Resenhas

Sarah Neufeld – The Ridge

Integrante de Arcade Fire lança disco solo com apego à música instrumental

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Ano: 2016
Selo: Constellation Records
# Faixas: 8
Estilos: Experimental, Instrumental, Neoclássico
Duração: 43:09
Nota: 3.5
Produção: Jordan Koop

Sarah Neufeld é compositora e violinista, integrante do grupo Arcade Fire desde seu segundo álbum, Neon Bible, lancado lá em 2007. Sua presença na banda canadense trouxe certa dramaticidade urbana que incorporou-se naturalmente à sonoridade dos sujeitos, dando mais foco e perspectiva, provavelmente, contribuindo para o enorme sucesso que o grupo passaria a fazer desde este disco. Em paralelo, Sarah tem uma carreira solo interessante, na qual utiliza seu instrumento, sua voz e dotes de compositora para levar adiante um trabalho que se equilibra entre as linhas que dividem os terrenos ocupados por Rock Alternativo e uma certa música erudita/clássica que empresta algo das trilhas sonoras de filmes de fantasia e livros de magia. Mais que isso: Sarah é esperta o bastante para revestir suas criações com alguma melancolia existencial, impedindo qualquer deslize rumo a sonoridades exageradas, pelo contrário: é tudo elegantemente contido por aqui.

The Ridge é composto por oito canções predominantemente instrumentais, nas quais as etéreas vocalizações de Sarah são utilizadas como mais um integrante da paisagem sonora, nunca como protagonista. O violino é protagonista por aqui, mas nunca chega a resvalar na demonstração sem sentido de talento ou rapidez. Tudo está a favor dos climas, das texturas, das nuances, quase que convidando o ouvinte a apropriar-se da música e utilizá-la em suas próprias viagens mentais, sem estabelecer parâmetros ou forçar algum tipo de relação com imagens prévias. É música para fechar os olhos e seguir em frente, seja para onde for. Também é som para colocar em fones de ouvido e contrastar com a rapidez e a ferocidade do cotidiano, tentando enteder sentidos, motivos e razões.

Há muito de cinematográfico por aqui, de interpretativo, mas tudo soa à disposição de quem chegar e automaticamente consonante com o que estiver pensando. É música adaptativa, metamórfica ou, se preferirem, “nem lá, nem cá”, “nem barro, nem tijolo”, “nem carne, nem peixe” ou qualquer outra expressão do século 20 que transmita certa – mais confortável – indefinição. Nem tudo é tão brando e celestial assim, a abordagem que Sarah propõe é muito devedora do que entendemos por Rock Alternativo, lembrando, inclusive, uma versão Hobbitt de Arcade Fire em vários momentos, com direito à presença do próprio baterista da banda, Jeremy Gara, entre os músicos convidados.

A faixa-título tem beleza exemplar, com mistério e nebulosidade em doses convidativas, o violino é estrela na intrigante We’ve Got A Lot, bem como vocalizações que chegam d’além da vida, compondo um painel interessante e razoavelmente incomum nos dias musicais de hoje. A técnica de “stacatto” permeia os sons e caminhos na interessante The Glow, com generosidade suficiente para abrigar pinceladas atmosféricas de sons gelados e pluviométricos. Há mais algo de Arcade Fire nas tonalidades campestres e pastoris de Where the Light Comes In, que tem algo de música tradicional celta em seu DNA, trazendo um pouco mais de opção para o cardápio de danças a se fazer com o cérebro.

The Ridge é criatura híbrida, clássica e alternativa, tudo ao mesmo tempo, mas convidativa o bastante, para abrigar fãs de música instrumental, Rock do século 21, admiradores de Arcade Fire e aficcionados por artistas que já pisaram neste terreno dual no passado, como Mike Oldfield, Kate Bush e por aí vai. Bonito, Sarah, bonito.

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.