Resenhas

Earl Sweatshirt – I Don’t Like Shit, I Don’t Go Outside

Rapper sai da sombra do coletivo que o revelou com tons sombrios e letras depressivas

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Ano: 2015
Selo: Tan Cressida/Columbia
# Faixas: 10
Estilos: Rap, Hip Hop
Duração: 29:57
Nota: 4.0
Produção: Earl Sweathshirt

Creio que uma das frases mais expressivas e importantes para se entender o clima de Doris (2013) é um verso tirado da faixa Sunday: “All my dreams got dimmer when I stopped smoking pot/Nightmares got more vivid when I stopped smoking pot”. Em seu novo álbum, Earl Sweatshirt voltou a fumar maconha e seus sonhos estão mais vívidos que nunca, ainda que eles sejam perturbadores e obscuros em muitos momentos – o que torna I Don’t Like Shit, I Don’t Go Outside um disco denso não só em sua temática, mas também em sua produção, muitas vezes carregadas de ruídos e baixos potentes.

Ao mesmo tempo, a obra é também parte dessa experiência “canábica”, com faixas quase sempre mantendo um clima dopado, fumacento e, em alguns momentos, quase paranóicos. Veja bem, não estou dizendo que Earl não está curtindo o barato, ainda mais com um título tão sugestivo quanto este: ao que parece, o rapper largou mão de tudo para ficar em seu sofá queimando um, enquanto ouve um som e brisa sobre a vida. I Don’t Like Shit… me parece fruto desse processo, em que as introspecções do rapper parecem se encontrar com batidas de gente como Madlib e MF Doom, até mesmo o Free Jazz psicodélico de Flying Lotus entra em alguns momentos na jogada – nomes que influenciaram Sweatshirt a criar grande parte das batidas do álbum.

Diferente de outros tantos rappers que falam sobre maconha, em suas músicas, Earl dá um significado mais profundo ao uso, tratando a erva não somente como uma fonte de diversão ou de problemas, mas como algo que tem seu lado positivo e outro negativo. “And my bitch say the spliff take the soul from me”, diz ele em um dos versos de Huey, primeira faixa do álbum. Nela, o rapper ainda discute que voltou a fumar, sua relação com fãs e imprensa, a interpretação da crítica em relação a Doris, a morte de sua avó e alcoolismo, entre alguns outros assuntos. Uma introdução e tanto para um disco que vai novamente tocar nestes assuntos mais tarde. Por outro lado, musicalmente, a faixa não introduz os elementos a serem usados mais tarde. Ela se mostra muito mais leve, brincando o toque do teclado e com sons mais sóbrios, bem diferente do tom minimalista e quase “monocórdico” das demais faixas.

A produção do álbum parece ter como lema “menos é mais” e suas faixas exploram poucos elementos, poucos “subestilos”, poucos convidados, pouca variedade – isso é um fato. Mas, o que poderia parecer um regresso para Earl é, de certa forma, um avanço. Aqui, o rapper explora a fundo sua música, seus próprios limites quando está limitado a poucas escolhas. Esse pode não ser seu disco mais ambicioso, mas certamente é um muito audacioso. E o mais interessante da obra, é ver como beats, melodia e letras se encaixam tão bem, criando um clima extremamente pesado e depressivo. Em Mantra, por exemplo, os acordes ecoantes e solitários, a bateria cheia de reverberação e a voz de Earl rimando sobre seu próprio sucesso e como as pessoas e ele mesmo lidam com isso revelam um pouco disso. Com Grief, acontece a mesma coisa, porém amplificando o teor melancólico da faixa, que usa os sintetizadores de forma quase aterrorizante.

Certamente, esse não é disco fácil de ser ouvido, ainda mais se tratando de uma obra tão densa e introspectiva. Porém, é com ela que Earl sai da sombra de Tyler, The Creator e do coletivo Odd Future. É com essa sombria mistura de sobriedade e abuso de drogas que Sweatshirt se estabelece não mais como aquele promissor rapper da mixtape Earl, mas como um músico que despe em sua obra e que se mostra muito autêntico com seus próprios conflitos e falhas, tentando de alguma forma enfrentá-los. I Don’t Like Shit, I Don’t Go Outside é um marco para a carreira do músico e capítulo interessante na história do Rap, que ganha agora mais um representante de peso.

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MARCADORES: Hip Hop, Rap

Autor:

Apaixonado por música e entusiasta no mundo dos podcasts