Resenhas

Omar Rodriguez-Lopez – Corazones

Músico portorriquenho volta em álbum simples e direto

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Ano: 2016
Selo: Ipecac
# Faixas: 11
Estilos: Rock Alternativo, Experimental, Folk Alternativo
Duração: 35:21
Nota: 3.5
Produção: Omar Rodriguez-Lopez e Sam Margolis

Cá estamos nós para mais uma resenha de disco composto, tocado e gravado pelo gente boa Omar Rodriguez-Lopez. Desta vez, seguindo a lógica de vários lançamentos até o fim do ano, chegamos até um interessantíssimo registro, intitulado Corazones, bem diferente da parafernália experimental, roqueira, progressiva que o sujeito utiliza como meio mais usual de expressão na música. Seguindo um caminho oposto, mas capaz de flertar com esse lado esquisito, Corazones é um trabalho mais limpo, formal e que tem o Folk como ponto de partida. Não vá esperando, porém, uma coisa banal e plácida, ainda que haja espaço até para acenos sentimentais intensos ao longo do álbum. Omar é bom músico e aproveita cada momento para fazer fluir uma verve inquieta, curiosa, que tem um saudável desrespeito pelas convenções.

Este disco tem uma história bem interessante. Omar foi procurado para compor uma trilha sonora para um projeto cinematográfico, que acabou não se realizando. A ideia da trilha era trazer canções simples, de acordo com o pedido da produção. Tendo sua mãe como inspiração para as composições, Omar viu seu mundo ruir quando ela faleceu em meio às gravações e as canções adquiriram uma direção muito mais lúgubre do que ele havia imaginado. Com a ajuda de Sam Margolis na pilotagem do estúdio, ele conseguiu dar forma e contorno mais preciso dentro da terrível realidade que se instalou. Para quem perdeu a mãe – caso deste que vos escreve – é impossível não perceber a sensação de perda devastadora que chega nessa hora. É uma perda diferente de tudo o que podemos pensar em termos de dor e, conforme o próprio Omar declarou, buscando informar a imprensa sobre o álbum, é uma dor que traz perda de identidade, tamanha é sua magnitude. De alguma forma, em todo o seu escopo, Corazones traz essa sensação.

Tal cenário doloroso e extremo dá um contorno solene ao álbum. Suas canções partem do formato Pop usual, usando convenções como refrão, solo de guitarra, duração por volta de três, quatro minutos e vocais com poucos efeitos. Em várias faixas, Omar tem os vocais de apoio de Teri Gender Bender, sua companheira na banda Bosnian Rainbows. Os arranjos também são convencionais, com uma banda de apoio tocando pelo disco adentro. O destaque logo de cara vai para a faixa de abertura, a bela We Feel The Silence, que tem violões, gaita e uma progressão bela, se arrastando num ritmo cadenciado e preparando uma explosão instrumental do meio pro fim. Poderia ser uma sobra de estúdio de Beck em Sea Changes, o seu soberbo álbum deprê, lançado no início dos anos 00, só que com mais barulho. A canção seguinte – e também single do disco – Running Away, tem um clima de início dos anos 1980 que é quase irresistível. O único ponto fraco é a voz de Omar, que canta em falsete, num timbre que soa meio fora de lugar. Mesmo assim, o resultado é muito acima da média e mostra que o sujeito tem noção exata do que uma canção pop dourada precisa ter.

O desfile de melodias interessantes segue adiante. It Was Her e Dead Heart têm bom desempenho, mas já mostram o peso da esquisitice querendo se insinuar, especialmente na segunda. Lola chega em seguinte, soando como uma canção de ninar mas que vai dar certo medo na criança e provavelmente fazê-la ter algum pesadelo, uma vez que oscila entre a doçura e um flerte com o lado negro da Força, personificado por guitarras que invadem a melodia singela lá pelo meio da faixa. Sea Is Rising tem bom trabalho de violões e guitarras, especialmente destas últimas, que conduzem a melodia oitentista com bom desempenho. A voz de Omar surge bem melhor por aqui, novamente lembrando alguma canção Pós-Punk pouco convencional. Certainty também surge imersa em violões dedilhados, pompa e pianos solenes, abrindo caminho para o ritmo de Arrest My Father, mais uma criação tributária dos anos 1980. As três últimas canções representam bem a diversidade de climas oferecidos ao longo do disco: Some Sort Of Justice é doce, com violões e mais parentesco com Beck; Five Different Pieces é animadinha, parecendo banda dos anos 00 tentando soar como em 1984, enquanto o fecho chega com If I Told You The Truth Would Be Made Of Lies e sua melodia triste, com arranjo guitarrístico e certa anarquia de vozes e bateria, mostrando que, talvez, Omar já estivesse cansado da normalidade reinante.

Omar Rodriguez-Lopez e a gravadora Ipecac prometem doze álbuns até dezembro e nós estaremos aqui, prontos para dissecá-los. Promessa de criatividade e surpresas ao longo deste segundo semestre. Omar é legal, ousado, imprevisível e manja do negócio. Próximo!

(Corazones em uma música: We Feel The Silence)

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.