As duas almas de Chico Bernardes

Em nossa COVER STORY de dezembro, fechamos o ano com o artista Folk falando sobre as suas referências na literatura e arquitetura e o lugar da música intimista no Brasil

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Fotos: Lucas Sant'Ana

Localizada entre as diversas ladeiras do bairro de Alto de Pinheiros, a Praça Waldir Azevedo é um dos oásis verdes de São Paulo. Descendo as escadas de pedra por entre os bosques, quem visita o cenário encontra o famoso Mirante de Pinheiros, de onde é possível avistar o mar de prédios da cidade ao longe. Entre outros lugares, é lá que Chico Bernardes encontra um pouco do sossego que tanto gosta para caminhar sozinho com seus fones de ouvido. 

O local é nostálgico para jovem músico. Nascido e criado no bairro, ele costuma frequentar a praça desde a infância. “Andava de skate, sentava nas muretinhas para conversar com meus amigos e até já estourei bombinha aqui”, lembra. Foi com a brisa que sopra continuamente no mirante que conversamos com o estreante da cena musical independente paulistana. 

Lançado no primeiro semestre deste ano, Chico Bernardes (2019) traz um punhado da intimidade do menino de apenas 20 anos em canções majoritariamente confessionais. Carregando o frescor e as diversas dualidades da geração pós-millennial, o mais novos dos “pereirinhas” – ele é filho de Maurício Pereira e irmão de Tim Bernardes – é introspectivo e observador e um tem lado, em suas palavras, “mais pacato”. Isso o fez se aproximar da experiência musical mais intimista do Folk sessentista de Bob Dylan, Joni Mitchell, Duncan Brown e Nick Drake, e depois de artistas contemporâneos do gênero, como Grizzly Bear, Fleet Foxes e Andy Shauf. 

Na mesma semana que confirma sua primeira turnê internacional, por Portugal, Chico conta sobre a construção de sua identidade musical com a presença de Maurício e Tim, a inspiração em contos literários para compor, o interesse pela arquitetura e a fotografia, o ímpeto crescente de produzir em casa e o respiro que a música acústica e de cunho mais pessoal proporciona em meio ao atual cenário político.

Para além da música, quais são seus hobbies?

Depois que comecei a me interessar mais por música, meus hobbies começaram a girar em torno disso, tanto antes quanto depois de gravar o disco. Comprei uma placa de áudio e comecei a gravar demos e me interessar por produção, em como chegar nos timbres que eu queria. Com o conhecimento que eu adquiri na gravação no Estúdio Canoa, do Selo Risco, e o que aprendi sozinho, tenho cada vez mais vontade de gravar em casa mesmo. Além da música, não diria que sou um bom leitor, mas no momento estou lendo um livro com todos os contos da Clarice Lispector. Sempre tive um interesse pela literatura. Acho que, na escola, era a única matéria que eu não mandava mal, então foi um caminho natural me aprofundar. Lia mais literatura nacional pelo colégio, mas eu sempre gostei mais de contos, por conseguir ler mais depressa e ir fazer outra coisa, já que eu sou uma pessoa dispersa, assim não deixo livros pela metade. Já li muitos contos do Machado, do Valter Hugo Mãe, do Walter Benjamin. Enfim, livros que você consegue pegar e falar “agora vou ler um conto desse cara”, nada muito imersivo. Com o celular do lado, está cada vez mais difícil de ler, mas tento encaixar na rotina. Espero um dia ser um leitor melhor e não ficar pensando em mil coisas ao mesmo tempo. 

Você acha que o interesse pela literatura também tem a ver com a sua criação?

Veio mais da escola mesmo. Mais do que ler, sempre gostei muito de escrever. Nas aulas de redação, escrevia narrativas curtas. Minha composição tem um pé nessa escrita que eu fazia quando era novo. Não tinha necessariamente uma métrica, nem vinha como letra. Às vezes, fazia poemas também, mas era mais contos mesmo. Quando eu passei aprender mais sobre poesia, no colegial, comecei a criar letras e juntar meus sentimentos e música, para tocar o pouco que eu sabia de violão na época. 

Então, suas composições têm muita influência de contos?

