Resenhas

Julien Baker – Turn Out the Lights

Cantora e compositora americana entrega álbum cheio de sinceridade emocional

Loading

Ano: 2017
Selo: Matador
# Faixas: 11
Estilos: Folk Alternativo, Chamber Folk
Duração: 42:01
Nota: 4.0
Produção: Julien Baker

Vou fazer um elogio imenso à música da admirável Julien Baker: várias canções em seu segundo – e ótimo – álbum, Turn Off The Lights – parecem faixas de alguma trilha sonora perdida dos anos 1990. Mas não se enganem ao pensar que falo de canções com guitarras pesadas, próximas do Grunge ou mesmo do Rock Alternativo ianque daquela década. Falo de delicadas e intensas composições com violões, guitarras, pianos e muitos vocais sobrepostos. Lembra os momentos mais lentos e fortes de bandas esquecidas cedo demais, como Belly, Throwing Muses e, numa escala menor, Madder Rose, que tem uma cover espantosa para The Love You Save, clássico do Jackson 5, que ouvi uma vez num episódio de Party Of Five e que demorei muito tempo para ouvir novamente. É disso que falo: som para pequenos grandes dramas pós-adolescência, daqueles que surgem como se fossem os maiores desafios emocionais de nossas vidas. Você sabe do que estou falando, certamente.

Julien é uma menina linda de 22 anos recém-completados. Tem uma voz frágil/forte que dá a impressão daqueles pequenos seres, aparentemente indefesos e vulneráveis diante da vida, mas que têm alguma arma secreta instintiva contra o inimigo mais forte. No caso dela, certamente é seu talento como cantora e sua verve como compositora. As canções presentes neste disco, sua estreia pela prestigiosa Matador Records, é altamente indicado para quem deseja se perder em belos trabalhos de violão/guitarra, além de momentos eventuais de teclados, sopros e mesmo cordas. É tudo muito bonito e preciso, produzido pela própria Julien, que se mostra bem precoce nessa coisa de pilotagem de estúdio, que, aliás, não foi outro senão o antológico Ardent Studios, em Memphis, Tennessee, no qual vários artistas da Soul Music sulista gravaram álbuns antológícos, além de Big Star, que registrou ali o seu clássico #1. Certamente os deuses da música estavam olhando. E gostando. Mesmo assim, apesar de aparentemente fofinha, Julien já traz um histórico de dependência alcoólica enfrentada recentemente, sobre a qual falou no trabalho anterior, Strained Ankle, de 2015. A sobriedade advinda deste enfrentamento é uma das linhas mestras neste novo disco.

Se você espera por algo animadinho, esqueça. A coisa aqui se resume numa conversa séria, na qual a verdade é o principal motivador. Questões sobre Deus, drogas, amor, sentimento e tudo decorrente disso, transformam-se no combustível lírico do álbum. Num clima evocativo de serenidade/intensidade, Julien constrói um pequeno painel emocional, no qual não faz qualquer questão de disfarçar o que sente. E vem forte, suportada por versos como “I don’t need anybody’s help” (na linda Televangelist). Apesar de virem inseridas nesse contexto e soarem próximas umas das outras em termos estéticos e de arranjo, as faixas são bem distintas à sua maneira, oferecendo possibilidades interessantes ao ouvinte.

Detalhes tão pequenos de nós todos surgem por todos os lados. O piano cortante, embebido por metais em Everything That Helps You To Sleep, a beleza esvoaçante do single Appointments, que abre o disco após uma pequena introdução chamada Over. Hurt less e sua melodia de caixinha de música, que vai sendo modificada pela voz e pela letra que Julien vai cantando versos como “I used to never wear a seatbelt/’Cause I said I didn’t care”, novamente com cordas que vão surgindo como postes ao longo de uma estrada na qual você está em fuga de tudo. O final do álbum vem com Even, lacônica e desolada (“So I could be cruel/ Yeah I could make you hate me”), fechando com a triste Claws In Your Back, sobre violência contra mulheres e a dificuldade de falar a respeito, personificada pelo cortante verso: “So try to stay calm, ‘cause nobody knows/ The violent partner you carry around”.

Julien é verdadeira, intensa e te convida para participar de sua vida através de sua música. Pense bem e valorize tal atitude, ainda mais numa época de plástico como a nossa. Discão.

(Turn Out The Lights em uma música: EVerything That Helps You To Sleep)

Loading

BOM PARA QUEM OUVE: Whitney, Waxahatchee, Angel Olsen
ARTISTA: Julien Baker

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.