Distant Topic em síntese

Fruto do encontro entre o mineiro Brunno e o paulista Gabriel, o projeto explora sintetizadores clássicos, timbres brilhantes e melodias fortes em “UNSOLICITED”, disco destrinchado com exclusividade para o Monkeybuzz

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Fotos: Eduardo Urzedo

Distant Topic é um projeto synthpop/eletrônico de São Paulo, composto pelo produtor/multi-instrumentista Brunno e o vocalista, também multi-instrumentista, Gabriel Pettenon. A união da dupla e a decisão de compor e produzir vem da adoração à música desde a infância – o paulista Gabriel acompanhava os ensaios do pai músico; e o mineiro Brunno passeava com o pai ouvindo Californication no repeat.

Com sintetizadores clássicos, timbres brilhantes, melodias fortes e beats dançantes, o primeiro disco, UNSOLICITED, foi produzido pela própria banda e masterizado nos estúdios do selo Sarcastic Records. Apesar da forte identidade do synthpop, o foco dos dois artistas é descobrir coisas novas, aprender instrumentos novos e desenvolver um som original. “Como artista, cada fase me faz perceber algo diferente que gosto de explorar, como todas as possibilidades de combinar diferentes camadas e sons em uma composição, por exemplo. Como parte do público e consumidor de música, gosto de explorar tudo o que é diferente do que eu faço e estou acostumado a ouvir. Foi esse contato e essas diferentes percepções que me incentivaram a começar a produzir minhas próprias músicas”, conta Brunno.

Lançado na última sexta-feira (8 de abril), UNSOLICITED contém 9 faixas, em sua maioria gravadas a distância, com cada um dos membros em seus próprios estúdios, devido ao isolamento social. O Monkeybuzz traz com exclusividade uma conversa para você conhecer o duo, saber mais do projeto e claro, desfrutar desse diferente e novo mundo pop.

Como nasceu a ideia do projeto?

Gabriel: Eu sempre gostei do estilo musical do Brunno, desde quando fui assistir a um show e descobri a banda em que ele tocava na época. Criamos um laço e começamos a conversar de fazer um som, aí começamos a trocar ideias, experiências, e isso foi só transformando nossas imaginações em músicas.

Brunno: Sempre toquei em bandas e outros projetos com amigos e percebi que, criativamente, poderia fazer mais coisas em termos de composição. Nunca havia tentado produzir antes e nem sabia por onde começar. Eventualmente, passei a experimentar e a gravar minhas ideias no meu celular, trabalhando diferentes formatos e ideias com minhas demos e, naturalmente, isso me levou para o caminho da produção. Sempre fui fã do Gabriel e amo como ele canta, quando as composições começaram a tomar forma eu sabia que queria que ele fosse a voz desse projeto. Então, foi algo que se iniciou de forma bem natural e que se solidificou durante a pandemia, que foi o momento em que gravamos a maioria das músicas desse disco.

Como surgiu a ideia dos nomes das tracks e do registro?

Gabriel: Muitos deles vieram através da sensação que a música me passa, como, por exemplo “Olvidame”. Quando começamos a produzi-la, eu sempre me senti em um lugar solitário, esquecido, mas não como uma sensação ruim, mas sim em paz, por isso me deu a ideia de criar um título que remetesse a isso e “Olvidame” em espanhol é “Me Esqueça”. Então muitos dos títulos das músicas não fazem sentido com as letras, mas, sim, com a sensação e a experiência que ela nos passa. Para o álbum, pensamos em algo que o nome sugere, algo que não foi solicitado, nem planejado, apenas sentimos que deveria existir e mostrar nossa arte para todos de qualquer maneira.

Brunno: A sensação durante a composição de cada faixa com certeza guia as escolhas e, em alguns casos como o de “Countless Mistakes”, por exemplo, uma parte da letra faz sentido como título por ser um termo que resume perfeitamente a situação e o momento que inspirou a composição. “I Thought You Would Like It, But You Didn’t” tem esse nome porque quando eu mostrei a demo para a minha namorada eu achei que ela iria gostar, mas ela não gostou (risos). Inicialmente era um título temporário, mas acabei me apegando a ele e decidimos manter. Desde que tínhamos uma quantidade significativa de músicas decidimos que iríamos lançar um disco e, como artistas independentes, fomos atrás de selos e possíveis gravadoras que poderiam se interessar em distribuir esse material por aí. Durante esse processo, me deparei diversas vezes com as ‘demo policies’ dessa galera, a maioria com a mensagem ‘we do not accept unsolicited demos’. Decidi chamar o disco de Unsolicited por isso, sugeri ao Gabriel e ele gostou do conceito. Já que todo o processo foi totalmente DIY e sem nenhum plano ou solicitação prévia, o nome fez sentido.

