Real Estate e as Boas Vibrações

Entenda um pouco o som deste grupo cativante antes do lançamento de seu esperado terceiro disco

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Se existe uma definição que comporte o som do grupo Real Estate, ela se dá através da expressão “boas vibrações”. Idealizada e disseminada no clássico Beach Boys e sua [Good Vibrations](), a frase começou a englobar um estilo de vida enraizado na praia, no surfe e em aproveitar cada momento como se o sol fosse eterno e os compromissos inexistentes. Obviamente, a Surf Music viria a se desenvolver nas mais variadas formas, mas a faixa dos californianos se tornaria para sempre uma metonímia para o gênero e tudo que ele engloba.

Aos poucos, o grupo de New Jersey se tornaria um elemento de fácil associação no estilo e no meio, a chamada “parte pelo todo” característica da figura de linguagem. No entanto, se a praia existe, o clima mostra-se de certa forma menos ensolarado na costa leste norte-americana. Igualmente proveitoso, a diferença climática entre as costas litorâneas proporcionaria diferentes experiências a sua população e acabaria transformando-se em diversas formas de arte.

É evidente que o estilo de música está em alta e surge de modo variado. Temos o clima aparecendo em timbres à la Dire Straits e mais tropicais com Mac Demarco, mais psicodélico com DIIV, progressivos no Ducktails (banda que compartilha o guitarrista Matt Mondanille do Real Estate] e hipnotizantes com Beach Fossils. Apesar da clara diferença temporal entre o surgimento de cada grupo, podemos considerar Real Estate como o grupo precursor do gênero como o conhecemos hoje em dia e disseminador de uma ideia que logo em seu debut já sinalizava uma grande qualidade.

Agora, com seu mais novo trabalho, Atlas, saindo do forno, uma retrospectiva se mostra necessária a uma banda que nos faz criar expectativas a cada lançamento ou notícia. O autointitulado Real Estate de 2009 possuía uma atmosfera cheia de névoa característica da maresia densa que atinge certas regiões praianas. A voz abafada de Martin Courtney, típica de uma gravação Lo-Fi independente só deixa tal percepção ainda mais evidente. Riffs circulares, como as ondas do mar, atingem o ouvinte como um bloco de boas vibrações sem deixar vestígios.

O som “chapado” da banda, longe da sobriedade, combina com o espírito jovem dos músicos que pareciam levar a vida de forma bastante descompromissada. Vemos estas narrativas em Black Lake, linda faixa que retrata um passeio ao lago em meio a uma interessante guitarra que surge de forma inesperada. A inocência (e pouco desenvolvimento lírico) em Suburban Bevarage, que traz a simples dualidade entre Sprite e Budweiser como o sentido para se sentir bem, mostravam evidências de um som preocupado em transformar qualquer ambiente em uma praia vazia e agradável.

O nome do grupo, sinônimo para mercado imobiliário, pode ser ligado à praia de duas formas. A primeira, evidentemente relacionada à construção de casas que acontece naturalmente nos entornos destas paisagens mas também, e muito mais interessante, pela clara sensação de paralisia que o Surf Rock da banda causa. Na instrumental Beach Comber, na balada Fake Blues ou na romântica Green River, sempre ficamos atônitos com sua beleza musical.

A sequência na carreira com o Days em 2011 não poderia ser mais efetiva. Sai o som em blocos para agora cada insrtumento ter o seu espaço. O cuidado nas melodias se mostra mais apurado e as letras parecem retratar a visível maturidade que o sucesso de estreia e a consequente agitada vida de turnês ocasionaria. A abertura já tem todos estes elementos e ainda acrescenta o bem-vindo aumento do volume sonoro e Martin com a voz mais solta. O segundo disco é uma evolução em todos os sentidos e trouxe faixas clássicas como Municipality, a sonhadora Kinder Blumen e a emocionante Wonder Years, uma das poucas composições do baixista Alex Bleeker.

Mesmo entre algumas melancolias nas letras, como a própria Wonder Years que retrata os tempos áureos como uma visão distante ou em I’m Real que lida com as incertezas de um novo relacionamento: “I don’t know who’s behind /The wheel /Sometimes I feel like that I don’t know /The deal”, Real Estate manteve-se neste estilo praiano divertido que transmite boas vibrações. O clima hipnótico, letárgico aos poucos foi se consolidando dentro de sua música, e mesmo a natural evolução em termos de produção e inspiração não conseguiram fazer com que o espírito se perdesse.

Agora, com seu próximo disco em vista e um nome já consolidado na praça, o que esperar da banda de New Jersey? Sabemos que Ducktails, grupo irmão, fez um dos melhores discos do ano passado (na minha modesta opinião), mostrando uma evolução sonora gigantesca em relação ao seu antecessor. Outros nomes já ocupam a praça da nova Surf Music com os pés no Indie e agora, mais do que nunca, Martin e companhia precisam mostrar a relevância de seu som. No entanto, não temos muitas dúvidas que iremos aproveitar Atlas em cada momento de escapismo do cenário urbano ou contemplação da natureza pois o Real Estate já se tornou uma companhia garantida para tais ocasiões, o que leva o terceiro álbum a figurar no nosso hall de grandes expectativas de 2014.

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ARTISTA: Real Estate
MARCADORES: Redescobertas

Autor:

Economista musical, viciado em games, filmes, astrofísica e arte em geral.