Sim. As pequenas narrativas que aparecem nos contos também podem existir na música. Ela pode ser algo mais Pop, só com verso e refrão, mas também pode contar uma história. Eu sempre me interessei pelos artistas do Folk norte-americano, que têm a relação do violão com a história. Carrego um pouquinho disso. Tem muita coisa de experiências e sentimentos pessoais que eu transcrevi, mas algumas faixas, como “Um Astronauta” e “O Espelho”, são pequenas narrativas. Aos poucos, estou entendendo como explorar isso melhor na minha escrita.

O que mais você consome da arte em geral que te influencia na produção musical?

Nunca fui muito bom com nomes e referências específicas, mas sempre mantive a mente aberta ao que vai me aparecendo. Tenho interesse em muitas coisas e gosto fazer um pouco de cada. Por isso sou multi instrumentista também. Assistia filme do Tarantino, do Hitchcock, coisas mais Cult, mas também vi muito filme besteirol, e acho que tudo se mistura e faz parte do todo. Gosto de filme com fotografia e cores bonitas. A década de 1980 tem uns filmes gravados com película que os diretores se preocupavam com a cenografia, o que entra também no meu gosto por arquitetura. Das artes, o que tenho mais afinidade é arquitetura e design gráfico, essa questão mais estético-visual. O design tem um diálogo com a escrita e me levar à fotografia também, gosto de mesclar essas coisas. A arquitetura tem uma questão de forma e pensamento estético de algo que você quer concretizar. Gosto de pensar nela, não necessariamente como algo visual, mas em uma estrutura que você quer construir com detalhes. Compor música também é arquitetar algo, por isso eu busco nesse campo uma forma concreta de algo que é abstrato na música. Arquitetos também são compositores de certa forma, é só uma maneira diferente de fazer arte. Curto esse paralelo com outras artes, de ver o que cada uma tem a ver com a música e trazer de volta. Meu disco, por exemplo, se fosse uma peça, seria um monólogo; na fotografia, seria um retrato.

Falando em arquitetura, a de São Paulo tem formas de todos os tipos e isso afeta cada um de uma maneira. A sua música parece buscar um lugar mais calmo, quieto e introspectivo. Isso tem e não tem a ver com São Paulo, ao mesmo tempo. Por um lado, as pessoas são mais solitárias, mas a cidade está sempre frenética e em movimento. Você acha que a arquitetura daqui te influenciou ou você tentar fugir um pouco disso?

Aqui tem essa questão da quantidade de construção e informação demais a todo momento. É uma aceleração que às vezes é bom para a produção. Mas eu comecei a compor no campo, na casinha da minha família no interior de São Paulo, que é para onde a gente ia quando queria fugir da rotina e estava cansado da cidade. Como eu nasci aqui, tenho muito da freneticidade que a cidade proporciona e gosto disso, mas sou mais pacato, no campo encontro meu sossego. Gosto de ter o contraponto de sair da cidade para descansar. No interior dá pra ter uma relação mais pessoal com todo mundo. Aqui tem uma coisa de querer fugir e passar reto pelas pessoas. Isso, de alguma forma, também é a arquitetura. É como a cidade se comporta. Um monte de prédio com umas árvores em volta e uma rua que passa no meio, de repente uma avenida cruza e do outro lado já é outra coisa. A planta da cidade dá uma personalidade a ela.

Como se desenrolou sua construção como músico e como você escolheu o violão como instrumento principal?

Comecei a tocar bateria em 2014, foi meu primeiro instrumento. Usava uma bateria do meu irmão que ele deixou em casa. Mas uma hora ele decidiu que não queria que eu usasse mais. Aí eu fui tocar ukulele, mas era muito pequeno, e então passei para um “ukulele maior”, o violão. Isso foi no segundo colegial. Comecei a tocar umas coisas que eu estava ouvindo na época, tipo Mac DeMarco. Depois aprendi guitarra, e até uso em uma banda que mantenho com alguns amigos, a Fernê, mas percebi que meu instrumento é o violão mesmo. Quando percebi que podia mudar a afinação e tinha a ver com artistas que eu gostava do Folk antigo e contemporâneo, tipo o Grizzly Bear, a Joni Mitchell, o Nick Drake, isso mudou tudo. Aí entrei na faculdade e comecei a me aprofundar.

Quando ouvi seu disco, pensei muito no Nick Drake.

