Resenhas

The Field – Cupid’s Head

Álbum sai do orgânico e promove obra em hardware que soa como um grito momentâneo de raiva que marca uma nova fase do produtor

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Ano: 2013
Selo: Kompact
# Faixas: 6
Estilos: Ambient, Minimal, Techno
Duração: 52"30
Nota: 4.0
Produção: Axel Willner
SoundCloud: https://soundcloud.com/kompakt/cupids-head

A mudança vem de dentro pra fora? Nesse caso, é possível observar algo que já faz diferença de primeira. A cara dos CDs de Axel Willner sempre foram pairados entre as cores claras e leves, seguidas por um padrão indiscutível de estrutura da capa. Em seu registro mais recente, o encarte já veio preto, em letras manuscritas dizendo o nome do álbum e, de forma sóbria, a Kompact, seu selo já conhecido por lançamentos no Techno.

O alemão continua sua carreira liberando ao mundo seu quarto álbum. Cupid’s Head vem com seis faixas, um número pequeno em comparação a suas obras anteriores, mas com individualidades que façam você não categorizar isso como ponto negativo. Quando se ouve o novo CD, é inevitável a comparação com Looping State of Mind, trabalho de 2011 que emanava interiorização e vulnerabilidade. A fragilidade se afastou para dar espaço a uma obra consistente, forte e, sim, mais sombria.

O que antes mais parecia viagens no âmago, Cupid’s Heart solta como uma flecha, se me perdoam o “trocadilho”. É externo, como se expulsasse uma parte que estava pronta dentro de Willner há anos. A obra pode ser menos quantitativamente, mas se expõe vezes mais elevada na qualidade, com camadas de textura mais trabalhadas nos longos minutos de suas faixas (cada uma com tempo entre sete e dez minutos). Mais qualidade, inclusive, por não se perder entre um registro costurado por enredos similares e sim atingir vários alvos com uma música só. The Field dedica roteiros específicos a músicas específicas, isso faz com que cada uma se extenda até o momento que o produtor julga como terminado seu trabalho ali. E então, sem olhar para trás, caminha adiante com outras propostas. Cada flecha de Cupid’s Head atinge um alvo diferente, certeiro, seguro.

E, baseando na última palavra citada, o produtor agoniza em nuances como em No, No…, com certeza uma das melhores (se não a melhor) do álbum, sussurrando o conselho nos vocais progredindo aos poucos outras camadas, outros ruídos e experimentações sempre seguro que seu ouvinte iria se incomodar. Da mesma forma, com a música que abre o trabalho. They Wont See Me nasce grande, pronta, como um pensamento já decidido e fiel a seu autor. Perpetua por nove minutos se transformando aos poucos a hibridização entre o ímpeto físico que está acostumado a fazer com um conceito latente que o produtor carrega consigo.

A faixa que dá nome ao álbum – a menor, diga-se de passagem – sai um pouco do barulho das iniciais e traz consigo pela primeira vez as vozes sintetizadas que eram regra outrora. The Field vem com uma proposta diferente em sua quarta obra. É a primeira vez que o produtor trabalha de forma mecânica, sem elementos orgânicos, sem colaborações, sem tanto apelo Pop. Trouxe consigo uma carga que entalava sua direção de criatividade e, por isso, aqui os canais de voz não têm tanta relevância para a música, ou melhor, um lirismo que interfira. 20 Seconds of Affection não é deve ser levado ao pé da letra, mas com certeza tomado como um suspiro prolongado de uma nova fase de Willner.

The Field percorre o lado contrário. Enquanto a maioria segue os passos da humanizaçao da música, Axel prefere fazer música “de hardware”. Talvez por conta disso não soe tanto como o que conhecemos de Axel. As músicas são longas, mas te afundam nas composições, o fim chega em segundos. Mas não soa porque Cupid’s Head vem como um grito de raiva que vem, é intenso e depois acaba, não deve-se levar tanto em consideração. Segue seu instinto, quase que impulsivo, de música, um engasgo, um conceito não explicado. Os cortes abruptos no meio dos loops trazem a instabilidade desse papel. A selvageria encaixa tão bem que os longos minutos que deveriam cair no limbo do tédio tornam-se trilhas para o cotidiano caótico. A melodia constrói a forma como se vê os elementos ao redor, a velocidade e força que cada um impõe. São formas de ver nove minutos passarem em um piscar de olhos, no semáforo abrindo ou no andar das pessoas na calçada. Tudo se movimenta, tudo é dinâmico.

Cupid’s Head talvez traga um prisma de quem está querendo ajudar, quem julga ser necessário uma terceira mente para dar suporte no que é, basicamente, irracional. O álbum urge como um grito e rasga a pele sem dó até seu interior. Uma experiência agressiva como morder uma toalha ou gritar em um travesseiro. A calmaria vem após o êxtase. E a serotonina agora faz seu papel prazeroso.

The Field – Cupid’s Head

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Autor:

Publicitário que não sabe o que consome mais: música, jornalismo ou Burger King