Resenhas

Andy Stott – Too Many Voices

Produtor de Manchester lança quarto álbum minimalista e caótico

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Ano: 2016
Selo: Modern Love
# Faixas: 9
Estilos: Eletrônica, Experimental, Instrumental
Duração: 46:18
Nota: 3.0
Produção: Andy Stott

Andy Stott é um recluso produtor e multitecladista de Manchester, norte da Inglaterra. Seu trabalho é muito mais parecido com o de um “escritor de sons”, uma vez que praticamente não há palavras ou melodia em suas composições, parecendo mais com esboços ou ideias do que algo que tenha chegado ao resultado final. De vez em quando surge alguma sequências de batidas ou notas que nos dão a impressão de estarmos diante de algo mais convencional, mas é só por um momento. A ideia de Andy é usar a música eletrônica caseira para abordar as velhas questões da solidão, da existência nestes tempos estranhos e explorar a linguagem que seus teclados e computadores podem lhe fornecer.

A capa de Too Many Voices, este quarto trabalho de Stott, diz muito sobre o que temos aqui. Quatro bailarinas aparecem empreendendo um movimento, devidamente congelado pela fotografia em preto, branco e cinza, mostrando harmonia de formas e silêncio, sugerindo distância e a existência deste escudo invisível entre o que vemos e o que podemos alcançar. São estas questões paradoxais que adubam o terreno de composições de Andy, fornecendo uma frieza desejada, uma atitude de inserção nestas imagens em poucas cores, neste silêncio que ele vai quebrar com suas programações de teclados e batidas secas. Não há desejo de pensar em linhas sinuosas de baixo sintetizado ou algum efeito que nos faça divagar sobre como tal sonoridade foi atingida: são nove composições que se harmonizam como parte de um todo, ainda que a ideia de que estamos diante de um álbum conceitual esteja liberada para apropriações por parte do ouvinte, mas não soa como algo explícito ou necessário para a compreensão de Too Many Voices.

A grande exceção entre as composições é a bela terceira faixa, New Romantic, que, de acordo com o título, engata em vestígios de batidas e climas condizentes com o estilo, ostentando uma linha melódica incontestável, capaz de sustentá-la em pistas de dança que não seja muito ortodoxa. O single Selfish faz o caminho oposto, usando e abusando de sonoridades que tentam construir uma linha coerente de melodia ou mesmo uma batida, mas que não chegam a lugar nenhum, ou, pelo menos, nenhum identificável pelo ouvinte como algo em que haja certa ordem. Em alguns instantes, a sonoridade que Stott tira de seu arsenal tecladeiro parece com tiros e rajadas de metralhadora, criando uma impressão contraditória entre violência e ondulações no tempo-espaço.

As duas canções que completam o percurso proposto por Andy são a soturna Over, com ruídos industriais e arremedos de batidas futuristas em ordem não identificada e a faixa-título, que, surpreendentemente, traz vocais vaporosos e femininos, numa arquitetura de montagem que parece algo neo-renascentista ou qualquer outro rótulo ainda não criado. Esta canção e a já mencionada New Romantic podem soar como concessões involuntárias de Andy ao mundo convencional das melodias e das canções Pop, ainda que pareçam totalmente intencionais. Elas resgatam a beleza do uso da Música Eletrônica como força de expressão e asseguram o interesse dos que são minimamente interessados pela linearidade do Pop e que não se sentem totalmente à vontade num universo caótico de ruídos eletrônicos dispostos de acordo com alguma mente estranha.

Ainda que sejam exceções neste cenário, vale a pena ficar de olhos – e ouvidos – atentos no trabalho de Andy Stott. O articulista fica na torcida para que estas criações, especialmente a faixa-título, sejam as exceções que confirmem a regra do talento de Stott.

*(Too Many Voices em uma faixa: Too Many Voices)**

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.