder compartilhar o impacto daquilo não só em você, mas em todos a sua volta. Esta é uma característica que infelizmente, quem nasceu depois, não viverá mais. Mas pensando na obra como um objeto isolado, é impossível não ser tocado por uma faixa como Pictures Of You. Sou um grande fã de letras pouco codificadas, com mensagens simples e impactantes e o sofrimento na voz de Robert Smith nesta música é de dar um nó na garganta já no primeiro verso “I’ve been looking so long at these pictures of you”.

Hoje, temos excelentes lançamentos com esse potencial épico e emocional, mas o mais louco é pensar que este disco era Música Pop. O álbum ficou nos primeiros lugares de vendas no Reino Unido e nos Estados Unidos, com várias canções consideradas hits naquele ano e tornando-se um dos grandes sucessos comerciais da banda. A lógica da música hoje é outra, obviamente, então qualquer comparação é imprecisa, mesmo assim, é difícil pensarmos num disco entre os mais vendidos que comece com uma introdução instrumental de três minutos.

Costumo ter a mania babaca de pensar que alguns discos podem ser considerados clássicos e obras geniais, mas nem todos tem o charme para serem considerados os favoritos de uma pessoa – já que escolher um disco favorito nada mais é do que uma forma de tentar construir sua própria imagem e quando mais unânime um disco, mais genérica torna-se esta imagem. Disintegration pra mim é uma obra genial, que resistiu ao tempo e apesar de não ser meu favorito, é uma escolha com muita personalidade.

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ARTISTA: The Cure
MARCADORES: Fora de Época

Autor:

Nerd de música e fundador do Monkeybuzz.