Chediak: nem dark, nem feliz – só elétrico

O EP “TUNNELRUNNING” chega junto de uma festa/selo musical e apresenta uma coleção frenética de Música Elétrica – além de explicar os significados disso, o produtor fala sobre Daft Punk, The Office, música de videogame e das qualidades do Tik Tok

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Fotos: Divulgação

Eu queria ter conhecido o Chediak antes. Não (só) a música do Chediak, mas o Pedro Chediak. Digo isso porque somos da mesma cidade (bem, mais ou menos). É que eu nasci e fui criado em Juiz de Fora, na Zona da Mata Mineira, e ele se mudou para cá no início da década passada. Na minha cabeça, somos, sim, da mesma cidade, porque afinal, a “nossa cidade” é aquela na qual passamos a adolescência, período que define parte significativa da nossa personalidade.

Logo no começo da entrevista, Chediak conta dessa mudança. Ele veio para o interior de Minas Gerais e foi parar em um “colégio de playboy”, onde era muito zuado por ser nerd. “Tudo que é digital e dá para hackear eu quero saber como faz”, ele destaca. Os problemas na escola fizeram com que ele abandonasse os estudos, passando por edição de vídeo, até chegar à produção musical.

Começou com mashups de funk no Soundcloud e, hoje, Chediak é produtor e compositor do que ele define como “música elétrica”. Viveu por um tempo em São Paulo e, durante a pandemia, voltou à Juiz de Fora. Em Junho de 2022, o artista anunciou a estreia da SPEEDTEST, uma festa e selo musical focados em techno, house, drum n’ bass e breakbeat. “A intenção é criar um catálogo muito foda de música pra DJs e musica eletrônica num geral pra jogar na mão dos DJs lá fora”, ele pontua.

O lançamento do SPEEDTEST chega logo após TUNNELRUNNING, trabalho que reúne pela primeira vez, a miscelânea de gêneros que influencia o artista. O conceito surge com Chediak produzindo músicas para uma rave imaginária nos túneis de São Paulo, imbuído por um sentimento de contravenção.

Do interesse por sons criados digitalmente à música de videogame, passando por programas de comédia, trocamos uma ideia com ele, que poderia ser o amigo de qualquer nerd de música que viveu sua adolescência na década passada.

Como você define o som que você faz hoje, principalmente no TUNNELRUNNING (2022)?

Música Elétrica. Eu não sou uma pessoa minimalista, não consigo ser, e aí isso reflete 100% na minha música. Se você for ouvir o TUNNELRUNNING você entende tudo que eu tentei fazer, mas ele é uma bagunça, tudo acontecendo ao mesmo tempo, frenético.

Meio “damn, bitch you live like this?”

É “damn, bitch you live in 200 bpm?” (risos). Parece que quanto mais eu vou ficando mais calmo na minha vida real — eu voltei pra Minas pra ter uma vida mais tranquila — , a minha música reflete o oposto. Defino meu som como música elétrica porque a minha intenção atualmente é criar um soundscape que te traga aquela energia de quando você vai crackear um programa pirata. Meus primeiros contatos com música eletrônica, antes dos artistas mesmo [foi isso]. Meu pai me ensinou a baixar jogo pirata, e aí sempre vinha aquele visual retrô, 8-bit, as vezes um 3-D mal feito.

O TUNNELRUNNING sou eu tentando mostrar para as pessoas qual o meu processo na música eletrônica até chegar aqui. Ele tem bastante timbres clássicos de rave anos 1990, coisa mais 8-bit, chiptune, influência de techno de final dos anos 2000. Não chega a ser feliz, mas também não é dark, é só elétrico, movimento. Criar essa música eletrônica que evoque movimento. Um híbrido das minhas influências, o projeto que mais reflete as coisas que eu gosto.

Lembro de uma live que você fez na Twitch assistindo Blade Runner (1982) e também de uma homenagem que você fez pro Vangelis quando ele faleceu, e do dia que o Daft Punk anunciou o fim. Qual a importância desses caras no seu trabalho e quais os artistas para entender o que o Chediak tá fazendo?

São três, eles não têm muita coisa a ver um com o outro, a não ser o fato de (pra mim) ser tudo música eletrônica. Primeiro, sempre vai ser Daft Punk, porque foi meu primeiro contato. Eu tinha oito anos, vi uma matéria na TV de dois malucos vestidos de roubo num palco que é uma pirâmide cheia de LED. Em 2006, 07, explodiu minha cabeça, parecia muito a música que tocava no meu videogame. Alguns anos depois saiu aquele filme Tron: O Legado (2010), fui com meu pai assistir. Amo a estética daquele filme, mas a trilha sonora me engoliu.

