Resenhas

The Coral – The Curse Of Love

Disco engavetado em 2007 ressurge com belo painel musical

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Ano: 2014
Selo: Skeleton Key
# Faixas: 12
Estilos: Rock, Rock Alternativo, Rock Psicodélico
Duração: 40:05min
Nota: 4.0
Produção: James Skelly

The Coral é uma pequena preciosidade melódica. É diferente de toda a leva de bandas surgidas no cenário mundial na virada do milênio. Enquanto seus contemporâneos viviam (e vivem) da salvagem dos destroços da década de 1980, o quinteto da cidadezinha de Hoylake, próxima a Liverpool, se esmera na recuperação de uma sonoridade psicodélica sessentista muito pessoal e rara, urdida no passado por formações como Love, The Doors e até Procol Harum. É um mar aberto de canções alegres, bem humoradas, turbinadas com a alquimia entre instrumentos acústicos e efeitos eletrônicos – sempre usados com inteligência.

Apesar desta fórmula ter pavimentado a carreira de The Coral nos primeiros quatro álbuns, seus integrantes se cansaram de soar como piratas bem humorados o tempo todo e, em algum lugar de 2007, resolveram submergir em águas revoltas para gravar um álbum só com melodias entristecidas e contemplativas. O resultado nunca viu a luz do dia, pelo menos até agora. The Curse Of Love é o somatório de canções gravadas naquela época, sob o signo da tristeza e o desejo de sair dos holofotes da fama. O líder e vocalista James Skelly conduziu o projeto na época e o consenso entre os integrantes era que o momento não parecia o mais adequado para uma mudança sonora abrangente. Ironicamente, The Coral tornou-se rapidamente uma lembrança daquela década de 00, tendo lançado seu último álbum de inéditas, Butterfly House em 2010.

O espaço de quatro anos entre os lançamentos beneficia The Curse Of Love, que tem seu clima soturno realçado. A faixa título dá o tom exato das intenções, com progressão acústica de violão e teclados em ritmo de valsa, numa narrativa chuvosa sobre o sofrimento que vem com os amores não correspondidos. Wrapped In Blue tem bateria nervosa e uma ambiência que faz o ouvinte lembrar de gloriosas canções do passado, como Alone Again Or, dos californianos de Love. You Closed The Door tem mais levadas sinuosas, baixo dobrado e oscilações de flauta e efeitos na guitarra, tudo muito simpático e tristonho, mas nunca depressivo. The Second Self, toda instrumental, é uma canção de navegação, uma pequena marcha, com teclados e escaletas pontuando uma sucessão de acordes brejeiros. View From The Mirror é a primeira incursão no terreno da tristeza em sua forma mais usual, nada engraçadinha ou alvo de autocomiseração. É canção nublada, de tarde cinza e tentativa de ver o horizonte, encoberto pela distância, pela lembrança ou pelos tons de nuvens que obscurecem a paisagem.

The Watcher In The Distance é psicodélica, cheia de tonalidades guitarreiras e ambiência acústica preservada em tonéis de carvalho. Gently é o meio do caminho entre uma canção de amor e uma canção de ninar, tudo pontuado por teclados que fazer parecer uma garoa colorida sobre algum gramado da nossa infância. Willow Song é crocante, com introdução de guitarras e vocalizações que lembram formações Folk Psicodélicas do fim dos anos 1960. The Golden Bough segue pelo mesmo caminho singelo, sendo sucedida por The Game, mais uma pequena pérola acústica e lírica, com cara de passeio no parque ao fim da tarde. Nine Time The Color Red se dá ao luxo de passear na chuva sob uma sombrinha colorida e ostentar um clima bucólico de alguma pintura na sala de estar da casa da nossa avó. Uma reprise da faixa título em andamento mais enguitarrado vem fechando o disco com chave de ouro.

The Curse Of Love não só é o melhor trabalho já gravado por The Coral, como revela sensibilidade e inteligência musicais em altos níveis. Dá para ter vontade que a banda continue e tenha mais momentos amuados como este. De tirar o chapéu.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.