Resenhas

Tony Allen – The Source

Novo álbum do veterano baterista nigeriano é uma celebração da boa música

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Ano: 2017
Selo: Blue Note
# Faixas: 11
Estilos: Afrobeat, Jazz, Funk
Duração: 64:01
Nota: 4.0
Produção: Vincent Taurelle

Se formos resumir esta resenha em uma frase, seria algo como: “Ouça este disco já”. Portanto, se você é dessas pessoas apressadinhas, pare de ler e vá atrás de um meio de ouvir The Source, o novo álbum do veteraníssimo baterista nigeriano Tony Allen. Talvez você já saiba que ele foi um integrante chave da banda do finado conterrâneo Fela Kuti e um dos fundadores do que se entende por Afrobeat, este ritmo forjado com base na ancestralidade musical do continente e nas leituras contemporâneas que ela teve na diáspora negra, seja do Jazz, seja do Funk. O que importa é que Allen soa como um caminho mais curto – e reto – em direção às origens, o que não quer dizer, necessariamente, que seja o melhor ou o mais indicado. Mesmo assim, sua musicalidade, mantida intacta ao longo destes 77 anos de vida, é uma beleza e um bálsamo para ouvidos cansados. Redescoberto no meio dos anos 2000 por Damon Albarn, que o chamou para participar do disco-projeto The Good, The Bad & The Queen, Allen foi recolocado no mapa da música mais auspiciosa e contemporânea feita no planeta, algo que ele sempre fez, mas que ganhou um reconhecimento renovado, o que é sempre bom.

Em The Source, sua estreia tardia pela mitológica gravadora Blue Note, Allen é acompanhado por músicos franceses, com destaque para seu produtor Vincent Taurelle, organista e multinstrumentista, que conduz uma pequena orquestra rítmica, capaz de conferir contemporaneidade a um disco de Jazz sem recorrer a recursos manjados – como o uso da Eletrônica ou convidados especiais. A coisa aqui é orgânica e acontece ao vivo no estúdio, com a impressão que os músicos estão tocando na sala ao lado, tamanha é a vibração que a música obtém em algumas passagens. As faixas se sucedem com uma afeição enorme pelo ritmo e pelo diálogo de baixo e bateria, com participações especiais de sopros e guitarras, mas com discrição, nunca com solos intermináveis. A festa é de e para Tony Allen, que se porta como sempre: discreto, eficiente e capaz de propulsionar uma locomotiva.

Mesmo discreto, a presença de Allen se impõe. É claro o respeito que os músicos têm por ele e o quanto os arranjos foram feitos para o brilho infinito do veterano baterista. Canções como a abertura, Moody Boy, mostram o quanto é possível ser criativo num idioma que poucos entendem e que parece cada vez mais destinado a elocubrações sem sentido. A batida proposta por Allen se impõe aos outros instrumentos, ditando ritmo – sempre criativo – com capacidade para cativar até ouvintes que não são familiares ao Jazz, uma vez que ele privilegia, de forma inteligente, a levada, o groove e não se perde em viradas, exibições ou algo do gênero. Sempre afeito ao arcabouço da construção do ritmo das canções, o homem é um mestre.

Exemplos da majestade de Tony Allen não faltam ao longo das generosas onze faixas. A onda pode ser calma e gentil, caso de Woro Dance, assumindo ares mais nervosos em Bad Roads, na qual ele confecciona um andamento de bateria muito complexo em uma só batida, algo que parece sampleado, mas que é de verdade. Acompanhando por uma guitarra minimalista e os metais, o homem vai desembestado num exercício de contenção/generosidade comovente. A sensacional rendição ao Funk chega em Cool Cats, na qual Tony encarna um engenhoso construtor de climas dançantes, sempre em comunhão com o baixo e deixando espaço para os riffs de metais em brasa. No fim do disco, a sintomática Life Is Beautiful, outra faixa com uma levada animalesca de bateria e guitarra, da o tom de celebração do disco.

Faltam adjetivos para definir a belezura que é este The Source. É – mas não é – Jazz. Não é – mas é – Funk. Apenas ouça e prepare-se para ver essas canções grudarem no seu ouvido. Não resista.

(The Source em uma música: Cool Cats)

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BOM PARA QUEM OUVE: Antibalas, Fela Kuti, Bixiga 70
ARTISTA: Tony Allen
MARCADORES: Afrobeat, Funk, Jazz, Ouça

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.