Resenhas

Okkervil River – In The Rainbow Rain

Banda revisita velhas lembranças e olhares para o presente e o futuro imediato

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Ano: 2018
Selo: ATO
# Faixas: 10
Estilos: Rock Alternativo, Indie Rock
Duração: 48:49
Nota: 4.0
Produção: Shawn Everett

Will Sheff, o cérebro pensante e constante de Okkervil River, é definido como um “compositor e artesão Pop com ares eruditos” pela imprensa gringa. O termo “erudito” aqui não significa que Sheff é um cara versado em música Clássica, mas um sujeito intelectual e com certa finesse quando está escrevendo melodias, letras e arranjos. Isso, entre outras coisas, também quer dizer que ele usa a música como um meio de expressão para suas emoções e sentimentos de forma, digamos, bastante sincera. Sua banda existe desde o início dos anos 00, sempre restrita a pequenos círculos de buchichos e bafafás, mas ganhou certa notoriedade nos últimos anos, justo porque Sheff experimentou certas durezas materiais e emocionais/sentimentais. Tal perrengue resultou em dois belos álbuns, The Silver Gimnasium e Away, lançados em 2013 e 2016, respectivamente. Neles o sujeito revisita velhas lembranças da infância e olhares para o presente e o futuro imediato.

Como resultado disso, provavelmente num processo evolutivo em sua arte, Sheff promoveu uma simpática mudança em sua paleta de cores musicais. Saiu o apego pelo “Rock rural countryficado folkster” que era a pedra de toque de Okkervil River até então e entrou em campo, olhando pra torcida e batendo no escudo, um bem urdido Indie Rock de têmpera diversa e interessante, daqueles que não restringem a banda a repetir arranjos e levadas, mas que, ao contrário, dão liberdade para que o espírito das canções se una, mesmo que instrumentais e inflexões variem de faixa para faixa. Ao fim das contas, a impressão é de que ouvimos algo refrescante e sensorial, curiosamente coeso por conta dessa subjetividade estilística. Pois essa é a maior qualidade de In The Rainbow Rain, o novíssimo disco de Sheff e sua banda itinerante/mutante.

A produção de Shawn Everett (The War On Drugs, Alabama Shakes) ajuda bastante nesta mudança de ares. Ela ajuda, sobretudo, a manter a presença de Sheff como marca principal de toda e qualquer canção presente no álbum, seja na voz, nas letras ou no conceito sutil que une tudo. Certamente, In The Raibow Rain é um disco de transição e repaginação e tudo aponta para isso nos mínimos detalhes. E há grandes, ótimos momentos ao longo das dez canções, nenhuma delas abusa do tempo ou termina antes da hora, deixando o ouvinte com a impressão de ter ouvido algo próximo de uma ideia de perfeição calma, natural, simpática e curiosamente tangível.

Há ótimos exemplos desta variedade de “estilos dentro do estilo”. A abertura, Famous Tracheotomies, é um rock de talhe clássico e sessentista, totalmente atualizado pela belezura do arranjo, citando The Kinks no tema e revisitando problemas médicos da infância. Pouco depois vem uma faixa com ares épicos, The Dream And The Light, cheia de pianos e vocais dramáticos à beira do precipício. Mais adiante damos de cara com Don’t Move Back To L.A, canção chapada intencionalmente que lembra algo da trilha de “Quem Vai Ficar Com Mary”, filme do fim do século 20, com Cameron Diaz e Ben Stiller. Quando estamos cantando o refrão e tacando um sorvete na testa, entra a bela, superlativa e, de algum modo, espiritual, Shelter Song, com teclados bailarinos e guitarras soft soul perdidas no meio do mar tépido do arranjo. How It Is começa como se fosse uma demo do The Cure mas é invadida por metais inesperados, ganhando em dinâmica dançante e abrindo caminho para o encerramento do disco com External Actor, beatlemaníaca e psicodélica e a exuberante Human Being Song, que poderia ser composta por Paul McCartney, caso ele fosse um americano da Costa Leste, nascido, no máximo, em 1983.

Este disco de Okkervil River é uma caixinha de surpresas. Diverso, belo, bem produzido, uma uva. Não perca por nada.

(On The Rainbow River em uma música: Shelter Song)

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Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.