Resenhas

Bebel Gilberto – Tudo

Novo álbum da cantora segue fórmula de “bossa internacional”

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Ano: 2014
Selo: Sony
# Faixas: 13
Estilos: Eletrônica, Bossa Nova, Jazz
Duração: 45:01
Nota: 3.0
Produção: Mario Caldato Jr.

Curioso. Bebel (filha de João) Gilberto surgiu nos anos 1980, ainda piveta, participando de especiais globais, mais precisamente em A Arca de Noé e Pirlimpimpim, no qual viveu a personagem Narizinho. Cresceu um pouco mais, tornou-se amiga de Cazuza, com quem compôs Preciso Dizer Que Te Amo, uma das mais belas canções do Exagerado e, em vez de decolar com uma carreira sólida de cantora, permaneceu no quase no anonimato, do qual saiu para fazer vocais de apoio para Caetano Veloso (em Fora da Ordem, de 1991) e participar do disco solo do DJ Towa Tei, ex-Deee Lite. Demorou até 2000 o lançamento de um álbum só dela. Quando veio, porém, a espera foi plenamente compensada.

A receita sonora que Bebel utilizou em Tanto Tempo, sua estreia muito mais internacional que brasileira, era ambiciosa e relativamente inexplorada: juntar blips e tóins eletrônicos bem gentis a ambiências de violão, voz e clima bossanovista idealizado, muito afeito aos gringos e quase estranho a quem morava em Ipanema à época. Funcionou do mesmo jeito que funciona o Leblon das novelas de Manoel Carlos, tudo bonito, bem feito, cuidadoso e irreal para quem conhece o bairro carioca. Seria injusto, porém, desdenhar do talento da moça. Bebel canta bem, tem inteligência, senso estético em ordem e identificou-se com essa fórmula, que pode soar chique, exótica, refrescante para quem vive no Hemisfério Norte da nossa bolota azul e branca. Quem chefiou essa empreitada sonora em 2000 foi o produtor Mario Caldato Jr, que vinha de vários trabalhos ao lado de Beastie Boys, os quais serviram muito para a adaptação dessa mistura urbana e fantasiosa ao terreno da eletrônica. Com o passar destes 14 anos, Bebel pouco mexeu nos quatro álbuns que lançou e agora, com a volta de Caldato, não foi diferente.

Ela registra três covers interessantes em Tudo, a primeira, para Vivo Sonhando, de Tom Jobim, com arranjo de flauta, violão e voz mais convencional, que joga a favor da simplicidade da canção, que foi feita com aquele DNA de beira do mar que tanto nos dá conforto. Outra versão é surpreendente e ousada: Harvest Moon, de Neil Young, surge bem interpretada, respeitosamente tratada, com a inteligência de não querer transformá-la em algum híbrido brasileiro cosmopolita de araque. É o que sempre foi, uma bela e delicada canção Folk. Por fim, Bebel faz uma outra leitura brejeira para um dos pais da Bossa Nova, Luis Bonfá, que tem sua Saudade Vem Correndo revisitada com delicadeza.

Bebel assina a faixa título com Adriana Calcanhotto, cheia de violões e sutis intervenções de teclados e percussão, numa canção simpática mas esquecível, enquanto o imperdoável Seu Jorge participa de Novas Ideias, a rigor um semissamba, que tenta, em vão, recuperar o estilo dos duetos dos anos 1960. O grande êxito deste álbum em termos objetivos, está logo na primeira faixa, Somewhere Else, que Bebel canta em português e em inglês bem convincente. O arranjo é um arraso, com pianos, cordas, passarinhos ao longe e vocais belos, proporcionando um resultado belíssimo em termos de canção que honra a proposta inicial da carreira solo da cantora, ou seja, mesclar aqui e lá, num yin-yang atual. Além disso, ela assina letra e música, tudo singelo e surpreendente.

A carreira de Bebel Gilberto é interessante e marcada por um elegante espaço entre o lançamento de seus discos, que sempre têm algum pequeno e delicado tesouro escondido, que nos motivam a aguardar um álbum com uma incidência maior destas canções belas. Por enquanto, ainda são raridade.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.