Resenhas

Alcest – Kodama

Dupla francesa transita bem entre Dream Pop e Black Metal

Loading

Ano: 2016
Selo: Prophecy Productions
# Faixas: 7
Estilos: Dream Pop, Shoegaze, Black Metal
Duração: 48:22
Nota: 3.0
Produção: Jean Deflandre e Stephane Paut

Após ouvir as sete canções que compõem este novo álbum da dupla francesa Alceste, Kodama, me vi com algumas pulgas metafóricas atrás da orelha. Sim, até porque os sujeitos, que atendem pelos codinomes Neige (guitarras, teclados, vocais, efeitos) e Winterhalter (bateria, percussão), se inserem nesta lógica encolhida de “dupla que faz as vezes de banda”, erguendo uma muralha instrumental bastante convincente ao longo de todas as faixas deste disco. Mais ainda: são capazes de propor um instrumental que oscila convincentemente pelas praias do Dream Pop e de uma certa variante enguitarrada/pesada, que o povo crítico gringo chama de “metal”, mas que desobedece preceitos básicos deste gênero. Sendo assim, os sons que Alcest oferece aqui têm certa dose de ineditismo, mas nem sempre isso é bom.

A ousadia está em misturar sonoridades distantes entre si, separadas por contextos e alguns conceitos, levando-as a passearem juntas em melodias e arranjos que impressionam, mas há diferenças, digamos, quase inconciliáveis, entre Dream Pop e, vá lá, Black Metal ou algo no gênero. Os contextos, as origens, os motivos são (ou deveriam ser) diferentes entre estas duas fontes. A mistura delas é tipo água com óleo, não gera algo com identidade nova, mas mutantes com mais ou menos herança de uma ou outra parte. Quer um exemplo? Os climas delicados de guitarra que ficam mais intensos na segunda faixa, Eclosion, chegando ao ponto em que os vocais berrados surgem no meio de tudo, numa canção em que a melhor alternativa seria, sem sobra de dúvida, um instrumental.

Faz sentido, no entanto, essa aparência dividida. O álbum tem um conceito central, já a partir do próprio título: Kodama quer dizer “espírito livre” em japonês e, segundo o que a banda propõe, essa liberdade viria, justamente, a partir do enfrentamento das diferenças que habitam em nós. Aquelas coisas que nos fazem ser quem somos, segundo a sabedoria oriental cooptada pela dupla, nos levam a ir para um ou para outro lado da vida e isso nos define. Sim, é amplo e superficial, mas está lá, impregnado nas canções do disco. Oiseaux De Próre, o primeiro single, é emblemático com sua introdução climática, que vai crescendo e ganhando força, para explodir em todas as direções a partir de 2:40min, parar lá pelo minuto 4:40 e reagrupar forças para nova explosão a partir de 5:58 e manter o ritmo até o fim, muito mais próxima para o que entendemos por “metal”.

Onyx, a menor canção por aqui, com menos de quatro minutos, tem mais genes de Dream Pop e mesmo de Shoegaze, com uma introdução de camadas superpostas de guitarras em microfonia e ambiência, sem vocais, sem nada que nos faça pensar em intervenção humana. Parece que os instrumentos foram captados direto na natureza. Notre Sang Et Nos Pensées, também instrumental, surge com andamentos e alterações que sugerem até uma incursão no Progressivo, mostrando que Alcest tem influências suficientes para administrar.

A dupla francesa é interessante e se dispõe a manter o equilíbrio entre estilos que não se comunicam a princípio, mas que podem levar a caminhos novos. Sempre que há essa audácia em explorar e dar de cara com ineditismos, nossa simpatia é logo conquistada. Boa sorte aos rapazes.

(Kodama em uma música: Onyx)

Loading

BOM PARA QUEM OUVE: Opeth, Slowdive, Cocteau Twins
ARTISTA: Alcest

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.