Resenhas

Conrad Keely – Original Machines

Líder de … And You’ll Know Us By The Trail Of Dead estreia com álbum solo biográfico

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Ano: 2016
Selo: Superball Music
# Faixas: 24
Estilos: Rock, Rock Alternativo, Singer-Songwriter
Duração: 55:50
Nota: 3.5
Produção: Conrad Keely

Vejam que interessante: Conrad Keely, mente pensante e líder da boa banda …And You Know Us By The Trail Of Dead, inicia sua carreira solo com este estranho álbum Original Machines. Alguns motivos para o estranhamento: são 24 faixas com média de dois minutos de duração, escritas na estrada, em meio à mais recente turnê do grupo americano e, no novo lar de Keely, que decidiu mudar-se de mala e cuia para o … Camboja. “Estou de saco cheio da vida americana”, declarou ele na época, e mudou-se para o país do Sudeste Asiático. Pouco depois de lá instalado, Keely foi pai pela primeira vez, separando-se logo em seguida. Tá bom pra você em termos de mudanças profundas em curto espaço de tempo na vida de uma pessoa? Está.

Keely é bom vocalista, bom guitarrista e tem um fraco por Rock clássico dos anos 1970, mais precisamente por bandas e artistas que são atrelados ao Progressivo mas que escapam das caras feias do senso comum apunkalhado em vigor, a saber, Rush e Pink Floyd. Felizmente, ele equaciona essas influências de maneira sutil, mais amplamente em sua banda, mas há traços também em Original Machines. As canções são curtas, diversificadas, com todos os instrumentos tocados por Keely, muitas vezes tendendo mais a parecerem rascunhos que composições finalizadas. Isso dá um senso de obra em movimento, que convida o ouvinte para a intimidade, como se fosse dado a ele a chance de sentar na mesa com o artista, participar de suas decisões, finalizar o conceito do melhor jeito possível. Ainda que a curta duração das músicas forneça certo clima caótico ao disco, há um senso de união entre elas, como se fossem tópicos de uma conversa com alguém que tem muito a dizer. Levando em conta as últimas vivências de Conrad, assunto é o que não falta por aqui.

A maioria das composições é tem estrutura dimensionada para guitarra/violão e voz, com baixo e bateria completando a formação básica. Há algumas sutilezas no meio do caminho. Engines Of The Dark, por exemplo, tem levada tradicional calcada em violões e pianos, com bom resultado. Row Away tem tecladinho de brinquedo, clima oxigenante e luminosidade. In Words Of Not So Famous Man desfila lentamente com presença marcante de violoncelo, guitarras encrespadas e certo clima de revelação final antes de sermos atingidos pelo meteoro. Outras faixas poderiam estar num álbum de Trail Of Dead, especialmente a sinistrinha Your Tide Is Going Out, Lost In The Flow tem guitarras alternativas típicas dos anos 1990, vocais interessantes e uma eletrônica muito sutil arrematando tudo. Já All That’s Left Is Rain e Nothing That I Meant (Interestellar) são pequenas baladas floydianas, pelo menos na intenção, emulando até as explosões típicas nos refrãos da banda inglesa em suas criações mais tradicionais.

Há espaço para esquisitices: The Jungles tem andamento intermitentes, com timbres de teclados curtos e boa bateria/percussão pavimentando o terreno aqui e ali. Hills Of K-Town é um Hardcore de bolso, pesadinho mas com bastante melodia, enquanto Drive Back To Phnom Penh parece uma canção de Foo Fighters transfigurada e submetida a sessões de terapia jungiana, com bons resultados. Forbidden Stones, por sua vez, é misteriosa, noturna e sutil, com mescla de eletrônica e instrumentos de cordas típicos do Sudeste Asiático.

Se há um elemento que unifica este conjunto de criações, é a belíssima voz de Keely. Traço marcante também dos melhores momentos com Trail Of Dead, o timbre alcançado pelo registro vocal sugere transcendência, alguém em paz, vendo a vida em perspectiva. Não dá pra dizer se a mudança de país ou os eventos recentes fizeram isso por Conrad Keely, mas podemos afirmar que seu álbum é sincero, cumpre a função de parecer um instantâneo do momento que ele vive, que, mesmo complexo e cheio de eventos em cadeia, coube nesses 55 minutos de música. Interessante.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.