Caso ainda não conheça, guarde este nome: batata boy. O cantor, compositor, multi-instrumentista e produtor alagoano desponta como um dos artistas que você precisa ouvir. Lançado no último dia 17, seu disco MAGICLEOMIXTAPE (quando vê, já foi) chega com fôlego, disparando uma série de potenciais hits. Em 29 minutos vibrantes, batata une a solidez da perícia de quem sabe o que faz ao carisma da sinceridade de quem faz por amor.
Apesar do tom despretensioso inerente ao conceito de uma mixtape, o projeto oferece uma entrega imensa ao público. O álbum é o primeiro assinado pelo artista como uma obra solo, mas simultaneamente é um projeto bastante coletivo. Na lista de convidados, estão presentes Ana Frango Elétrico, Jadsa, Bruno Berle, Luiza de Alexandre, dadá Joãozinho, Vitor Milagres, L444U, yung vegan, Ico dos Anjos, snowfuks, Virgínia Guimarães, Saci, alici, ori music e maxixe. A arte da capa, aliás, também é de Ana.
Na entrevista que segue, batata boy explica que gosta de compor em pingue-pongue, na troca com outras mentes e ouvidos. Como um artesão digital, retalhando bits e beats, o artista maceioense é do tipo de escultor de sons que muitas vezes ergue peças e deixa-as em aberto, esperando a contribuição do porvir, a soma de um encontro. A finalização se dá na troca, e batata conta que sempre foi mais ou menos assim.
Talvez seja este o passe de mágica por trás de tudo: o boy sabe escutar. Na infância, o pequeno Leonardo Acioli era chamado de “Magic Leo” por um amigo estrangeiro de seu pai, e o apelido ganha ares proféticos quando ouvimos seu álbum. Em 12 faixas, com movimentos rápidos e precisos, batata e trupe prendem a atenção do ouvinte, tensionando os limites do pop alternativo contemporâneo, propondo uma linguagem flutuante e coesa, tão singular quanto acessível. E quando vê, já foi. Aliás, a resposta do público internacional só reforça isso: seus próximos shows marcados são no Japão (2 de novembro) e na Holanda (12 de dezembro).
A conversa que vem a seguir começa do começo, desde antes de Leo se chamar batata, e alcança o ano que vem, que reserva grandes momentos ao artista. No meio disso, passamos pela parceria de produção com Bruno Berle — cuja repercussão global vem ajudando a ventilar seu nome —, a armadilha do Lo-Fi, e o que há (ou não) de São Paulo e de Maceió em seu trabalho.
Quem é batata boy?
batata boy é músico, artista, produtor musical. Uma figura de Maceió, Alagoas, Brasil. Faço música brasileira contemporânea universal em vários formatos. Mas, especificamente agora, tô lançando um disco mais eletrônico, com músicas mais pop, só que também com um teor alternativo. É por aí.
Como começou a sua trajetória artística?
Em 2014, comecei a ter umas bandinhas, e eu era versátil nos instrumentos. Eu já fazia umas músicas, e teve um momento em que eu queria gravar, lá em Maceió. E aí o dono de um estúdio me indicou comprar uma placa de áudio, um microfone. Aí tomei essa decisão, comecei a gravar.
Três anos depois, já veio o seu primeiro EP, Batata Boy (2017). Como foi essa primeira fase?
Esse primeiro EP, fiz entre 2016 e 2017, com 16, 17 anos. Toquei todos os instrumentos, mas teve algumas participações, como de um amigo meu, Elizeu [Lzu], lá da minha cidade, que me influenciou muito. Ele estava muito metido no Lo-Fi na época, e por causa dele eu me meti numa onda assim.
Depois desse EP, teve as parcerias com o Bruno. Antes de sair os discos dele, tem um single, “Lembrança” e “Viva”, que já direcionava a isso. É feat comigo, e é considerado Lo-Fi. Eu me meti nessa coisa do LoFfi e comecei a me meter com beat. E aí fui me metendo com programação, produção, estúdio, mixagem. Fazia beats e letras, cantava, mas sempre gostei de compor em parceria.
Cheguei a fazer mais um EP [Batata Beats, Vol. 1 (2020)], e aí fiz um álbum colaborativo [Entre Cidades (2022)], com Garbela, um menino daqui em São Paulo. E aí me mudei para São Paulo em 2021, e pensei que, com os beats que eu tinha, ia dar continuidade e fazer o meu disco. Mas acabei fazendo um monte de coisa nova. Levei um tempo pra fazer esse disco, porque fui trabalhando com produção e às vezes não conseguia focar no meu.
“Geralmente, faço beat, letra e melodia, mas não fecho a música. Gosto de fechar com alguém, num pingue-pongue”
Você divide os papeis de produtor e artista protagonista de um projeto? É muito diferente uma coisa da outra para você?
