Resenhas

Shamir – Ratchet

Álbum de estreia do músico se torna um dos mais interessantes discos Pop de 2015

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Ano: 2015
Selo: XL Recordings
# Faixas: 10
Estilos: Indie Pop, Dance, House, Nu Disco
Duração: 41'
Nota: 4.0
Produção: Nick Sylvester

Já começo este texto dizendo que Ratchet é um dos discos Pop mais corajosos de 2015 – e talvez de toda a década. Esse é o abre-alas do novato músico que cresceu em Las Vegas sendo o “esquisito da classe”. Negro, post-gender e dono de um visual andrógeno, não é difícil imaginar que a infância e adolescência de Shamir não foram lá muito fáceis, porém foram períodos que o ajudaram a se aceitar e não ter que se esconder. Essa força adquirida por não se encaixar, assim como as tais “esquisitices”, são os principais ingredientes deste álbum e também os principais motivos para ser tão honesto.

Prova disso vem já na primeira faixa: Vegas. Falando sobre sua terra natal, o músico brinca com a ideia da “cidade do pecado” e de toda uma permissividade aludida a ela (“Vegas, we’re sinners all right, at least at night”), ao mesmo tempo que traça um comentário não tão positivo assim sobre a vida hedonista da cidade, mas o músico fala também de si mesmo e dedica grande parte do álbum a isso. Ele se mostra em um misto entre confiança e vulnerabilidade, que, mais que um personagem, revela Shamir como ele é. Letras como “If I’m a demon, baby/you’re the beast that made me” (Demon), “Just can’t make a thot a wife/No more basic, ratchet guys/Listen up, I’m saving you/From all the hell that you’ll go through” (Call It Off) e “I’ll be back someday, and when I do I promise you, I won’t make the same mistake” (In For The Kill) falam de relacionamentos que acabaram, mas explora de maneiras diferentes as emoções do artista ao lidar com elas.

Dando sustento a essas suas letras que demonstram o lado mais obscuro do amor, está um fundo musical surpreendentemente divertido. Há muito do Pop oitentista repaginado com tons modernos de gente como LCD Soundsystem, Hot Chip e Hercules and Love Afair. House, Dance, Disco e outros ingredientes da época interagem livremente com tendências eletrônicas modernas gerando faixas extremamente dançantes: Make A Scene com seu clima Dance Punk DFA Records, o single On The Regular e sua pegada 212 (single que fez Azealia Banks estourar), Call it Off com seu vibrante toque europeu, In For The Kill que brinca com o Jazz, quase como o duo sul africano Gold Fish faz em sua música e por aí vai. Ratchet é um caldeirão de referências que se moldam muito bem à música de Shamir e que complementam a lírica da forma mais Pop possível.

Apesar das referências a princípio soarem datadas, o resultado do encontro delas é bem contemporâneo. Shamir parece não só repaginar esses ecos da música dos anos 80, como também traduz esses ritmos aos dias de hoje – trabalho que tem também o toque do produtor Nick Sylvester -, aliando isso tudo as mensagens que quer passar. E ao cavar fundo, você encontrará temas que vão muito além da casca dançante de um álbum Pop feito à base de relacionamentos frustrados: há um interessante questionamento de gêneros (e sobre sexualidade) ali. “Mesmo que meu trabalha seja somente criar arte, eu acho que sendo uma pessoa sem gênero… abala as pessoas. E quando isso acontece eu sinto que meu trabalho está cumprido”, disse o músico em uma recente entrevista. É por esse e outros motivos que volto a reforçar, esse é um dos discos Pop mais corajosos de 2015.

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Autor:

Apaixonado por música e entusiasta no mundo dos podcasts