Tem outro cara que eu curto muito, o Duncan Brown, que meu irmão me apresentou. Ele mudou minha vida. Ele canta e toca violão lindamente. E a partir dali eu comecei a me interessar mais por cordas de nylon também.

Você tem preferência pela autossuficiência que o Folk proporciona de certa forma, mais do que manter uma banda?

Tenho um lado solitário e autossuficiente. De certa maneira, eu acho legal que estou carregando no meu nome esse primeiro trabalho por ter essa possibilidade de tocar e viajar sozinho, e levar essas composições que eu tirei de dentro de mim para mostrar para as pessoas, que é algo que ninguém pode fazer por mim. Mas ultimamente tenho testado show com banda sim. Não gosto de pensar por extremos, sempre um pouco de cada. 

Quem está na banda?

A gente toca como power trio. É Theo Ceccato, na bateria, e o Gabriel Buchmann, no baixo. Acaba puxando para os lados mais elétricos do disco, mais Rock’n’roll e balada. Está sendo uma experiência interessante transformar o que eu gravei sozinho em arranjos de banda.

Falando da questão geracional, como seu pai e seu irmão favoreceram a sua construção como músico?

O ambiente de casa sempre estimulou. Ao mesmo tempo que não podia chegar perto da guitarra do meu irmão, quando a gente dividia quarto, ele estava sempre ouvindo música. Ele botava Gorillaz, Red Hot Chilli Peppers, Strokes, essas coisas. Meu pai colocava discos no carro e a gente ia pra praia ouvindo Bob Marley, Police, Chuck Berry. A gente ouvia no CD, não tinha acesso a streaming ainda. E aí quando eu fiz uns oito ou nove anos, meu pai me gravou um pen drive com músicas de Elvis a Nirvana. 

Engraçado, normalmente é o filho que faz essas coisas para os pais.

É, então. Ele estava aprendendo a baixar música, tinha o iTunes cheio. Aí depois ganhou um daqueles iPod Shuffle, sem tela, numa promoção, e gravou pra mim também. Lembro de ouvir muito Queen nessa época. Enfim, eu tinha sempre um fone no ouvido durante atividades motoras, seja na fase em que curtia fazer circo ou depois quando fui andar de skate. Mesmo que eu não tocasse nada, a música estava comigo sempre. Depois, conforme eu fui me interessando mais, acompanhava meu pai e meu irmão nos shows. Eu via ele tocando em casa, me mostrava vinis e indicava quem ele gostava pra eu ouvir. Eu lembro de conhecer Fleet Foxes e Tame Impala com ele, lá por 2012. E ali que meu ouvido começou a ficar mais alerta para a música e buscar entender a instrumentação.

Hoje, quando ele [Maurício Pereira] toca uma música daquela época, me vem uma sensação nostálgica. Eu busco isso nas minhas composições também: criar algo que quando eu ouvir daqui a muito tempo, vou me lembrar de quando foi escrito. – Chico Bernardes

Você tem alguma memória específica desses shows que te marcou?

Eu lembro que eu tive um turning point em 2015, quando eu estava começando a tocar guitarra, em um show no Ibirapuera, do Terno com o Boogarins, que eu não conhecia na época. Lembro de ouvir uns pedais deles que somavam com os do meu irmão e eu comecei a me interessar pelas colorações de timbre que apareciam ali. Do meu pai, eu me relaciono com as letras. Lembro de ser pequeno e ficar zanzando nos shows dele, conhecer o repertório e ter isso muito bem gravado na cabeça. Hoje, quando ele toca uma música daquela época, me vem uma sensação nostálgica. Eu busco isso nas minhas composições também: criar algo que quando eu ouvir daqui a muito tempo, vou me lembrar de quando foi escrito. Por isso a ideia do retrato do meu disco. 

Como você consome música e como isso influencia sua produção?