Qual é a faixa favorita de cada um do lançamento? Por quê?

Gabriel: Para mim é a “What Are You Doin’?”, ela foi umas das nossas primeiras faixas que criamos e ali consegui entender que linha musical a gente ia seguir e ter nossa identidade. Fora o processo criativo para deixar ela como está, as ideias para a criação das melodias, o primeiro contato com o processo de criação a distância, foi muito importante para o projeto todo em si.

Brunno: “Ziziphus” é a minha preferida. Acho que essa música resume o sentimento geral do que foi fazer esse disco e trabalhar nessas músicas. Eu nunca havia produzido nada antes e aprendi enquanto fazia e gravando essas músicas. Cada parte do processo era um aprendizado novo e uma sensação de descoberta indescritível, e eu acredito que essa música consegue trazer todos esses sentimentos de volta quando a escuto. Além disso, essa é uma música muito especial que fiz para a minha namorada e que sintetiza tudo o que temos ouvido juntos ao longo dos anos. Inclusive, tem um feat. dela em alguma parte! Todas as vezes que eu escuto eu fico feliz.

Quais gêneros, digamos, distantes da música eletrônica também influenciam vocês?

Gabriel: Eu sempre tive muita influência do rock em minha vida, outros gêneros como o rap, R&B, soul e o pop me influenciam muito. O que sempre me hipnotizou em uma música foi a melodia vocal, então músicas que tem frases marcantes, melodias sentimentais acabam tomando conta do meu coração e eu tento trazer esse sentimento que sinto com músicas que me tocam nas nossas músicas.

Brunno: Disco, funk, R&B e rock n’ roll. Cresci, assim como o Gabriel, ouvindo muito rock n’ roll e só recentemente passei a me conectar com diferentes estilos, então ainda estou vivendo muitas descobertas que pessoas ao meu redor já viveram. Acredito que esse contato profundo com diferentes estilos é um ponto positivo na criação das nossas músicas. Recentemente tenho ouvido muito Hip Hop, e isso tem me inspirado bastante, principalmente quando estou trabalhando em algum beat.

Qual sentimento você teve enquanto produzia?

Gabriel: Eu tive a sensação de estar perdido, pois foi basicamente o primeiro projeto “novo” de estar trabalhando nesse formato a distância com a pandemia, então muitas vezes estava desmotivado de estar longe e não me sentir realmente interligado ao todo do projeto, mas logo após gravar e ver o resultado era algo novo, parecia que uma onda quebrava em mim, me revigorando e me deixando novo, criativo e animado para novos desafios e novas ideias.

Brunno: Eu não tinha nenhuma direção e nenhum plano quando comecei a trabalhar no disco, então por um longo tempo o sentimento maior era de descoberta e de curiosidade de explorar as músicas que estava criando e entender onde elas poderiam me levar. Aos poucos, quando tudo começou a tomar forma, passei a sentir mais a pressão de ser criativo e de ‘fazer com que as músicas funcionassem juntas’ e fizessem sentido no disco. Sempre pensei em como seria quando tudo estivesse pronto e se o projeto realmente seria lançado para outras pessoas. Acredito que, assim como o processo foi natural, a decisão de lançar as músicas e realmente trabalhar o Distant Topic também foi.

5 discos que influenciaram UNSOLICITED

Gabriel:

Gorillaz – Gorillaz

Teen Suicide – i will be my own hell because there’s a devil inside my body

Låpsley – Through Water

Grimes – Vision

Tuyo – Pra Curar

Brunno:

Tame Impala – Currents

John Frusciante – Shadows Collide With People

Metronomy – The English Riviera

Tyler, The Creator – IGOR

The Beatles – The Beatles

“Olvidame”

Gabriel: “Olvidame” foi a primeira música que tentei produzir um pouco mais sozinho, na questão dos synths e beats. Nunca havia feito algo parecido e quando comecei a pesquisar os synths e testar pensei em criar algo como um intro, uma imersão no álbum, transmitir a sensação que eu sinto de estar sozinho, esquecido, na paz comigo mesmo, ao ouvinte e acredito que cada melodia e o synth que o Brunno trouxe para adicionar nessa música foi perfeito, encaixou perfeitamente.

