Entrevista: Dado Villa-Lobos

Conversamos com o ex-guitarrista da Legião Urbana que acaba de lançar “Passo do Colapso”, seu novo disco solo

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Quando se fala em Legião Urbana, cerca de 95% das pessoas imaginam algo relativo ao vocalista Renato Russo. Dado Villa-Lobos, guitarrista da banda e produtor dos últimos discos póstumos, manteve-se em atividade ao longo dos anos, sempre discreto, gravando trilhas sonoras e raros discos solo. Dado sempre procurou deixar de lado o formato simples do Pop Rock e se aventurou com sucesso por trilhas sonoras. Agora ele deixa de lado um pouco dessa distância e lança o surpreendente Passo do Colapso, um disco denso, cheio de referências esotéricas e religiosas, com participações que vão de Fausto Fawcett ao escritor uruguaio Eduardo Galeano, autor do clássico livro As Veias Abertas Da América Latina. Conversamos com ele para saber tudo sobre seu atual momento e, claro, sobre os tempos de Legião Urbana.

Monkeybuzz: O Passo do Colapso parece ser eu mais bem resolvido trabalho solo. Conte como nasceu a idéia e o conceito dele.

Dado Villa-Lobos: Acho que o disco tem um conceito, sonoridade, arranjos e produção mais homogêneos, sempre soando como uma banda tocando sem muitas firulas. A ideia do Passo do Colapso veio no momento em que comecei a sentir meu próprio colapso interior, meu súbito desinteresse pela música, descrença na indústria do entretenimento e a sensação de nunca mais conseguir qualquer conexão com o público, onde estava meu cicuito? Curto-circuito. Uma das ideias do Passo do Colapso surgiu a partir da banda Calypso, Calypso/colapso … uma brincadeira… mas, que fique claro, é uma super banda e Chimbinha é o grande estrategista desse novo formato de mercado ultramegapop. Venho tendo problemas com essa estrutura megapop do Brasil. Continua bem chato mesmo, a não ser por raras exceções. O que vejo é que o Passo do Colapso se encaixa bem nos dias de hoje, não? Sinto mudança e transformação pelos ares.

Mb: O que você acha dos recentes filmes ligados à Legião Urbana exibidos no cinema, Somos Tão Jovens e Faroeste Caboclo? Você se envolveu em algum deles?

Dado: Meu filho me interpreta no Somos Tão Jovens. Achei que a essência da história está lá representada conforme foi, porém a linguagem cinematográfica ficou um tanto quanto ingênua e tem certos problemas, mas o filme aconteceu. O Faroeste ainda não vi.

Mb: Você sempre procurou explorar territórios musicais opostos às sonoridades que fazia com a Legião. O formato Pop Rock te limita?

Dado: Às vezes pode virar uma prisão e o lance é sempre se libertar e seguir aquilo que te impulsiona e emociona. É por aí que vou, sempre tentando fugir do óbvio e sendo o mais simples possível.

Mb: Como foi ter a presença do escritor uruguaio Eduardo Galeano no disco? De onde surgiu essa idéia?

Dado: Foi meu amigo uruguaio, Carlos Tarán, que, estando a par do “roteiro” do disco, lembrou-se desse poema El parto do Galeano que fecha bem com a ideia transformação-mudança-recomeço. Do colapso à vida. Redenção total.

Mb: Os dois últimos discos da Legião Urbana, A Tempestade e Uma Outra Estação contaram com você na produção. Como foi dar vida a essas canções da fase final da banda?

Dado: Bem foi muito duro, estávamos perdendo Renato. Muito intenso, triste e pesado. Existem ali grandes canções.

Mb: Sua carreira é muito mais centrada em trilhas sonoras, contando com prêmios por Bufo & Spallanzani e Pro Dia Nascer Feliz. Quais tuas influências nesse terreno?

Dado: Comecei com o Bufo e Spallanzani sem muita experiência e com muitas ideias, fui aprendendo, observando. Os filmes de Jarmusch como Ghostdog com trilha do RZA do Wu Tan Clan me levou além do Morricone, um grande mestre. Minha intuição e a ajuda de grandes músicos e diretores fantásticos e tolerantes me ajudaram muito. Hoje existem caras incríveis nas trilhas do cinema como Hans Zimmer e Alberto Iglesias. Gosto muito.

Mb: Como estão os preparativos para o show Renato Russo Sinfônico?

Dado: Não tenho ideia.

Mb: Voltando ao Passo do Colapso, o disco traz a produção dividida entre você e o Kassin. Como ele contribuiu para o resultado final?

Dado: Gravamos as bases juntos e Kassin tem ideias de arranjos e de sonoridades muito especiais, além de ser um cara super astral que injeta ânimo e coragem nas pessoas. Gravei esse disco só por causa dele. Sem ele talvez tivesse abandonado essa ideia.

Mb: Conte um pouco sobre a participação do Nenung, dos The Darma Lóvers, na composição de grande parte das canções do disco.

Dado: Nenung é super parceiro, a primeira música que gravei como solista foi uma música dele chamada Diamante que está no Jardim de Cactus, desde então virei um “Darma cóver”. Temos uma ótima sintonia musical ideológica. Conversamos numa turnê que fizemos juntos pelo Rio Grande do Sul, disse a ele o que se passava pela minha cabeça, como estava sentindo aquele momento e mandei alguns temas pra ele letrar e então vieram o Passo do Colapso, Sobriedade, Lucidez e ele ainda me mandou Quando a casa cai. Ele é desses caras estimulantes.

Mb: Há uma bela versão em português para Son, do primeiro disco do Scott Weiland (vocalista dos Stone Temple Pilots), 12 Bar Blues. Como ela foi parar no repertório do disco?

Dado: Eu adoro essa música e o disco em questão. Resolvi fazer a versão pra homenagear meu filho que agora tem 25 anos e há 5 anos atrás sofreu um procedimento cardíaco muito intenso. Deu tudo certo, hoje ele está ótimo e resolvi transcrever a música original que fala de um bebê pra falar de um jovem adulto que em breve deve deixar minha casa e construir a dele.

Mb: Seu disco traz participação de Paula Toller, Fausto Fawcett, Bi e Barone, Laufer (parceiro do Fausto Fawcett em canções como Katia Flávia e Juliette), Arto Lindsay, Mallu Magalhães. Você pensou nessa reunião ou foi algo que foi acontecendo espontaneamente?

Dado: Paula, Bi, João, Fausto e Laufer são parceiros de décadas nessa vida, Laufer toca baixo na banda, o Arto conheço também há tempos e Mallu foi uma grata surpresa que conheci há pouco. Foi tudo acontecendo meio que espontaneamente em função das ideias dos arranjos e pensando sempre no bem melhor para a canção. Na verdade um luxo só.

Mb: Em determinado momento de Somos Tão Jovens, seu filho Nicolau, que te interpreta, diz para o jovem Renato Russo, que você não é lá grandes coisas como guitarrista e tenta se safar da participação na banda. Qual sua opinião como guitarrista?

Dado: Ah, fomos tão jovens, não? Hoje tenho personalidade como instrumentista, toco tudo do meu jeito e tem dado certo.

Faça o download de Passo do Colapso, novo disco de Dado Villa-Lobos no iTunes.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.