Uso streaming, iPod, CD e vinil. No quarto, ouço CD e, na sala, vinil. E gosto do iPod porque ele não é celular, não tem internet, nada. Sempre consumi muita música, por ter sempre um dispositivo e um fone de ouvido. Eu sempre estava com fones no intervalo da escola e conforme me interessei em ser artista e compositor passei a tentar entender mais da sensibilidade e do universo de cada artista quando estava construindo seu trabalho. Vejo também dos meus amigos artistas a vontade de querer estar junto e criar uma atmosfera musical para construir algo que vai além da rotina, do banal. Tocar e ver a música como um bem externo que podemos carregar. Falando de como minha relação com a música mudou, depois que entrei na faculdade, comecei a estudar música brasileira, barroca, clássica, conheci caras como Debussy e Ravel, do movimento impressionista da Europa. Eles inovaram em suas peças para piano com acordes da forma que queriam, com texturas e cores diferentes. A maneira com que quebraram com um pensamento conservador na música europeia tem muito a ver com artistas do final da década de 1960 e início de 1970, que faziam um som de muita personalidade, com o que vinha de dentro, também da forma que queriam. São nesses artistas que me espelho para fazer minha música.

Quais são suas principais referências de sonoridade?

Quando eu estava na oitava série, muita coisa passava pelo meu ouvido, na escola, nas festas, pelos meus amigos e pelo meu irmão. Música eletrônica, Dubstep, Rap, as bandas Indie. Conforme eu entrei no colegial, fui filtrando mais o que eu ouvia. Me interesso muito por vários estilos, mas, ao mesmo tempo, o violão é o que me puxa. A Joni Mitchell eu gostava pelas mudanças de afinações e por ela fazer algo muito grandioso só com voz e violão. Já o Grizzly Bear e o Fleet Foxes eu gosto por timbres, o arranjo… O George Harrison é meu Beatle favorito, por ter seguido um outro caminho, ter ido viajar, seguir o caminho dele, ir pra Índia. Eu me interesso pela introspecção dele, por buscar uma paz de espírito e estar bem consigo mesmo. O Duncan Brown tem uma coisa de cantar baixinho que eu gosto. O Neil Young gosto por ser uma coisa mais seca, uma coisa sinestésica do Folk. Só violão de aço, baixo, gaita e bateria. 

O que você tem ouvido fora disso?

Hoje em dia, não me interesso muito por música eletrônica, mas vivia brincando com um sintetizador do meu pai. Gosto mais dos timbres do que o som em si. A música eletrônica está muito ligada a festas e noite e consumir música pra dançar nunca foi uma coisa muito minha. Eu curto mais os grupos indies que se utilizam de elementos eletrônicos. Ouço Homeshake, por exemplo, que tem drum machine e teclado, e mesmo assim está mais ligado a uma forma de canção, assim como o Mild High Club.

Qual o lugar da música acústica e Folk no Brasil hoje?

Acho que não dá pra dizer ou encaixar muito as coisas em determinado lugar. Ao mesmo tempo em que o cenário político está cortando muita verba para a cultura, e isso inviabiliza alguns projetos, muita gente nova e velha está tocando violão. Seja tocando Folk no violão de aço ou um MPB no de nylon, tem muita gente compondo. O legal dessa geração é que tem uma diversidade de gente produzindo em diferentes estilos. Em São Paulo, existem muitas pessoas de lugares diferentes com referências diversas. Então acho que existe uma interpretação livre de cada um se encaixar o que ouve onde quiser, assim como o artista tem uma visão de onde está.

Gêneros como o Rap, o Funk e a música Eletrônica têm crescido como meios de resistência e de ocupar a cidade. Nesse contexto, você acha que a música Folk ou acústica pode ser uma maneira de ir para um lugar mais íntimo e quieto, ter um respiro?

Sim. Eu achei interessante como as pessoas reagiram e se identificaram com músicas do meu disco, mesmo que tão pessoais. Da mesma forma que estão aparecendo artistas que lutam por uma causa e ocupam esse lugar de protesto, também há pessoas, como é o meu caso e acho que do meu pai e do meu irmão também, que estão mais na sua e fazem música mais pessoal e reflexiva, trazendo um pouco de si para o mundo. Há pensamentos musicais mais coletivos, para ser consumida em contextos musicais mais alegres e dançantes, de movimento, outros são para ficar sentado e pensar. Minha música foi pensada e escrita para mim primeiro e depois parti para uma nova etapa de mostrar isso para o mundo e ver qual é a reação.

Sobre suas composições, você lembra de alguma história interessante?