Brunno: A minha perspectiva da produção dessa track é muito simples. O Gabriel é extremamente talentoso e criativo, o que lançamos não é muito diferente da primeira demo que ele me mandou. Lembro que adicionei alguns synths entre as partes para preencher melodicamente alguns pontos e foi isso. Eu amo os timbres e o beat do verso.

“I thought you would like it, but you didn’t”

Gabriel: Essa música foi uma experiência um pouco mais difícil, pois eu queria identificar uma melodia que combinasse com o instrumental que o Brunno me apresentou e criasse a sensação na pessoa de estar se afogando em meus pensamentos, estar envolvido com a gente nas músicas e sentisse a sensação de estar à deriva no espaço que foi o que eu senti quando o Brunno me apresentou ao instrumental.

Brunno: A primeira versão dessa música era completamente diferente da que finalizamos. Inclusive, o Gabriel gravou as vozes com a melodia dessa primeira versão e eu simplesmente refiz toda a música, deixando apenas algumas partes e as vozes que ele havia gravado. Demorou alguns meses para essa ser finalizada por esse motivo. Eu estava muito insatisfeito com o resultado e decidi preservar apenas o que não me incomodava tanto e recomeçar todo o resto. Foi a primeira música em que decidi usar guitarra e baixo com mais destaque e isso me inspirou a fazer o mesmo em todas as outras faixas do disco.

“Countless Mistakes”

Gabriel: Foi uma das músicas mais gostosas de gravar, pois o resultado final foi totalmente diferente do que eu tinha escutado quando havia apenas o instrumental. Criar melodias que combinassem com os synths e criassem a atmosfera que ela tem hoje não foi algo planejado, mas foi muito bem-vindo.”

Brunno: Eu me lembro exatamente do momento em que o Gabriel me mandou a demo dos vocais para essa música e eu amei desde o primeiro segundo que ouvi. Geralmente, o processo criativo que guiou todo o disco se iniciava a partir das faixas instrumentais. Com a distância, não podíamos compor juntos e ficávamos enviando as músicas um para o outro com ideias e ajustes o tempo todo. Ainda não tivemos a experiência de compor juntos no mesmo espaço, então acredito que um possível sucessor de Unsolicited, será também uma experiência nova de um novo formato para o Distant Topic. “Countless Mistakes” foi a gravação mais complexa para mim naquele momento, porque minhas limitações técnicas como produtor ainda eram muito grandes e ter a demo dessa música me fez perceber que tínhamos potencial para dar um passo à frente e mergulhar na criação de algo maior e mais complexo em termos de composição, estrutura e melodia. Ainda me espanto em ter conseguido fazer essa música no começo do nosso projeto, e acredito que é a composição que define o nosso estilo no momento. Para gravar essa música, eu usei apenas plug-ins gratuitos do próprio Ableton e minha guitarra com alguns pedais de efeito. Gravei essa música durante as primeiras semanas da pandemia e, apesar das dificuldades de estar fazendo algo pela primeira vez e da distância, essa música me inspirou e me motivou a pensar que poderíamos levar o projeto para mais longe.

“What Are You Doing?”

 Gabriel: Essa, como eu havia comentado, é a minha preferida do álbum pois foi nela que consegui sentir o feeling real de nossas músicas, então regravar os vocais, ajustando as melodias, foi muito importante para a experiência do álbum.

Brunno: Gravei o baixo e alguns dos beats dessa música no meu celular e essas gravações são as que usamos na mixagem final. Lembro que queria algo que dividisse o último refrão da parte final, mas não queria uma ponte convencional. Lembrei de ter alguns voice memos no meu celular e encontrei esse no qual estava gravando o som do farol do carro ligado com a porta aberta, em seguida meu padrasto entrou conversando comigo e achei muito interessante a forma como isso se encaixou perfeitamente no que eu havia imaginado. O processo de finalização da mixagem do disco, feito com o querido Zopelar, foi essencial para essa faixa. Regravamos todos os vocais e demos uma atenção especial para os elementos e, principalmente, os sintetizadores que compõem a faixa. Tem muita coisa acontecendo ao mesmo tempo e colocar tudo no devido lugar foi um desafio.

“Friends Room”

Gabriel: Eu queria criar algo mais analógico, ter instrumentos de cordas mais em evidência, como guitarras, pianos marcando bastante as melodias, então foi bem bacana para composição do álbum também, ter uma diferenciada.

