Big Country: Em Campo Desde Os Anos 80

Com o novo disco chegando, demos uma repassada pela história dessa banda ícone do cenário musical americano dos anos 80

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Com a overdose de informações bombardeadas na mente dos seres humanos a partir dos anos 90, era de se esperar que alguns dados se perdessem através dos tempos. Entre os mais recorrentes, estão as impressões sobre boas bandas de Rock que ficam pra trás na poeira da estrada de detalhes do cotidiano, cada vez mais preenchido por informações funcionais. Creiam, nem sempre foi assim. Nos anos 80, por exemplo, parecia haver mais tempo para aguardar novidades e apreciá-las com mais propriedade. Big Country era uma dessas bandas de segunda divisão, que chegavam aqui na esteira do sucesso de outras formações. No caso dos escoceses de Dunfermline, a “banda inspiradora” era o U2, na época caminhando para o terceiro disco, War. Corria o ano de 1983.

Na verdade, 1983 foi quando o Big Country soltou sua sensacional estreia, The Crossing. O grande barato da banda estava numa sonoridade que podemos afirmar ser única, criada por dois sujeitos: Stuart Adamson e Bruce Watson. Adamson, nascido em Manchester, foi parar na Escócia no meio dos anos 70, mais precisamente na região litorânea de Fife. Após um tempo perambulando por bandas de garagem, ele fundou uma formação Punk, inicialmente com relativo sucesso na região, chamada The Skids. Em pouco tempo The Skids despertou a atenção do radialista John Peel, da BBC, que os apresentou a um público bem maior. Fizeram sucesso considerável no Reino Unido, mas Stuart Adamson deixou a banda em 1981, disposto a levar adiante seu novo projeto, Big Country.

A banda não era, no entanto, projeto exclusivo de Adamson. Ao seu lado estava o guitarrista Bruce Watson, outro “escocês”, nascido no Canadá, mas devidamente ciente das tradições locais a ponto de criar uma sonoridade guitarrística que reproduzia as gaitas de fole. Além disso, o tom grandioso dos arranjos dava a impressão da voz de Adamson seguir planando pelas terras altas, como se fosse o próprio tempo. Além deles, o baixista Tony Butler e o baterista Mark Brzezicki completavam a banda, que lançou seu primeiro single em 1982, Harvest Home.

Apesar de não fazer muito barulho, a banda lançou outro compacto, Fields Of Fire, que os colocou no Top Ten inglês em pouco tempo. Logo em seguida veio o primeiro e sensacional disco de estreia, The Crossing, com a produção de Steve Lillywhite (o mesmo dos três primeiros discos do U2). A primeira canção, In A Big Country, já apresentava a proposta dos sujeitos: o tal “Rock escocês”, com bateria marcial e aquelas duas guitarras entrelaçadas, fazendo o som de várias gaitas de fole, conduzindo a melodia só para a voz de Adamson trovejar por todos os cantos. Grandioso, superlativo e muito bonito. Em pouco tempo o Big Country estava no topo das paradas numa época em que a disputa era bastante acirrada. The Crossing chegou ao Top 20 da Billboard nos Estados Unidos, com “In A Big Country” entrando na lista dos quarenta singles mais ouvidos no país, chegando a vender mais de um milhão de cópias na Inglaterra (disco de ouro duplo) e batendo as 500 mil cópias nos Estados Unidos, com a banda tocando na noite de entrega do Grammy de 1983, além do programa humorístico Saturday Night Live.

