Qual o plural de sul?

Depois da decrescente do “Rock Gaúcho”, a música do Rio Grande do Sul fez questão de se atualizar avançando para outros gêneros sonoros. Listamos aqui alguns dos artistas e bandas mais interessantes do estado

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Fotos: Supervão por Kim Costa Nunes

Naquela época, quando o Rock ainda não tinha morrido (lembra?), se falava muito em “Rock Gaúcho”, um termo que caiu em desuso à medida que o estilo também parou de se comunicar para as novas gerações. Isso não significa, como bem sabemos, que a música do Rio Grande do Sul entrou em um período de menor produtividade. Na verdade, o que aconteceu foi o contrário. 

A nova cena independente do estado está a par do contexto brasileiro contemporâneo e, assim como acontece em outras regiões, tem incorporado pluralidade estética à sua música. Do Indie à Eletrônica, do Post-Rock à MPB, são cantores, compositores, arranjadores, instrumentistas e produtores que somam qualidade, experimentação e criatividade ao repertório nacional. Dentre os tantos nomes que merecem destaque no Rio Grande do Sul, o Monkeybuzz selecionou sete projetos que exemplificam o que os gaúchos têm feito.

Tagua Tagua 

Felipe Puperi foi destaque na cena Indie brasileira no começo da década com seu Wannabe Jalva, banda que se dissolveu ao longo dos anos. Antes do fim de suas atividades, saiu o single “Mareá” (2016), uma parceria com Curumin que trazia pela primeira vez WJ em português. Não é a história oficial, mas dá para argumentar que Tagua Tagua começava ali. O projeto sabe olhar para o Brasil e trazer timbres e ritmos que atravessam as divisas dos estados. O vocal, sempre em clara evidência, traz reflexões sinceras sobre a vida, sua finitude e questões introspectivas que acontecem nessa trajetória louca que é viver. Já os arranjos são animados, quase explosivos, cheios de cores e muito alinhados à produção contemporânea. Não à toa, “Peixe Voador” entrou para a trilha do jogo FIFA20.

Ian Ramil 

A família Ramil é de grande renome e produtividade na música gaúcha, tanto é que existe um projeto que reúne sete de seus membros. Ian se destaca com uma voz grave e potente, assim como uma habilidade de ir do Experimental ao Pop de uma faixa a outra em um disco. E é claro que ter ganhado um Grammy (de Melhor Álbum de Rock em Língua Portuguesa, em 2016, para Derivacivilização) só ajuda nos quesitos popularidade e respeito. Com um terceiro álbum a caminho (ainda sem maiores detalhes), o músico promete continuar atento à realidade que canta em suas composições. Ao mesmo tempo, a versatilidade de seu som – da temática à vibe nas faixas – também estará presente mais uma vez. Em entrevistas recentes, Ian comentou também que o nascimento de sua primeira filha influenciou diretamente sua maneira de compor.

As Longas Viagens 

Por falar em pluralidade, causa um grande espanto perceber como o músico que atende apenas por Maurílio reuniu faixas tão distintas em seu primeiro álbum, o recente A Conquista do Inútil. É Noise, é Post-Rock e é Lo-Fi, tudo se atropelando deliciosamente ao longo de sete faixas – que somam juntas impressionantes 47 minutos. As músicas foram resultado de dois anos de experimentações com outros músicos em estúdio. A vontade era “sair da caixinha”, como Maurílio conta, e “chegar a um lugar que não conhecia”. O processo tão longo, que incluiu muitas brincadeiras com modulação e a passagem de todas as músicas para uma mesa de fita, resultou também em outra ideia: Tirar apenas uma semana para gravar um segundo disco, que ainda não foi lançado.

Supervão 

O trio cita MGMT, Jorge Ben Jor, Caetano Veloso, Warpaint, Mac DeMarco e Teto Preto entre as (muitas) inspirações para a produção de Faz Party, álbum lançado em julho. Ou seja, é mais um trabalho que esbanja multiplicidade em sua essência. Isso vem, em parte, de um espírito explicitamente brasileiro na vontade de sintetizar os sons que vêm de fora com a produção local e ver no que isso resulta. Esse fluxo chegou a um lugar cheio de cores, luzes e camadas nas mãos do trio. Com aquele som que a gente quer ver ao vivo em uma festa, na balada ou em um festival ao ar livre, Supervão tem tudo para ser referência de uma produção musical que, em uma época tão difícil de se viver, sabe promover o alívio pela animação contagiante de suas composições.

Paola Kirst

Costuras que me Bordam Marcas na Pele é pura poesia desde o título. O primeiro álbum da artista, lançado no fim de 2018, impressiona de diversas maneiras, a começar por como ela trabalha o legado de ritmos tradicionais brasileiros em uma estética sempre contemporânea. A influência do Jazz também se faz presente como base de experimentos e desenvolvimentos de onde saem as composições e os arranjos. Chama atenção também a interpretação de Paola (difícil acreditar que esse é seu disco de estreia, tamanha sua maturidade). Lembra Luiza Lian na maneira com que ela usa a voz, Xênia França na interação da voz com a banda e até Esperanza Spalding pela pegada que vem do Jazz. E, sabemos, só uma artista de grande valor poderia receber essas três comparações.

Esquimós

Aquele Indie mais introspectivo, longe dos grandes festivais, inspira largamente a banda, que, recentemente, revelou sua nova formação como um duo. É nesta nova fase que chegará seu segundo disco, Bonança, em outubro. Duas amostras já nos foram dadas de seu repertório: “O Fim do Fundo” e “Petricor”. Elas chegam da promessa que o sucessor de Âncora (2015) será o trabalho mais experimental que Esquimós já lançou. A sonoridade abafada e os momentos ora muito carregados, ora quase mínimos que as duas faixas apresentam são pistas do lugar sonoro em que a dupla se encontra hoje. O que parece não ter mudado do anterior para este novo é a enorme sensibilidade presente nas músicas, assim como um radar muito ligado ao que o Indie tem de melhor hoje em dia ao redor do mundo.

Catavento

E fica difícil falar de música do Rio Grande do Sul sem citar uma banda tão presente no Monkeybuzz já há tantos anos. O site viu Catavento ganhar autenticidade ao desenvolver uma sonoridade livre de rótulos, do tipo que encara cada composição com os elementos próprios que ela precisa para ganhar vida. Cada vez mais, o grupo se revela grandioso em sua personalidade. Com uma história que se confunde com a do surgimento do selo Honey Bomb Records, Catavento é também referência para as bandas de fora de Porto Alegre e suas mediações, promovendo arte e música na região de Caxias do Sul. As muitas viagens pelo país, e os intercâmbios com bandas que vêm tocar em sua casa, só contribuem para sua música estar sempre relevante aos ouvidos contemporâneos, e excelente para quem busca algo de qualidade.

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Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.