Resenhas

Neko Case, k.d lang e Laura Viers – case/lang/veirs

Trio de cantoras oferece álbum belíssimo

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Ano: 2016
Selo: Anti
# Faixas: 14
Estilos: Folk, Folk Rock , Rock Alternativo
Duração: 43:13
Nota: 4.5
Produção: Tucker Martine

Temos aqui três cantoras: k.d lang, Neko Case e Laura Veirs, que decidiram somar forças e mandar brasa num projeto paralelo no qual cantam belas canções de têmpera Folk. Claro que não é tão simples, mas o resultado desta colaboração, o soberbo álbum case/lang/veirs, é uma pequena e inesperada aula de composição, canto e, acima de tudo, generosidade, que chega na forma de capacidade de interação sem que haja alguém desejando aparecer mais que as outras. Tudo funciona bem, da produção à execução, com momentos de excelência vocal poucas vezes vistos nestes tempos estranhos que vivemos, nos quais tocar e cantar bem não parece essencial. Estas três moças nos fazem crer que, mesmo que quisessem, jamais seriam capazes de cantar mal. A impressão que o disco nos passa é que tudo foi divertido, belo e simples, sentimento que chega aos ouvidos facilmente. É como se elas sempre tivessem trabalhado juntas.

Há canções lentas e melancólicas, nas quais arranjos, instrumental e vocais conseguem transmitir emoção na medida certa, sem que isso soa minimamente piegas ou meloso. É o caso de pequenas jóias como a pungente Song For Judee, na qual brilha o vocal principal de Laura Viers, teoricamente, a menos conhecida das três, também a que tem um registro vocal menos privilegiado. Com o que tem, Laura sai-se bem demais, sobrevoando um arranjo de cordas, cello e uma letra que faz menção à magistral cantora Judee Sill, morta em 1979. Lang e Case harmonizam pelos vocais de apoio adentro, como se fossem anjos, relembrando a lógica que norteia o disco: humildade na forma de equilíbrio vocal. Na canção seguinte, Blue Fires, que tem um arranjo jazzístico, lento e com guitarras encantadas, é Lang que canta para o firmamento, como se estivesse cumprindo sua última missão na Terra, e o faz naturalmente, dando a impressão que não conseguiria fazer de outra forma.

Ainda que as canções lentas sejam lindas, é nas mais rápidas e decalcadas do formato ainda imbatível que a versão californiana de Fleetwood Mac levou adiante nos anos 1970, que case/lang/veirs tem seus momentos de brilho mais intenso. O single Delirium é um exemplo disso, mesmo que não seja exatamente aerodinâmica, o andamento em midtempo joga a favor de um arranjo sessentista belo, com vocais principais de Neko Case, das três a mais afeita ao Rock. Há algo de canção de girl group da era de ouro da Canção Pop em Greens Of June, ainda que nada fique muito evidente logo de cara, restando a percepção para as sutilezas que as três vão deixando no caminho. Doçura Folk é o combustível principal de Behind The Armory e Supermoon, belas como uma tarde que tem o sol surgindo depois da chuva.

Best Kept Secret é a joia da coroa por aqui. Um arranjo de metais e entrecruzado por toques Soul é a moldura musical para uma melodia solar, preenchida totalmente pelas três cantoras, que soam como uma, seja nos vocais de apoio, seja no principal. As cordas e o clima lembram um belo álbum de Lang, Invincible Summer, no qual ela cita o escritor franco-argelino Albert Camus, ele, um existencialista taciturno, rendido ao poder curativo do verão. Todo estilo doce de Carole King está presente na placidez de 1,000 Miles Away, enquanto I Want To Be Here é uma viagem no tempo para a tal Sunny California de 1966, no máximo 1967, com uma precisão matemática. King também surge na languidez de Why Do We Fight, canção de amor como não se vê mais por aí, cabendo o fecho de percurso musical tão doce à stevienickiana Georgia Stars.

case/lang/veirs é um pequeno pedaço de lirismo, beleza, técnica, tudo em perfeito equilíbrio de forças. É um pequeno acontecimento da natureza, cheio de referências dos momentos mais clássicos e emblemáticos da canção Pop, mas totalmente sintonizado com o nosso tempo, mostrando três artistas que têm luz própria, mas que formam uma pequena constelação quando juntas. Coisa fina demais.

(case/lang/veirs em uma música: Best Kept Secret)

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.