Resenhas

Baco Exu do Blues – Bluesman

Com grande força nos versos, artista entrega obra de mensagem concisa

Ano: 2018
# Faixas: 9
Estilos: Rap, Hip Hop
Duração: 30'
Nota: 5.0

“Eu sou o preto mais odiado que você vai ver” – esse verso ressoa para além da audição e incomoda mais do que qualquer outro em Bluesman, obra que chega com status de um tratado da identidade de Baco Exu do Blues. Conceitualmente conciso, esse seu segundo álbum dá conta de um grande volume emocional que legitima sua humanidade e toda uma dimensão sentimental que não nos deixa perder a perspectiva do que o negro vive no Brasil, ao ponto de precisar dessa validação de sua própria existência.

“Eu sou o preto mais odiado que você vai ver” – chama a atenção como variações de “eu sou” se repetem ao longo das nove faixas. Com uma introdução (Bluesman) e uma conclusão (BB King) diretamente conectadas, a obra amarra sua proposta ao usar o Blues como ilustração para algo pertencente à cultura negra que surge como marginalizado para depois ser aceito (e apropriado) pela cultura hegemônica. Kanye West, Beyoncé e Jay-Z são citados ao longo das músicas, exemplos muito conhecidos de artistas atuais que passaram por esse processo.

“Eu sou o preto mais odiado que você vai ver” – há uma agressividade natural nas rimas de Bluesman, explicada por Baco ao dizer “eu tô cheio de ódio e você nem imagina”. É um movimento na contramão de uma expectativa de “humildade” (eufemismo para “humilhação” quando falamos de minorias), principalmente quando ele faz questão de repetir também o quanto toma as rédeas de seu próprio trabalho – “Só eu posso fazer a minha arte, só eu posso me descrever”. “Eu sou um cara irritante”, ele versa em certo momento, para dizer em outros “Eu sou um dos poucos que não esconde o que sente” e “Não sou obrigado a ser o que vocês esperam”.

“Eu sou o preto” insiste na identidade de Baco Exu do Blues como mais um afrodescendente como a maioria da população brasileira, “mais odiado” não esconde o peso da realidade que ele vive e expõe em suas letras e “que você vai ver” deixa claro que sua mensagem não será escondida. Seja ao falar de amor (como em Flamingos, com participação de Tuyo) ou de depressão (Minotauro de Borges), o artista se posiciona da mesma forma com que versa sobre as questões raciais em Preto e Prata ou Queima Minha Pele (com Tim Bernardes).

“Eu sou o preto mais odiado que você vai ver” só aparece na quinta faixa do disco (Kanye West da Bahia), mas reverbera por todo Bluesman com uma potência crua e visceral cada vez mais rara na música. Em um ano tão violento no Brasil, de Marielle aos linchamentos feitos por eleitores contra minorias, Baco dá a cara à tapa sem baixar a cabeça. “Vai me dizer que isso não te lembra Cristo?”, como ele canta na faixa-título, antes de concluir: “Jerusalém que se foda, eu tô à procura de Wakanda”.

(Bluesman em uma faixa: Kanye West da Bahia)

BOM PARA QUEM OUVE: BK, Criolo, Emicida
MARCADORES: Hip Hop, Ouça, Rap

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.