Resenhas

inc. no world – As Light As Light

Duo americano tenta recriar climas do Soul dos anos 1980

Loading

Ano: 2016
Selo: 4AD
# Faixas: 13
Estilos: Pop, Pop Alternativo, Indie R&B
Duração: 52:32
Nota: 2.5
Produção: Daniel Aged

O R&B, ritmo responsável pela configuração do que se chamou de Rock’n’Roll lá nos anos 1950, condutor do profano e do sagrado da música negra americana, setor de conforto de gente como Ray Charles e James Brown, transformou-se em uma música urbana, eletrônica, asséptica e “climática”. Pelo menos o que a imprensa musical chama de “Neo” R&B, essa forma de canção feita geralmente por duos e artistas/produtores, que dominam vários instrumentos, cantam, pensam, executam, cobram escanteio e vão pra área tentar a cabeçada. São caras moderníssimos, ultracool, trendsetters, hipstersmillenials, key-opinion leaders, brainstormers e gamechangers da música. São caras introspectivos, meditativos, soturnos, porém que se expressam musicalmente em formas lânguidas, sexy e fluidas. É tudo muito adjetivado, substantivado para pouco conteúdo musical. Pena.

Não quer dizer que este segundo álbum da dupla inc. no world, As Light As Light seja inapelavelmente ruim. Ele só é terrivelmente esquecível, poser e pretensioso. Talvez nem seja culpa dos irmãos Daniel e Andrew Aged, a dupla em si, que se limitam a erguer molduras instrumentais que partem da Eletrônica Pop dos sucessos oitentistas. Parece que só ouviram este lado da moeda, deixando o sangue nas veias, a vida, a dança e a urgência de antanho para lá. Nem se trata de esperar que a sonoridade da dupla obedeça algum curso lógico e estilístico, até porque tal anseio seria limitador, algo que não somos por aqui. Apenas se trata de esperar que algo surja além de uma aura cool forçada e relax, construída sem muita convicção e que acaba se tornando a principal via de acesso para um álbum inteiro de canções, até porque, todas elas parecem se interligar de alguma forma, garantindo essa impressão de uma “marca registrada”.

As Light As Light, já no título, evoca essa leveza malandra e meio rasa que a dupla se dispõe a trazer para o ouvinte. E tome vocais em falsete, batidas intencionalmente datadas e muito timbre de teclado e guitarras sugerindo naturalidade fluida. Às vezes funciona, como em The Wheel, na qual o duo evoca momentos que poderiam ser de alguma balada romântica de um N’Sync, por exemplo, com muita referência dessa música acrílica feita em série para meninas suspirarem, sempre lembrando que tal produção sempre foi bem eficaz. Em In Your Beauty essa sensação fica mais intensa, com um domínio maior dos vocais sutis da escola Smooth Soul oitentista, obtendo resultados interessantes, sempre no terreno da delicadeza, com destaque para as boas programações de bateria e percussão, que quase soam como em alguma faixa de Eletrônica minimalista. Ambas também exibem duração além dos cinco minutos, desafiando o tal formato radiofônico, algo que talvez só sirva como parâmetro falso hoje em dia.

Pena que a proposta sonora perca força ao longo do disco, muito pelas canções não exibirem qualquer variação, sempre com os mesmos tiques e taques nos vocais sussurrados/ofegantes, nas mesmas timbragens de teclados e na guitarra, quase sempre imersa no borrão difuso e aquático que sai das caixas de som. Há momentos em que a aura conceitual e estilizada alcança capacidade de irritar, caso dos dois Hymn, 1 e 2, que surgem como introdução e conclusão do álbum, conferindo a ele um verniz conceitual que ele não tem.

É possível perceber o talento e as boas influências no trabalho dos irmãos Aged, mas eles precisam de mais tempo para aprender a dosar os climas e melhorar as habilidades de composição, que são, além do padrão uniformizante das canções, o grande ponto fraco do álbum. Não é caso de condená-los, mas de enfatizar a personalidade de escolher um modelo de influência musical obscuro e difícil como a recriação do R&B num tempo bem menos emocional como hoje. Fica aqui o nosso voto de confiança e uma cotação bem camarada para o disco.

(As Light As Light em uma música: The Wheel)

Loading

BOM PARA QUEM OUVE: Justin Timberlake, Toro y Moi
ARTISTA: inc. no world

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.