Resenhas

Jimi Hendrix – People, Hell & Angels

Último disco de inéditas póstumo do guitarrista mostra sessões do que seria o seu inédito quarto álbum. Veja aqui que caminho Hendrix tomaria em sua carreira

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Ano: 2013
Selo: Legacy
# Faixas: 12
Estilos: Rock & Roll, Blues Rock
Duração: 53:00
Nota: 4.0
Produção: Jimi Hendrix,Eddie Kramer

Jimi Hendrix é o claro exemplo de alguém que estava à frente do seu tempo e que, mesmo após quase 43 anos de sua morte, continua sendo um símbolo de genialidade. É fato que ninguém depois de Hendrix conseguiu ser tão cultuado e apreciado por músicos de diferentes estilos. Ele não era só um dos maiores guitarristas do mundo, mas também um dos mais humildes e até envergonhado diante de tanta veneração. Sua carreira foi curta, apenas três discos de estúdio lançados em vida. No entanto, muita coisa foi gravada e guardada para que um dia alcançasse a luz de um lançamento, e é isto que ocorre em People, Hell & Angels.

Parte do período de gravação posterior ao seu terceiro e genial disco, Electric Ladyland, People é o que pode ser chamado de um apanhado de “ensaios” para seu quarto e nunca lançado álbum, First Rays of the New Rising Sun. Nele, acompanham os seus companheiros de Band of Gypsys, o baxista Billy Cox e o baterista Buddy Miles, além de uma série de músicos convidados, algo usual com Jimi. O guitarrista era conhecido por trabalhar com diferentes músicos pois queria aprender ao máximo com cada um, e ao mesmo tempo dar espaço para novos talentos. Ele também era conhecido por adorar fazer uma Jam Session e grava-la, algo pouco comum na época e que abriu margem para que várias faixas fossem compostas espontaneamente, mas não necessariamente lapidadas, ou produzidas. Em People vemos o esforço de Eddie Kramer, engenheiro de som que acompanhou toda a carreira de Hendrix, em conseguir transformar tais “ensaios” em músicas propriamente.

Earth Blues, faixa que abre a obra, já havia sido tocada algumas vezes ao vivo e portanto não é necessariamente inédita ao público, mas esta versão de estúdio mostra os detalhes que não são percebidos nas gravações anteriores. Assim como o nome da faixa pede, temos aqui um Blues mais acelerado e com muitos toques de música negra, como backing vocals femininos ao fundo. A faixa é explosiva e Jimi continua fazendo algo que poucos conseguiam: não só tocar guitarra e cantar ao mesmo tempo mas também performa-los com um sincronismo lírico louvável. Somewhere segue o estilo visto em seus outros álbuns, riffs precisos e Hendrix cantando como se contasse uma história ao público. Seus solos, impossíveis de serem reproduzidos, não só pela técnica mas também por uma série de efeitos no instrumento que só Jimi conseguia fazer, estão presentes nesta bela faixa sexy, como sua carreira costumava ser.

As gravações presentes em People, Hells & Angels mostram que o quarto álbum de Jimi Hendrix seria ainda mais Blues Rock, um pouco menos explosivo que o começo de sua carreira, mas ainda assim poderoso e viajado. Faixas como Hear My Train A Comin’, Easy Blues e Villanova Junction Blues mostram essa faceta voltada às raízes do próprio Rock And Roll. É normal os fãs de Hendrix conversarem hipoteticamente sobre como estaria o guitarrista hoje caso ainda estivesse vivo e a resposta mais comum é “ele seria um Blues Man” e talvez o maior exemplo vivo disto seja Eric Clapton, segundo melhor guitarrista da história e que pode ser configurado desta forma nos tempos atuais.

Aliás, Clapton quando escutou Jimi pela primeira vez disse que quase desistiu de tocar guitarra devido ao talento do segundo, algo que nunca havia sido visto antes. A introdução de Hey Gypsy Boy é de uma beleza ímpar, uma faixa que pode transmite o sentimento de sua composição ao mesmo tempo em que se conecta com o ouvinte.

Mitch Mitchell, o mítico baterista da The Jimi Hendrix Experience aparece na faixa Izabella, outra que não é tão nova, com já outras gravações ao vivo por aí. No entanto, a canção se destaca pelo encaixe perfeito entre a bateria, baixo e guitarra formando um arranjo orgânico maravilhoso. Na versão de estúdio vemos um ritmo um pouco mais cadenciado, com uma maior ênfase dada na voz de Jimi e o baixo de Cox.

Hendrix tinha vergonha de sua voz, pois achava que não cantava bem, além de ser, no início de sua carreira, um sujeito extremamente reservado (qualquer entrevista neste período pode comprovar isto). São faixas como Crash Landing que nos fazem pensar o porquê desta falta de confiança ou extrema modéstia. Sua voz é única, e consegue muito bem ultrapassar a sua maior referência, Bob Dylan, no quesito ritmo e timbre de voz.

A faixa mais surpreendente de People fica com Let Me Move You. Uma mistura de Funk através de sua guitarra e Jazz com o saxofonista Lonnie Youngblood faz deste um trabalho totalmente diferente de tudo visto na carreira de Jimi. Lonnie assume os vocais e o resultado final é uma mistura entre Charles Mingus, James Brown e Hendrix ou melhor, um Funk-Jazz-Blues-Rock chocante e eletrizante.

People, Hell and Angels é o último disco póstumo com faixas inéditas de Jimi e representa um recorte interessante na carreira do cantor, um aprofundamento do músico no Blues e na música negra, mas sem se esquecer de seu lado roqueiro explosivo. Nunca saberemos como First Rays of the New Rising Sun, seu quarto disco seria, mas com este lançamento podemos ter uma boa noção de algo genial e fora dos padrões viria por ai. Se você nunca chegou perto de tocar na discografia do gênio, talvez este não seja o melhor início, mas People se torna obrigatório para qualquer um que aprecia o talento deste jovem e inovador guitarrista.

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Autor:

Economista musical, viciado em games, filmes, astrofísica e arte em geral.