Resenhas

Ana Ghandra – Slowly EP

Cantora mineira revela sonoridade estrangeira em seu relato de estreia e emociona através de sua bela voz

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Ano: 2015
Selo: Mono.Tune Records
# Faixas: 5
Estilos: Folk
Duração: 22:00
Nota: 3.5
Produção: Paes

Poucas coisas conectam pessoas e música quanto a crueza de uma performance e o rudimento folclórico que nos coloca em comunicação através de diversas formas de expressão. Essa relação, que nos primórdios vinha de rituais indígenas e africanos, ou por trovadores, por exemplo, hoje em dia pode ser expressa no chamado Voz e Violão, estilo que se materializa na nomenclatura Folk. “Simples” em sua confecção, devido aos poucos elementos para se criar uma música complexa em sua lapidação, o estilo é bastante popular no Brasil em diversas vertentes, mas poucas se assemelham a Ana Ghandra.

Slowly EP é o primeiro relato da cantora e, embora lançado em 2014, recebe finalmente o alcance necessário através de um relançamento da Mono.Tune Records. Ana revela algumas particularidades que tornam o seu som ainda mais peculiar: mineira de Ipatinga, ela escolheu se instalar no calor da histórica Olinda para criar os relatos presentes na sua estreia. Ainda como residente da bela cidade, ela revela um gosto bem menos tropical em suas composições e se assemelha a nomes estrangeiros interessantíssimos e bastante queridos por aqui, como Cat Power e Sharon Van Etten.

A delicada voz da cantora tem um poder impressionante em suas composições e não tem nada do básico violão e voz: temos aqui uma banda de apoio competentíssima. No entanto, o que me impressiona nesse curto relato é a capacidade que Ana tem de emocionar seus ouvintes com a suas melodias de voz – não importa se você não entende as sua bonitas letras em inglês, pois a fluidez entre Ana e instrumentos é riquíssima -, como em This World: Love, reverberada e arrepiante abertura que mostra os mantras melancólicos da cantora ao público pela primeira vez.

Mirror segue essa toada e puxa mais para a raiva e aspereza de dedilhados de inspirados cantores, como José Gonzalez, com seu pano de fundo instrumental o regionalismo musical vindo de trompetes do faroeste e orgãos religiosos. Ao final, temos a sensação de que estamos diante de um filme desertíco tarantinesco nessa excelente faixa. Em alguns instantes, o Rock Alternativo dos anos 1990 entre em cena como em The Code, canção mais direta da obra e única verdadeiramente elétrica da cantora, que nos faz sorrir com o gostinho de Breeders que sentimos.

No entanto, o apíce de Slowly passa por Radiosoul, épica faixa de sete minutos que nos deixa perdidos em sua letargia meláncolica e que emociona como poucas cantoras em seu refrão. Tristeza e beleza se fundem aqui em um só produto e a chance de se entregar à canção em momentos de desespero é extremamente tentadora: “music is my only friend until the end”, canta Ana, e como não é possível se identificar com a frase logo de cara? A partir de sua metade, instrumentos surgem e a complementam como se isso fosse ainda necessário – algo que evidentemente não é no melhor momento do EP.

Ana Ghandra tem as características para se tornar uma musa em terras nacionais ao abordar um gênero comprensível à maioria dos brasileiros e por fazê-lo de uma forma pluralista: diversas vertentes do Folk surgem nesse EP, mas o que fica é o poder da voz da cantora mineira e também a sua criatividade. Ouça, por exemplo a faixa título – uma aparentemente básica canção de violão e voz, mas om inspiração em seu nome e vagarosamente vai diminuindo o seu tempo musical para se tornar sublime- , para entender esta promessa musical e sorrir emocionado no fim.

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BOM PARA QUEM OUVE: Rubel, Cat Power, Sharon Van Etten
ARTISTA: Ana Ghandra
MARCADORES: Folk, Ouça

Autor:

Economista musical, viciado em games, filmes, astrofísica e arte em geral.