Fleet Foxes: Os Novos Barrocos

Sonoridade Medieval e, ainda assim, moderna destaca o primeiro disco do quinteto, tornando-o interessantíssimo até hoje

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Sabe aquele disco lançado há algum tempo que você carrega sempre com você em iPod, playlist e coração, mas ninguém mais parece falar sobre ele? A equipe Monkeybuzz coleciona álbuns assim e decidiu tirar cada um deles de seu baú pessoal e trazê-los à luz do dia. Toda semana, damos uma dica de obra que pode não ser nova, mas nunca ficará velha.

Fleet FoxesFleet Foxes

Gosto de expressões que hiperbolizam um ponto vista. Esse negócio de tentar ficar descrevendo um disco, ou qualquer outra coisa, com adjetivos singulares como “bom”, “legal” e “divertido” pode até ser útil e funcional. Mas, a questão é que quando você encontra um disco que curtiu muito, nenhuma expressão parece ser grandiosa o suficiente. São raros os casos em que você tem esse tipo de comprometimento com um álbum, mas posso dizer sem sombra de dúvida que o primeiro disco de Fleet Foxes foi assim, sendo “o mais próximo do paraíso que eu já cheguei”.

A banda é conhecida por mostrar um aspecto diferente do Folk. Enquanto muitos artistas do gênero acabam se limitando à sonoridade folclórica e característica da história de seu país, Fleet Foxes optou por produzir um som que buscasse uma conjuntura bem distante: o Medieval. Podemos ver isso nitidamente na escolha da capa da obra, uma pintura de Peter Bruegel datada de 1559.

As referências folclóricas antigas do disco refletem tanto nas letras quando na instrumentação. A banda usa harmonias vocais muito bem arranjadas e com um eco catedrático que só eles são capazes de produzir, sendo o melhor exemplo dessa característica citada a música Blue Ridge Mountains. Juntando a isso, belíssimas baladas de violão e voz mostram sua riqueza em alguns momentos do disco, representadas por Medowlarks e Oliver James. A instrumentação acaba sendo um dos fatores principais para a aproximação do disco ao paraíso. É impossível ouvir Sun It Rises e não ver os portões do céu se abrindo para você, com os acordes angelicais e o sutil orgão por traz delas.

Já o aspecto lírico se assemelha pela pluralidade de temas. Você encontra neste disco letras que abordam desde coelhos brancos que roubam morangos até o retorno de um irmão de que partiu há muito tempo, passando por constantes temas como morte, fábulas, viagens, criaturas enigmáticas e confissões. Por este aspecto, vale a pena escutar faixas como White Winter Hymnal e He Doesn’t Know Why. Justamente por abrangir uma gama de temáticas é que o disco relembra o medieval, em especial a cultura oral de lendas compartilhadas em feudos e vilas.

Aí um historiador chato vai comentar: “mas a capa do disco é da Idade Moderna”, ou “as harmonias vocais não eram usadas nessa época, apenas o canto gregoriano”, ou ainda “não tinha sido inventado o orgão ainda”. A questão principal, e um dos motivos pelo qual o disco é tão singular, é justamente essa! Ele é construído com elementos posteriores a este período medieval (seja a capa do disco, instrumentos usados ou temas abordados), entretanto ele ambienta você quase que automaticamente para esse período.

Seja relembrando os excessos e polifonias barrocas, orgãos presentes em músicas dos anos 70, pianos timbrados com sons fantasmagóricos ou cantos gregorianos, o primeiro disco da banda cravou fundo no meu inconsciente musical e, de vez quando o relembro com a mesma surpresa e deleite da primeira vez que o escutei. Ainda que o gosto pelo período histórico tenha ajudado bastante, os que não são tão adeptos desse podem se interessar por essa sonoridade moderna e antiga proposta pelo quinteto angelical de Seattle.

Amém.

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ARTISTA: Fleet Foxes
MARCADORES: Fora de Época

Autor:

Produtor, pesquisador musical e entusiasta de um bom lounge chique