“O Espelho” eu escrevi depois de um dia de palestras e debates na escola. Eu fiquei instigado sobre o que um cara falou sobre a linha entre o que as pessoas enxergam em nós e o que nós vemos em nós mesmos. Também tem ver com um conto do Machado que li, O Espelho, que fala sobre a dualidade da alma. Com isso em mente, eu falo sobre como todo dia a gente se olha no espelho e está um pouco diferente. A relação com a transformação. “O Astronauta” surgiu de uma admiração que tenho por coisas cósmicas desde pequeno, quando gostava do Buzzlightyear. Pensei numa estética mais de trilha sonora, meio Blade Runner, com timbres estelares. É uma metáfora para uma história que eu criei sobre uma pessoa que se vê lutando por um objetivo, persistente, e com muita vontade de chegar lá, mas quando ela chega, vê que já tinha tudo e corria atrás de algo idealizado, e aí começa a dar valor a isso. “Distante” é sobre um amor platônico do colégio. No final do terceiro ano, estava me despedindo dos amigos, aí mostrei a música para a pessoa em questão e expliquei que era sobre algo que senti quando a vi, mas que era só isso, que não ia se concretizar. E ficou por isso mesmo. Fui embora e a escola acabou pra sempre.

Como foi a gravação do disco?

Foi no estúdio Canoa, durante um mês, todos os dias, das 10h às 20h. Gravei tudo sozinho. Coloquei uma lousinha com cada instrumento de cada música e ticava os que ia gravando. Tinha dia que minha cabeça fritava e eu ia embora mais cedo. Foi uma viagem pra dentro do estúdio. 

Você prefere estar no estúdio ou no palco?

Por enquanto, me sinto mais confortável no estúdio. Como qualquer um, tenho ansiedade para fazer um show, mas já foi maior. Agora consigo ter mais prazer do que ficar pensando no que as pessoas estão achando. Mesmo assim, quando estou sozinho é o lugar que eu gosto de fazer música e de pensar na expectativa de pessoas sobre o que está sendo feito. 

Como surgiu a ideia da capa do disco? Tem alguma referência?

A capa veio da ideia de arquitetar um cenário. Tem uma cadeira pra mim e uma outra pessoa, seja aquele amor platônico, alguém que entrou ou saiu da minha vida. A grama tem a ver com a relação que eu tenho com o campo. Metade da capa está preenchida e outra tem só grama. Muita gente falou que parece a capa do George Harrison, que eu não tinha pensado antes, mas depois achei que faz muito sentido. A garrafa térmica veio de casa e tem quase a minha idade. Ela é meio profética pra mim, porque aparece nos meus sonhos. Eu levei um café de casa nela pra casa do meu amigo que tinha o jardim. Uma amiga minha que tirou a foto com uma camêra dos avós delas. São vários elementos simbólicos. 

Você já tem novas composições? Quais seus próximos passos?

Consegui compor mais neste semestre, depois do lançamento do disco, a partir de um acúmulo de energia criativa e experiências que vieram e trouxeram novas narrativas e experiências. Já tenho umas cinco ou seis músicas. Nesse meio tempo, tenho lido mais poesia também, de Leminski, Manuel Bandeira, Manoel de Barros, livrinhos de haicais, coisas que não costumava ler muito, pra tentar reinterpretar a palavra. Tem algumas letras que estão abstratas, mas cada palavra carrega um significado maior, tentando achar minha estética por meio do que escrevo. Também estou juntando equipamento para gravar o próximo disco todo em casa. E em 2020 vai ter mais show fora de São Paulo. Tem turnê em Portugal no começo do ano também, vou fazer 10 cidades em 10 dias. 

Quais seus pensamentos sobre como os artistas se inserem no cenário político de hoje?

Na política, passamos por etapas e ciclos, que vão aparecendo e desaparecendo. Nesse momento mais conservador em que estamos não conseguimos fazer nada de concreto, hoje, que vá mudar, mas isso gera um sentimento na população e gera cultura. Dentro da arte há muitas maneiras de contribuir com um contraponto a esse cenário tão bizarro e tragicômico, mas que, se for olhar na história, já aconteceu outras vezes. O que a gente mais se preocupa hoje é em cair numa ditadura de novo, e pequenas censuras já vêm acontecendo, então o que podemos fazer é continuar promovendo a arte e se encontrar pessoalmente. Com a internet e o Instagram, as pessoas só ficam olhando o que as outras estão fazendo pela tela e se encontram pouco. Acho que é ter uma troca com as pessoas que são importantes pra gente. A quem é artista, continuar produzindo.

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