Ah, varia, é misturado. Essa coisa de produtor veio depois, apesar de ser como fiquei mais conhecido. Mas a coisa de produzir influencia o meu som enquanto artista. Acho que eu tiro o meu tipo de som, então é meio misturado o batata boy artista, produtor, multi-instrumentista.
Você falou do Lo-Fi, mas seu som não se restringe ao que se costuma chamar de “Lo-Fi beats”, esse tipo de coisa. Como você se sente sobre ser identificado com essa estética?
Essa coisa do Lo-Fi foi um acaso. Fiz o Entre Cidades, que é Lo-Fizão. Aí saiu o disco do Bruno, No Reino dos Afetos (2022), que é extremamente Lo-Fi, porque foi feito na pandemia, literalmente na quarentena. O Bruno gravava as coisas com o celular dele. Acabou que as pessoas me vincularam a essa coisa do Lo-Fi. Mas o “Lo-Fi” muitas vezes é Hi-Fi. E às vezes, eu ficava frustrado, porque as pessoas achavam que eu só me metia com Lo-Fi, ou com coisas doidonas. E eu tava super estudando sobre estúdio, sempre fui interessado na parte técnica. O disco novo já tem mais conhecimento técnico da parte de engenharia, de mixagem, de tudo.
Chegando ao MAGICLEOMIXTAPE (quando vê, já foi), o que você estava escutando quando fez o álbum?
Escuto de tudo. Tenho uma coleção de vinil bem diversa, escuto música pop, música clássica, música brasileira, música de voz e violão. Gosto muito de canção, sendo feita em muitos formatos. Escuto muito reggae também, sei lá, é bem diverso. Sou eclético, como dizem por aí.
Como foi o processo de fazer o disco, trabalhando com outros artistas, viajando pra tocar…?
Eu não parei e fui para o estúdio fazer. Fui fazendo com o tempo. Muitos beats surgiram em jams comigo mesmo. Gosto de, no estúdio, ter tudo ligado e conseguir chegar no som que eu quiser a qualquer momento. Foi uma onda.
Levou um bom tempo a parte de edição. Quando cheguei em 80% do disco, os últimos 20% levaram um bom tempo. E é uma parte cansativa, mas vale a pena, né? Cheguei a fazer viajando por muitos lugares, e foi difícil, mas eu gosto também. É essa coisa de retalhar. Eu gosto de colagem.
Os convidados do disco colaboravam com as letras ou você já chegava com a canção mais pronta?
Foi doido. Muitas vezes, eu já tinha os beats, ou algumas opções, e pensava em alguém. Teve músicas que surgiram naturalmente, de um encontro. Geralmente, faço beat, letra e melodia, mas não fecho a música. Gosto de fechar com alguém, num pingue-pongue, numa colagem. Às vezes, tenho a melodia e vou completando com as palavras. Mas também tem gente tipo a Jadsa. Ela vai lançar um disco, acredito que no ano que vem, e tem duas músicas desse disco que Jadsa pegou pedaços das letras e melodias, levemente adaptadas, e a gente gerou uma terceira música (“technocoração (BIG LUV)”).
A Oriana Perez [ori music] — que mora comigo, somos casados — participa do disco também, e ela é da Venezuela e é uma figura muito definitiva na minha vida também. Por ser da Venezuela, me apresentou muita coisa ali da região, que tá dentro do disco. Então, tem processos diversos.
E o nome, MAGICLEOMIXTAPE (quando vê, já foi)? Tem algo por trás? De onde veio?
O “quando vê, já foi”, é uma coisa que muitas pessoas falam, né? Isso ia ser o nome da primeira faixa, uma vinheta de 40 segundos, mas acabei não fazendo, aí botei ali entre parênteses. “Mixtape” é porque é nesse clima, com várias pessoas participando, e é uma decisão estética. O “Magic Leo” é bem específico, meu pai teve um amigo inglês, e quando eu tinha uns oito, nove anos, ele ficava me chamando de Magic Leo. Agora, isso surgiu na minha cabeça.
“Muitos beats surgiram em jams comigo mesmo. Gosto de, no estúdio, ter tudo ligado e conseguir chegar no som que eu quiser a qualquer momento. Foi uma onda”
A capa do disco é um trabalho de Ana Frango Elétrico, como foi isso?
Super importante, importantíssimo, um presente na minha vida. Ana chegou forte, e começou de um jeito engraçado. Um dia, Ana postou esse desenho, que é a capa, e eu mandei uma mensagem: “Ana, sou eu?”. Aí Ana respondeu de um jeito engraçado: “Fudeu, Batata. É você. Kkk”. Um dia, a gente se encontrou, e Ana: “Ó, usa para o que você quiser, viu? É você, é seu”. Ana também assinou a capa do singles, quis somar muito.
Como a sua mudança pra São Paulo está impressa no disco?
