Resenhas

Chelsea Wolfe – Hiss Spun

Cantora norte-americana entrega seu melhor álbum

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Ano: 2017
Selo: Sargent House
# Faixas: 12
Estilos: Rock Alternativo, Doom Rock, Eletrônica
Duração: 48:10
Nota: 4.0
Produção: Ben Chisolm

O novo disco de Chelsea Wolfe, Hiss Spun, é um trabalho sombrio, tenso, denso, escuro e pesadíssimo, sobre opressão, aprisionamento em uma realidade opressora e demais temas que tanto agradam ao pessoal que curte sonoridades próximas da interseção do Doom Metal com a Eletrônica e o Folk. Bem que podia falar do Brasil atual, não? Museus atacados por conservadores de todos os matizes e plumagens, pouco preocupados com a arte, mas tentando delimitar território. Ou partidários da condição do planeta ser plano, em vez de esférico. Defensores do fascismo de todos os tipos, em todos os cantos. Gente que metralha uma multidão num show de música nos Estados Unidos, a lista de absurdos opressores e tenebrosos só aumenta, infelizmente. Fica a dica para Chelsea se aventurar por esses terrenos.

Perdoem o desabafo e já partindo para a análise do álbum: desconfio muito de evocação desse tipo de temática quando há suporte material e espiritual para se surfar nessa onda com segurança. No caso de Chelsea, o que se pode dizer é que a moça segue com fidelidade total este caminho, mostrando uma grande habilidade em entronizar esta persona atormentada/contemplativa em relação às trevas, digamos, mais estilizadas. Também é possível ver beleza e padrões no caos proporcionado por danações mil, que, sim, podem ir muito além da rotina do Brasil nesses tempos. Chelsea, assim como sua conterrânea, Zola Jesus, sabe bem como fazer música/arte deste poço sem fundo, bastante similar àquele do filme “O Chamado” e no qual podemos mergulhar sem que percebamos a tempo.

É bom que se diga o quão pesado é este seu novo álbum. Se as influências metálicas sempre estiveram presentes em sua obra, nunca isso aconteceu de modo tão presente. O clima é de Doom Metal com explosões de guitarras e teclados em vários momentos. Adeus, floresta escura, fadas sombrias, bruxas de Blair. O negócio aqui é urbano, depressivo e cavernoso. Se não é por motivos pé-no-chão como os descritos lá no primeiro parágrafo, podemos dizer, sim, que Chelsea e sua ótima banda conseguiram uma radiografia precisa das vibrações do lado negro da existência. A desconfiança pré-álbum, que assaltou o crítico, ficou pra trás logo na primeira faixa, Spun, que traz os vocais da moça lutando pela vida contra um monstro do pântano em forma de guitarras, baixo, bateria e teclados. Do embate pouco sobra, mas a sonoridade que sai das caixas de som é para gente grande. Claro que Chelsea é inteligente o bastante para dosar essa metalurgia musical com momentos mais evanescentes, caso da ótima Offering, conduzida por teclados e bateria, com a voz soando como se fosse de um elemento não exatamente terreno. Belezura.

Há um certo clima A Profecia em Static Hum, que traz uns vocais de apoio muito sutis, embutidos no clima dos teclados, que são perpassados por guitarras meio fora do tom, numa experiência, digamos, tensa. As seis cordas estão muito presentes em vários casos, mas com criatividade. Por exemplo, em Vex, uma batida industrial conduz a melodia e a voz de Chelsea, toda trabalhada nos efeitos, enquanto o assalto guitarreiro surge sem avisar, com um resultado muito legal. Scrape, a última faixa, é uma viagem só de ida para as profundezas. Poderia facilmente fazer parte de alguma trilha de filme espanhol de terror moderno, sério e atormentador. Ainda assim, com todo o terror diário, a gente não parar de ouvir.

Hiss Spun é o melhor disco de Chelsea Wolfe. É o resultado de uma burilação sonora que vem acontecendo há muito tempo e chegou a seu ápice. As escolhas estéticas se justificam, a produção é ótima e a sonoridade é uma belezura maligna que encanta. Tente parar de ouvir.

(Hiss Spun em uma faixa: Static Hum)

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.