Resenhas

Tiago Iorc – Troco Likes

Novo álbum é acerto do início ao fim, resgatando do limbo o Pop em português

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Ano: 2015
Selo: Slap
# Faixas: 11
Estilos: Pop Alternativo, Rock Alternativo, Folk Rock
Duração: 40:35
Nota: 4.0
Produção: Tiago Iorc e Alexandre Castilho

O quarto álbum de Tiago Iorc vem resgatar uma tradição de bons discos Pop brasileiros que parecia perdida há muito tempo. Aqui no Brasil, parece que só há espaço para cantores neste segmento musical que tenham algum tipo de referência ao Pagode, ao Axé e seus derivados ou ao Sertanejo Universitário. Canções com a inspiração radiofônica anglo-americana é artigo de luxo hoje em dia, infelizmente. De qualquer forma, Tiago, que até agora cantava quase sempre em inglês por opção estética, veio escrever seu nome ao lado de gente como Ritchie, Lulu Santos, Nando Reis, Nei Lisboa, Guilherme Arantes, Moska e, mais recentemente, Marcelo Jeneci e Silva. Troco Likes desce fácil, redondo e alia, de forma espontânea, belas letras, melodias bem trabalhadas e uma produção cristalina, que simplifica sempre que possível, evitando cabecismos desnecessários.

Tiago tem um público diversificado. Ao lado de fãs colhidos a partir de suas incursões por trilhas sonoras de novelas e minisséries globais, geralmente com covers de canções consagradas, como My Girl (Temptations) e What A Wonderful World (famosa na voz de Louis Armstrong), há uma consistente legião de admiradores de seus trabalhos anteriores, sobretudo Zeski, lançado em 2013. Levando em consideração suas canções densas e climáticas, a proposta que é apresentada em Troco Likes acena com uma mudança que vai além da escolha do português como idioma utilizado nas faixas, porém, se um sujeito é capaz de escrever um verso belo como “a gente queima todo dia mil Bibliotecas de Alexandria”, referindo-se à alta velocidade do mundo virtual e que norteia as relações de muita gente, deixando de lado o que talvez importe mais (em Alexandria), só podemos ficar felizes com essa nova orientação.

Troco Likes traz onze canções, sendo que Till I’m Old And Gray surge como faixa-bônus. Tiago colhe resultados impressionantes ao longo do disco, sempre com simplicidade que disfarça meticuloso trabalho de compositor/cantor. Amei Te Ver, com levada suingada e instrumental com violão e guitarra, é canção de amor sobre a linguagem na qual somos fluentes a partir do olhar bem dado e recebido e do quanto pode surgir em sua decorrência. Mil Razões é balada singela e cheia de belo trabalho de violão e a poética surge em belezinhas como “posso compor mais cem canções de amor, pra que, se quando eu canto você some”, mostrando vulnerabilidade na medida certa. Eu Errei segue o mesmo caminho, seja em andamento, clima e habilidade ao violão.

De Todas As Coisas surge com palhetadas, clima levemente latino e uma semelhança involuntária com um velho sucesso das FMs do século 20, Happy Man, do grupo americano Chicago, mostrando que Tiago tem noção exata do que está fazendo ao abraçar o Pop de procedência mais clássica. Coisa Linda é uma derramada balada de amor, nunca piegas, provavelmente composta e cantada para a namorada. Troco Likes dá uma providencial guinada a partir da belíssima Bossa, quando as canções de amor são deixadas de lado em favor de uma retórica otimista sobre a humanidade e os rumos da vida em sociedade, em versos como “as pessoas não precisam ser iguais às outras”, nos quais Tiago se posiciona como um cronista discreto do cotidiano das relações. Cataflor, uma das mais belas faixas do álbum, assume uma contemplativa postura de observador sentimental das pessoas, numa espécie de declaração universal de amor. Arranjos belíssimos de cordas pontuam o refrão, dando o chantilly instrumental necessário. As cordas novamente pontuam Liberdade E Solidão, com arranjo sutil e dedilhado de violão, lembrando alguma balada da fase mais recente de Skank, com delicadeza por todos os cantos.

A melhor canção do álbum é, sem dúvida, Sol Que Faltava, reeditando essa postura positiva e universal que está por toda parte. O andamento rápido e o refrão com e no mar de tanta indiferença, era o sol que me faltava, como se fosse algum andarilho a cantar ao vento. A faixa-bônus, em inglês, Till I’m Old And Gray, lenta, apenas com voz e violão, talvez soe desnecessária em meio ao clima do disco, mas não chega a atrapalhar a bela experiência que Tiago propõe em Troco Likes, disco bem acabado, simpático e arejado como um piquenique numa tarde de sábado, sob árvores e com vários amigos ao redor.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.