A inquietude de Tkay Maidza

Após lançar seu principal trabalho durante a quarentena, australiana está ansiosa para mostrar seu som explosivo ao resto do mundo; conversamos com ela sobre seus próximos passos e a ideia de mesclar apelo Pop e experimentação

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Fotos: Mark Peaced

“Awake”, de Tkay Maidza, é um hino dedicado a paranoia e inquietude de estar acordado toda a madrugada, checando o celular, sem conseguir (ou tentar) dormir. Aos desavisados, pode soar como um reflexo das noites mal dormidas na quarentena, mas a faixa foi lançada em agosto de 2019 – a tempo de entrar para a lista de melhores singles da década feita por Anthony Fantano, crítico do canal theneedledrop.

A canção foi o carro-chefe do EP Last Year Was Weird, Vol. 2, lançado exatamente um ano depois, em agosto de 2020 – agora sim, durante a pandemia e o isolamento social. Last Year, contudo, está longe de ser o primeiro lançamento da cantora australiana – soltando singles desde 2013 –, mas foi o mais impactante e mais importante até aqui, rendendo, pela primeira vez em sua carreira, cobertura de sites como Pitchfork e The FADER, além da marca de 1 milhão de visualizações em um de seus clipes no YouTube (“You Sad”).

Como é, durante a quarentena e um ano tão atípico como 2020, experienciar tudo isso pela primeira vez? Em entrevista por vídeo, Tkay conta que o isolamento a fez refletir mais profundamente sobre sua própria música. Ela está em Adelaide, na Austrália, cidade em que mora desde os cinco anos de idade e onde, felizmente, a quarentena já acabou. Nesses três meses, não apenas a pandemia, mas também os protestos do movimento Black Lives Matter, desencadeados pelas mortes de George Floyd e Breonna Taylor, ocuparam completamente a mente de Tkay.

“Foi um pouco assustador no início lançar música nesse período, porque há tanta coisa acontecendo no mundo, questões políticas e que afetam a vida de pessoas reais”, fala a artista. “Eu não achava que havia espaço para falar do que eu queria falar, porque não acho que seja tão importante. É muito pessoal. Mas eu sinto que esses acontecimentos me motivaram a ser uma parte mais ativa da comunidade negra, e estar em casa nesse período foi uma oportunidade de entender o que isso tudo significa para mim, estar mais em contato com a música que faço.”

A música de Tkay é curta, explosiva e diversa. Lançado pela grande label 4AD, Last Year Was Weird, Vol. 2 traz muito em suas 8 faixas e 26 minutos de duração: do hip house de “24K” às batidas graves e rimas afiadas do banger “Grasshopper”, passando pelo R&B romântico e vocal melódico de “Don’t Call Again”. O tal termo “hyperpop”, recém popularizado pela label britânica PC Music e por artistas como 100 gecs e Charli XCX, parece se encaixar bem aqui: a vontade de se alojar em convenções da música pop e a de quebrá-las convivem de mãos dadas.

“O Pop domina a Austrália. Crescer nesse clima me fez pensar em como conseguir a atenção das pessoas imediatamente com a minha música. Não estou tentando fazer hits, mas, basicamente, se o seu som não soar como um hit, você não chama a atenção. Ao mesmo tempo, eu gosto de encontrar novos sons, de experimentar. Fico muito animada com coisas que sinto que nunca ouvi antes” (Foto: Mark Peaced)

Perto de completar 24 anos de idade, Tkay faz música desde os 17. Esses sete anos foram prolíficos: além de seu álbum de estreia em 2016, a artista lançou um punhado de singles e EPs por ano. “Acho que eu fui de fazer música e lançá-la imediatamente para alguém com a mentalidade ‘preciso ser uma artista séria’, e depois de voltar a tentar não pensar demais nessas coisas”, conta em meio a risos. “Mas gosto de ser capaz de empacotar o que quero dizer de uma forma útil, uma forma que me ajude, uma forma que ajude os outros. Ter um propósito. Acho que foi assim que evoluí. A maior lição que aprendi é me perguntar ‘o que quero tirar disso?’ Toda vez que faço algo.”

O som da cantora evoluiu junto com seus processos criativos. Sempre carregando uma pesada influência do Grime inglês e do House europeu, foi ganhando forma e atenção de produtores que enxergavam Tkay em timbres mais futurísticos ao longo dos anos. Em 2018, ela colaborou com o produtor britânico Danny L Harle, membro do selo PC Music, e, em Last Night Was Weird, Vol. 2, trabalhou com o produtor israelense Dan Farber, conhecido produzir para artistas como Lizzo e Dizzee Rascal. As colaborações elevaram as faixas de Tkay a um novo patamar.

“O Pop domina a Austrália. Crescer nesse clima me fez pensar em como conseguir a atenção das pessoas imediatamente com a minha música. Não estou tentando fazer hits, mas, basicamente, se o seu som não soar como um hit, você não chama a atenção”, fala. “Ao mesmo tempo, eu gosto de encontrar novos sons, de experimentar. Fico muito animada com coisas que sinto que nunca ouvi antes. Também não sou uma cantora ou uma rapper perfeita, então estou sempre tentando encaixar minhas referências e desafiando minha voz a alcançar coisas novas.”

As participações no trabalho dialogam com a estética trazida por Tkay, e “Awake” conta com um verso do cibernético e explosivo de JPEGMAFIA, e Kari Faux complementa a doce voz de Tkay em “Don’t Call Again”, com seus versos enérgicos. Ambas feitas completamente via internet, as colaborações foram uma conquista para Tkay, que ainda tem vontade de trabalhar com muitos outros artistas – entre eles, Kaytranada, Pharrell Williams, Timbaland, Missy Elliot e Anderson.Paak, todos grandes influências para seu som.

Já livre da quarentena, a cantora diz estar esperando a situação da pandemia melhorar no resto do mundo para “com sorte, conseguir marcar uma turnê”. Apesar do sucesso de Last Years Was Weird, Vol. 2, ela acredita que o trabalho de cimentar sua carreira não está nem perto de acabar: “Eu sinto que ainda tenho um pouco de trabalho para consolidar minha identidade e para que as pessoas me entendam bem, porque eu vario bastante entre gêneros e estilos. Quero que as pessoas percebam que esse trabalho não é algo isolado, que eu vim para ficar, porque eu realmente vim”.

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ARTISTA: Tkay Maidza