Resenhas

John Carpenter – Lost Themes II

Veterano diretor americano solta seu segundo álbum de composições

Loading

Ano: 2016
Selo: Sacred Bones
# Faixas: 12
Estilos: Trilha Sonora, Eletrônico, Instrumental
Duração: 47:28
Nota: 3.0
Produção: John Carpenter, Daniel Davies

Há algum tempo, cerca de um ano, descobri que o veterano cineasta americano John Carpenter havia lançado um álbum, intitulado Lost Themes. Fui averiguar e descobri que ele, além de bom diretor de cinema, também era responsável por todas as trilhas sonoras de seus filmes. Quem era moleque nos anos 1980 há de lembrar de obras sensacionais como Halloween e suas sequências, O Enigma do Outro Mundo, Alguém Me Vigia, Fuga de Los Angeles, Christine, o Carro Assassino e a melhor delas, Os Aventureiros do Bairro Proibido. Se você gosta de filmes de terror B e suspense, com ênfase em lutas marciais e ficção científica obscuros, pode assistir a todos estes longas e se converter. Pois bem, temos então Carpenter como um compositor de trilhas, um cara com sensibilidade suficiente para assinar a música de suas próprias criações. Confesso que não lembro de outro caso no cinema americano recente.

O tal álbum que John lançara em 2015 marcou sua estreia em música desvinculada de um filme, mas parece, inclusive pelo título, com um apanhado de faixas e sobras de trilhas obscuras ou não aproveitadas pelo homem em criações do passado. Carpenter, macaco velho e malandrão que é, usou o título a seu favor, com a intenção de despertar exatamente esta dúvida no público. Funcionou tanto que, cerca de um ano depois, cá está ele repetindo a dose. Novamente assessorado pelo filho, Cody Carpenter e pelo neto, Daniel Davies, John soltou este Lost Themes II e, num movimento totalmente inédito em sua vida, anunciou sua primeira excursão como músico em 2016, tendo show marcado, inclusive, para o Festival Primavera, na Espanha. Resumindo: John Carpenter não está para brincadeiras, pessoal.

Os dois Lost Themes são bem parecidos, consistindo de música eminentemente instrumental e levemente cafona. A ideia é essa mesmo, a de fornecer um correspondente musical à sua própria obra como diretor de cinema. Se os filmes resvalam para gêneros populares e fantásticos, não é surpresa perceber nas criações musicais de John um viés bem parecido, que se materializa em arranjos que emulam Rock mais pesado e Eletrônica sem muito conceito. Parece música genérica, mas a presença do sujeito, de alguma forma se funde à própria canção, conferindo algo que ultrapassa o espectro puramente musical, mais ou menos na base do “caramba, isso aqui é banal, mas é o John Carpenter que está por trás disso”. Essa sensação pode ser interpretada como negativa, mas não é.

Como foi dito, a coerência é o principal ponto forte do álbum. Há arranjos eletrônicos e guitarreiros na base de um Nine Inch Nails feito por correspondência, em Distant Dream, a faixa que abre o álbum, que se mantém na seguinte, White Pulse, mas com teclados canastrões que indicam parentesco com a música cinematográfica B dos anos 1980. Persia Rising tem alguma etnicidade diluída em timbres tecladeiros melodramáticos, que se mantém em Angel’s Asylum, que, como o nome indica, tem ambiência que nos faz pensar que o fim dos dias chegou numa explosão de dramaticidade e de alternância entre sonoridades sintéticas e dedilhados de violão/guitarra que beiram a canastrice deliberada. Hofner Dawn tem pinta de canção religiosa e solene, enquanto Windy Death procura ser mais noturna e contemplativa, mas igualmente frequentadora desta solenidade. Dark Blues tem órgão e potencial câmera lenta, totalmente devedora do formato mais Pop das canções de trilhas sonoras de filmes para TV nos anos 1980. Virtual Survivor, logo em seguida, surge no mesmo clima.

Bela Lugosi, como o título entrega, é canção de susto e uso ostensivo de sintetizadores oitentistas a plena força, sendo completada em mais um apocalipse sonoro, desta vez, insinuado no drama tecladeiro de Last Sunrise, abrindo caminho pro fim do disco, materializado na dupla Utopian Facade, com cara de sci-fi B e na faixa-bônus Real Xeno, que poderia ser inserida na trilha sonora de uma das sequências de Alien, O Oitavo Passageiro, mas que envereda por um instrumental roqueiro de baixo, bateria e guitarra, que sugerem algo mais próximo de Mad Max.

A música de John Carpenter é indissociável de parâmetros cinematográficos e nem poderia ser diferente. Peças curtas, acessíveis, Pop e cheias de dramaticidade intencionalmente superficial. Assim é este disco, que deve soar ainda mais interessante ao vivo, com o homem no palco.

Loading

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.