“O ‘TUNNELRUNNING’ sou eu tentando mostrar para as pessoas qual o meu processo na música eletrônica até chegar aqui. Tem timbres clássicos de rave anos 1990, coisa mais 8-bit, chiptune, influência de techno do final dos anos 2000. Não chega a ser feliz, mas também não é dark, é só elétrico, movimento. Criar essa música eletrônica que evoque movimento”

Eu lembro que essa trilha sonora foi uma das primeiras vezes que ouvi música ativamente, provavelmente o primeiro álbum que baixei.

O reflexo deles no meu trabalho foi sempre ter tentado fazer trabalhos atemporais, músicas que eram muito boas quando saíram e não ficaram datadas. Não sei se é algo que reflete no meu trabalho ou não, isso o público que vai decidir e o tempo que vai falar, mas é uma referência que eu tenho. No caso de “BMW VOA” foram três anos até a música sair, acho que essa parte vem do Daft Punk. E o fato deles terem uma abordagem bem divertida pra fazer música.

Aí vem o Vangelis, uma referência na questão de melodia, arranjo, e principalmente ambientação/atmosfera. Quem me mostrou foi o Maffalda, meu melhor amigo de anos. Meu interesse por sintetizador triplicou por causa desse cara, foi quando fui atrás de um sintetizador analógico, que tem um caráter especifico. Adoro software digital, mas o equipamento que foi criado com circuitos coloca uma expressão no som.

Do ponto de vista de composição eu me inspiro muito no Porter Robinson. Conheci ele num disco que chama Worlds (2014), sobre o fim de mundo de um RPG. Estourou no cenário de EDM, criou toda uma onda no cenário de future bass. Foi o primeiro gênero de música eletrônica que escutei e quis escrever parecido.

Com Maffalda, montando o primeiro show de Chediak, em 2017.

No TUNNELRUNNING também dá pra ouvir bastante de “música de videogame”, ainda que isso não seja um gênero.

Música de videogame me inspira muito. O jungle por exemplo sempre andou lado a lado. Você coloca no YouTube “PS1 ambient jungle mix”, tem gente fazendo DJ set de 1h só com música de jungle ambient de jogo de Playstation 1. Tem um grupo de breakcore/drum n’ bass que chama Machine Girl, eles fizeram a trilha sonora de Neon White (2022), um jogo muito foda que tô jogando. Na “111” tem vários sound effect de Kirby, no disco tem percussão de jogo, me ajudam nessa estética retrofuturista.

Você é muito ativo no Tik Tok também né, sempre vejo suas coisas lá e às vezes viraliza. Quais as coisas mais bizarras que tem na sua ‘for you’? Você conhece a “Bateria humana”?

Sim, eu adoro esse cara! Ó, minha “for you” tem o seguinte: um cara tocando uma MPC, uma mina vendendo Polaroid em Piracicaba, o cara mostrando coisas que são proibidas em qualquer favela do Rio de Janeiro e o cara mexendo no sintetizador modular. Logo abaixo, não sei se vai dar pra ver, tem vídeo de várias capas de jogo de Play 1 e um garage tocando (risos) vou até dar like nesse. Tik Tok traz uma aleatoriedade que faz falta na internet, prefiro assim do que a sensação de falso controle de outras redes sociais, e porque é divertido também.

“Defino meu som como música elétrica porque a minha intenção atualmente é criar um soundscape que te traga aquela energia de quando você vai crackear um programa pirata. Meus primeiros contatos com música eletrônica, antes dos artistas mesmo. Com aquele visual retrô, 8-bit, às vezes um 3D mal feito”

E o que você gosta de humor? Lembro de você falando que tentou assistir umas séries de comédia tipo The Office e não tava rolando.

Preciso fazer uma errata: tem um ano que me mudei para Juiz de Fora e tem 11 meses que tô namorando…

Isso muda tudo!

Muda tudo! Porque a Nari [namorada de Chediak] me fez assistir The Office. A ideia de mockumentary nunca me agradou, e aí quando eu fui assistir com ela eu tava com outra cabeça e eu havia sido demitido de uma agência recentemente, então eu tava puto com ambiente de escritório. Gostaria de pedir desculpas, incrível a série The Office. Eu gosto muito de Nathan for You, Loiter Squad, Eric Andre, esse modelo de programa, coisas aleatórias.

Faltou algo nesse papo que você gostaria de falar?

Gostaria de deixar um recado que a música eletrônica faz parte do núcleo da música no Brasil atualmente. Na SPEEDTEST quero juntar estéticas e dar uma cara de digital e eletrônico, mas que tenha cara de Brasil, o que tá tocando em baile, em festa e juntar com o que tá tocando nas fábricas abandonadas. Gostaria que cada vez mais as pessoas abrissem a mente delas para novas oportunidades musicais. Essa é minha missão de vida.

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ARTISTA: Chediak