Resenhas

Jackson Browne – Standing In The Breach

Novo álbum fala de amor e política em nível pessoal

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Ano: 2014
Selo: Inside Records
# Faixas: 10
Estilos: Folk Rock, Folk, Blues
Duração: 56:15min
Nota: 3.5
Produção: Paul Dieter

Para quem nunca ouviu falar de Jackson Browne, aqui vão algumas credenciais: contemporâneo de Neil Young e James Taylor, compositor dos primeiros sucessos de The Eagles, amigo de Joni Mitchell e daquele pessoal californiano desencantado do início dos anos 1970. dono de uma elegante e econômica carreira que contabiliza agora o seu 14º álbum, sempre orbitando o universo Folk Rock consciente e político. Talvez Browne tenha sido o mais lúcido compositor desta safra a perceber o desencanto pós-hippie se insinuando na vida da América. Ele foi cronista dessa transição, na qual as pessoas deixaram de lado boa parte da disposição para lutar e tentar revolucionar algo e abraçaram uma realidade que não queriam, mas não tinham como fugir. Jackson é destes cantores e compositores que só gravam quando tem algo a dizer.

Neste caso, o que motivou seu retorno após um hiato de seis anos foi a própria pós-modernidade, mesmo tema que inquieta seus contemporâneos, testemunhas de outros tempos, com velocidades menos extremas no cotidiano e valores distintos. A capa de Standing in the Breach, com uma cena de incêndio na cidade e um casal tentando fugir do caos, já entrega as intenções. Não espanta que antigos compositores engajados se percam neste mundo fluido, conforme preciosa interpretação do sociólogo polonês/alemão Zygmynt Bauman. Browne não fica no passado e não parece um ancião sem eira nem beira. Suas habilidades de compositor e cantor estão potencializadas pelo tema, sua voz permanece forte e suave ao mesmo tempo.

O conforto é tanto que ele se dá ao luxo de gravar uma composição de 1967, The Birds Of St.Marks, que só foi registrada agora. O arranjo é um delicioso aceno ao timbre clássico de guitarra de Byrds , com aquelas doze cordas reluzentes perpassando a canção sem qualquer atrito. Funciona como uma declaração de intenções, de identidade. Yeah, Yeah, a canção seguinte, lembra bastante o padrão springsteeniano de instrospecção, com guitarras acústicas delicadas e refrão que se vale totalmente da melodia harmoniosa para desembocar numa belezura Country Rock mais clássica. The Long Way Around é outra beleza da mesma origem, trilha sonora de passeio por uma highway em linha reta, com o sol se pondo e ausência de hora pra se chegar em algum lugar. Ryan Adams, fã dessa sonoridade, daria a mão direita para fazer algo semelhante. Leaving Winslow é um abraço no Country mais tradicional, algo que Browne fez poucas vezes na carreira. O arranjo é delicioso, com slide guitar pontuando os versos e uma cozinha discreta, porém marcante. If I Could Be Anywhere é híbrida, tem pianos pipocantes mas gênese eletrificada, no sentido Folk do termo, faz bonito e encerra algo próximo de uma primeira metade do disco, com Browne cantando If I could be anywhere in time, I would want to be here.

You Know The Night é a primeira cover do disco, com Jackson acenando para o original de Woody Guthrie, num raro momento romântico deste que era considerado o trovador socialista, que ostentava os dizeres “this machine kill fascists” em seu violão. O arranjo se equilibra na fronteira entre Folk e Country urbanos, mas tudo tem leveza suficiente para ser trilha sonora de casal se abraçando num parque de diversões. Walls And Doors já dá uma rasteira no ouvinte e o puxa para um clima cinzento e tristonho, com Browne dizendo que “desde que o mundo existe, existem muros e portas”. Which Side, versão para original do compositor e cantor cubano Carlos Varela, é uma cacetada política no nível do indivíduo, conclamando todos a se posicionarem diante das questões da vida, como a forma mais inerente de participação das decisões cotidianas. O arranjo é quase Blues, com órgão Hammond participando com precisão. A canção título chega em seguida, imersa em pianos e contemplação, ampliando o debate e funcionando quase como um manual de sobrevivência nos dias atuais. O fecho Folk, dedilhado no violão, com cara de autoconhecimento, chega na pungente Here, quase em forma de oração.

Jackson Browne não é popular como Neil Young, nem tão camaleônico como Bob Dylan e nunca quis. Esteve mais como testemunha da vida louca dos anos passados, relatou em seus elegantes álbuns e ressurge, como quem não quer nada, para manter seu diário de vida atualizado. Como gentileza, ele resolve contar aos que se interessarem, o que pensa da vida. Nos resta aceitar seu convite. Beleza de disco.

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BOM PARA QUEM OUVE: Ryan Adams, Neil Young, Wilco
MARCADORES: Blues, Folk, Folk Rock

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.