Com este belo início de carreira, Big Country ainda lançou um outro single, Wonderland, que não estava incluído em The Crossing e caiu na estrada, passando os anos de 1984 e 1985 fazendo shows em escala mundial. No Brasil a banda era apresentada em emissoras de rádio alternativas, como a Fluminense FM, que incluiu algumas faixas de The Crossing em sua programação. Ao lado dos irlandeses do U2 e dos galeses do The Alarm, formavam uma espécie de trinca de bandas britânicas de “pós-punk exótico”, livre dos tons de cinza e climas pesados de Echo And The Bunnymen e The Cure seus pares ingleses. Com a criatividade em alta, a banda lançou seu segundo disco Steeltown em outubro de 1984, novamente com Lillywhite na produção e gravações feitas nos estúdios Polar, em Estocolmo, pertencentes ao ABBA. O disco logo entrou no primeiro lugar das paradas britânicas, puxado pelo single Flame Of The West.

Ao fim de 1984, os quatro integrantes do Big Country participaram do projeto coletivo Band-Aid, que lançou o single Do They Know It’s Christmas em ajuda às vítimas da fome na África. Era uma espécie de embrião do Live Aid, que viria em 1985, ano em que a banda abriu shows de gente graúda como Queen e Roger Daltrey (vocalista do The Who). Também gravaram a trilha sonora de um filme independente, chamado Restless Natives e se prepararam para lançar o terceiro disco, The Seer, que viria no início de 1986, sendo lançado direto para o segundo lugar das paradas britânicas e emplacando três hits no Top 30, Look Away, além da faixa-título, com participação de Kate Bush e One Great Thing. O disco chegou ao Top 60 da Billboard americana, posição melhor que o álbum anterior, Steeltown. Foi o último disco que Steve Lillywhite produziu para a banda e marcaria o fim de um ciclo na carreira deles.

A partir daí, a história de Big Country ganha ares menos alegres. O vocalista Stuart Adamson teria um colapso nervoso por conta de stress, quantidades imensas de shows e bebida. A banda lançaria novo trabalho em 1988, Peace In Our Time, gravado em Los Angeles e com o produtor Peter Wolf. O sucesso não foi o mesmo e, com o fim da década, a banda parecia perder terreno, o que se confirmou com o disco seguinte, No Place Like Home, de 1991, lançado em pleno estouro do Grunge e do Britpop, mais parecendo um fóssil na época. Ao longo da década de 1990, o Big Country lançaria discos fracos, exceção feita a Driving To Damascus, de 1999. Este seria o último álbum lançado pelo Big Country até 2013, o último a contar com os vocais de Stuart Adamson, então morando em Nashville, que cometeria suicídio em 2001. Ele nunca conseguira livrar-se da bebida e foi encontrado num quarto de hotel no Havaí, após um mês de desaparecimento.

A banda praticamente encerrou suas atividades, restringindo-se a aparições capitaneadas por Bruce Watson, sobretudo para celebrar aniversários da banda e tocar algumas canções em versões acústicas em convenções de fãs. Aos poucos foram percebendo que ainda havia demanda por canções do Big Country. A partir de 2007, celebrando 25 anos da fundação do grupo, Watson, Butler e Brzezicki fizeram uma pequena turnê pelo Reino Unido, com resultados além do esperado. No ano seguinte resolveram voltar à ativa e em 2010 já estavam na estrada novamente, com a presença de Jamie Watson, filho de Bruce, nas guitarras e Mike Peters, ex-vocalista dos galeses do Alarm, assumindo os vocais. Logo depois, o baixista Butler se aposentaria, sendo substituído pelo ex-Simple Minds, Derek Forbes. Para provar que não retornaram apenas para viver de um passado de glórias, o Big lançou neste ano o belo The Journey, seu primeiro disco de inéditas em 14 anos.

Mais do que simples nostalgia, prestar atenção nessas pequenas grandes bandas que não seguiram a estrada reta da fama e do sucesso ou que, de tão humanas e imperfeitas, tiveram idas e vindas em sua carreira, é uma ótima forma de entender melhor o que significa o Rock. Big Country, em algum momento dos anos 80, praticamente dominou as paradas inglesas. Isso nunca foi pouco. Corra atrás dos discos deles.

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ARTISTA: Big Country
MARCADORES: Redescobertas

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.