Cadê – O Primeiro Disco da banda 14 Bis (1979)

Composta por membros que tocaram com Milton Nascimento, banda passa quase sempre desapercida no radar da música brasileira

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Quando Milton Nascimento e Lô Borges lançaram seu disco conjunto, Clube Da Esquina, em 1972, estava definitivamente posta no mapa uma nova variação de música brasileira. Essa nova canção era fruto de uma interseção entre Rock inglês via Beatles, Pink Floyd e Yes e música brasileira não totalmente sintonizada com Rio de Janeiro ou São Paulo. A “música mineira” era o resultado da mistura entre canções da infância, ouvidas no rádio, com ritmos mais tradicionais, como a música sacra ou folclórica. Ao longo da década de 1970, essa nova canção passeou pelos terrenos do rock e da chamada MPB, com intensidades diferentes. Com o 14 Bis ela assumiu forma inegavelmente roqueira, mas guardando muito de idílio e existência ideal nas cidades médias de Minas e Rio de Janeiro.

Formado pelos irmãos Flávio e Cláudio Venturini, além de Vermelho, Hely Rodrigues e Sérgio Magrão, 14 Bis surgiu em 1978, logo após Flávio participar de Clube da Esquina 2. Ele já participara do grupo progressivo O Terço entre 1974 e 1976 e integrava uma geração de músicos mineiros, da qual faziam parte Beto Guedes e Lô Borges, que levavam a tal mistura musical do parágrafo anterior adiante. Beto e Lô já faziam sucesso como artistas solo quando Flávio decidiu formar o 14 Bis. Ele já conhecia Vermelho desde fins dos anos 60, após ambos servirem ao CPOR em Belo Horizonte. Após o serviço militar, os dois começaram a compor e se aproximaram do pessoal do Clube da Esquina, mudando-se para o Rio e depois São Paulo, onde Flávio foi convidado para integrar O Terço. Ao mesmo tempo, Vermelho participava de festivais de inverno, comuns nas cidades mineiras, encontrando num deles um grupo chamado Bendengó, do qual passou a fazer parte.

Em 1977, Flávio e Vermelho tocaram no primeiro disco de Beto Guedes, A Página do Relâmpago Elétrico. O disco foi lançado em janeiro de 1978 no Rio de Janeiro e a banda de apoio era composta por Flávio, Vermelho, Hely Rodrigues, entre outros, com a chegada de Cláudio Venturini, fissurado em eletrônica, para ser técnico de som de Beto Guedes. Com a chegada de Magrão, ex-integrante do Terço ao lado de Flávio, o 14 Bis estava formado. Após sucessivas investidas da EMI, Venturini aceitou o contrato da gravadora, mas, ao invés de assinar como artista solo, o grupo foi devidamente integrado ao elenco da companhia, que já contava com Beto Guedes e Lô Borges.

O primeiro disco do 14 Bis é um pequeno marco do Rock Nacional. É cria direta do chamado “rock rural” de Sá e Guarabira, da mineirice do Clube da Esquina, da absorção do Rock progressivo e, claro, da habilidade de seus integrantes, principalmente nos arranjos vocais e nas composições. O grupo foi presenteado por Milton Nascimento e Fernando Brant com a inédita, Canção da América, logo alçada à condição de clássico instantâneo. Outros belos exemplos musicais povoam o disco, como Natural e Perdido Em Abbey Road, com os versos “A menina que saiu de casa, Numa quarta-feira, Já voltou há muito tempo, E dela nunca mais se ouviu falar”, aludindo diretamente a “She’s Leaving Home”, faixa de Sgt. Pepper’s, deixando bem claras as influências beatle do grupo. Por outro lado, Meio Dia, de Flávio e Vermelho com Luiz Carlos Sá, tem o verso “Passarinho verde cantou, No galho do pé de romã, Acordei no fim da manhã, E do meu lado você sorria” a alusão à vida simples e em contato com a natureza, talvez um reflexo hippie tardio ou a visão do cotidiano de cidades menores que os grandes centros.

14 Bis ainda está na ativa, mas sem Flávio, que deixou o grupo em 1987. O grupo teve uma carreira sólida ao longo da década de 1980, oferecendo uma alternativa ao Rock Pós-Punk eminentemente urbano feito a partir de 1982. Seu primeiro disco foi relançado em CD nos anos 00, primeiro em CD simples, depois na série Bis, junto com o segundo trabalho da banda, 14 Bis II. Ainda pode ser encontrado à venda com certa facilidade, constituindo uma rara exceção nos discos desta coluna, quase todos fora de catálogo.

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ARTISTA: 14 Bis
MARCADORES: Cadê?

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.