Ah, é definitivo. Já tinha essa ideia há um tempo, de convidar várias pessoas e fazer um disco de festa, para cima, e aí percebi: “Caramba, todas as músicas foram feitas em São Paulo”. Teve uma, “domingão, maceió”, que o beat é de 2019, foi feito na casa da minha avó, e quem fez a voz é o Saci, um rapper de Maceió, e ele gravou lá. É a única música feita toda em Maceió. Muitas das minhas relações foram construídas aqui em São Paulo. Apesar de que muitos feats não são daqui, tipo Vitor Milagres, dadá Joãozinho, Jadsa… Daqui de São Paulo, tem L444U, e… talvez só, hein? São Paulo foi bem definitivo na minha vida, na minha carreira. Mas Maceió tá aí!
Fala de Maceió, qual é a importância da cidade na sua obra? Seu disco tem o Bruno, o Saci…
A minha relação é o meu crescimento lá. Mas eu sinto que Maceió tem uma cena em construção há muito tempo, sabe? Com poucas pessoas, poucos grupos que dão uma circulada. Também não é uma cidade que me consome muito. Tóquio e várias cidades do Japão me escutam mais do que Maceió. Berlim, Lisboa, Londres, Paris, Amsterdã, Curitiba, Belo Horizonte, todas essas cidades me escutam mais do que Maceió. Desde que saí, só fiz um show lá até agora, e foi muito legal — fiz em São Paulo, Rio, Maceió e Aracaju. Mas agora, lancei o disco e não tô com previsão de fazer show em Maceió. Acho que vou fazer no ano que vem.
O MAGICLEOMIXTAPE (quando vê, já foi) é um disco no qual o trabalho de edição é um instrumento em si. Como é pensar na transposição desse disco, do fonograma para o palco?
Eu já faço o show do universo deste disco desde 2022, mas fiz poucas vezes, bem pontualmente. E é neste clima: eu começo sozinho, depois começo a convidar. Às vezes tem alguns convidados que já dialogam, aí a gente faz uma música em três… Eu falo que os meus convidados são a minha banda, sabe? No disco, eu estou sempre cantando junto, tem quatro músicas em que eu tenho a minha parte de voz. Então, o show é nesse clima de festa.
“Tóquio e várias cidades do Japão me escutam mais do que Maceió. Berlim, Lisboa, Londres, Paris, Amsterdã, Curitiba, Belo Horizonte, todas essas cidades me escutam mais do que Maceió”
E conta dos seus próprios próximos planos, como vai ser o fim do ano, o ano que vem?
Tô empolgadaço, na real. Depois do lançamento no Bona [no último dia 20], o meu próximo show é no Japão. Tô indo pela primeira vez para lá com o Bruno. O disco dele chegou bastante lá, e aí eu acabei entrando no line up do Festival de Frue. Então, é um show muito chique. Depois, tô indo acompanhar o Bruno na turnê dele, e a gente deve tocar músicas do meu disco também. Também vou fazer um show meu em Amsterdã, em dezembro, dia 12, e tô bem animado. Ainda não foi anunciado esse, mas vai sair logo, logo.
Tô voltando para o Brasil em dezembro e não tem nenhum show marcado, mas estou empolgado para ir a alguns lugares pela primeira vez, tipo BH, Curitiba, Florianópolis, Brasília, Goiânia, quero tentar também cidades tipo Uberlândia, Uberaba, essa rota Cerrado… E devo ir lá pela minhas terras, né? Fortaleza, Natal, Belém, Recife, Aracaju, Salvador… Quero ir para esses lugares também. Quero visualizar isso em 2025.
E turnê “verão Europa” no ano que vem: batata boy e Luiza de Alexandre. Já está nos planejamentos, porque Luiza de Alexandre tá no disco, em duas faixas [“quero te lamber” e “tudo isso tudo (jogadora nata)”], e eu já tô produzindo o disco novo dela, de estreia. São as próximas grandes expectativas.
É praticamente uma turnê mundial: Japão, Europa…
É, não sei dos Estados Unidos, de quando vou bater lá. Esses dias, fiquei pensando também na Austrália. Ah, são muitos lugares, né? O mundo todo escuta música do Brasil. Agora, com o Bruno, vou passar por China e Coreia [do Sul]. A galera escuta bastante ele lá, é muito doido. Eu gosto de ouvir música do mundo todo. É que nem o Hermeto Pascoal, meu conterrâneo, fala: música universal. Gosto muito dessa onda aí também. Worldwide.
E você tem alguma perspectiva de ter algum lançamento físico do disco?
Assim, acho que vão sair agora fitas cassetes com o Várias Fita Ltda. Eu devo fazer algumas fitas, bem limitado, para levar pra esses shows no Japão e Amsterdã. E aí espero que ano que vem o vinil venha aí. Até porque Ana disse que quer fazer o design do vinil. Então, vai sair. 2025 a gente conversa.