Brunno: Essa música é a cara do Gabriel, eu gostei da primeira vez que ouvi, mas sempre pensei que os beats poderiam soar mais melancólicos. A primeira versão que ele me mandou tinha beats rápidos e animados, mas eu sabia que seria interessante baixar o BPM nessa música. Eu gosto do protagonismo da guitarra nessa música, diferente das outras. Queria adicionar algo legal no meio, que fosse diferente e que soasse inesperado. Quando encontrei esse plug-in que imitava um Mellotron, fiquei muito tentado a experimentar e fazer funcionar nessa música. No final, gostei muito do resultado e acho que adicionou o charme que eu pretendia para contribuir com as ideias do Gabriel.

“No, sun”

Gabriel: São faixas de interlude para a criação dessa atmosfera, então foi mais uma liberação de criatividade de nós dois, no, sun foi uma liberação minha, sentir o synth bass balançando minha mente feels natural com sua leveza me sentindo livre, acho que são mais do essenciais para o álbum.

Brunno: Foi bastante complicado mixar essa faixa. O Gabriel me mandou a ideia praticamente finalizada e os vocais distorcidos foram muito complexos de fazer encaixar como eu imaginava. A ajuda do Zopelar nesse processo foi essencial e fez com que a música chegasse ao nível que queríamos para que ela funcionasse como o interlude que pretendíamos.”

“Feels Natural”

Brunno: Comecei a tocar o riff da base dessa música na guitarra despretensiosamente, mas gostei muito de como soou. Gravei a ideia e quando tinha a primeira versão dos acordes que compõem Feels Natural eu deixei tocando em loop por algum tempo. Isso me inspirou a criar todas as outras partes e as camadas dessa música. Compus tudo em cima do mesmo loop e depois distribui ao longo da estrutura da faixa. Então, basicamente, é um loop que eu desenvolvi em outras partes e adicionei alguns detalhes quando cheguei a uma estrutura que me agradou. A guitarra que eu toco com o slide quase não soa como uma guitarra em alguns momentos, acho muito legal perceber como os timbres influenciam na percepção uns dos outros. Essa música combinou muito com as outras do disco, principalmente por esse motivo, adoro os timbres dos sintetizadores. 

“Solid Love”

Gabriel: “Solid Love “foi uma experiência essencial para mim, pois é uma música mais alegre e eu sempre criei mais músicas melancólicas, foi importante para mim desbravar um novo horizonte.

Brunno: Essa foi a última que fizemos para o disco. Inclusive, quando a fiz achava que Unsolicited estava pronto e finalizado. Comecei a gravar o synth bass que abre a faixa e o restante aconteceu naturalmente em um dia. Finalizei a estrutura da música e a mantive até o fim. Alguns dias depois, compus o riff de guitarra e não sabia onde poderia encaixá-lo até que tive a ideia de tentar combiná-lo com “Solid Love”. Quando coloquei os dois juntos, senti que a música estava completa e soando exatamente como havia imaginado, o que me fez considerar adicioná-la ao disco. Uma coisa interessante a respeito dessa faixa é que eu a compus na mesma casa em que compus “Countless Mistakes”, quase um ano depois. Quando mandei a demo para o Gabriel, fiquei ansioso para ouvir o que ele faria, sabia que essa melodia seria um desafio para ele e tinha certeza que ele me surpreenderia, assim como me surpreendeu. Quando ouvi pela primeira vez a ideia que ele teve, eu tive a certeza de que essa música entraria no disco.

 “Ziziphus”

 Gabriel: Segunda música preferida do disco, ela me leva para outros lugares, e poder escutar e sentir a sensação de estar em uma estrada a 1000km/h é a melhor sensação, e todo crédito disso fica com o Brunno.

Brunno: Essa é a única música de Unsolicited que eu compus sem o Gabriel. Claro, a opinião e a ajuda dele ao longo da mixagem foi essencial para que Ziziphus chegasse ao nível que queríamos, com certeza. Quando compus “Ziziphus” estava ouvindo muito o trabalho do Kyle Dixon e do Michael Stein, que tocam em uma banda chamada S U R V I V E, e que também são os responsáveis pela trilha sonora original de Stranger Things. Sempre fui fascinado pelos sintetizadores e pelas melodias dessas composições, e acho que “Ziziphus” mostra um pouco dessa influência. Eu compus um synth de cada vez do começo ao fim e, quando eu cheguei à base da estrutura da música, passei a trabalhar nos detalhes individualmente também. Acho que essa foi a única música em que as coisas não aconteceram ao mesmo tempo ao longo do processo criativo. Gravei o som do coração na metade da track com um elástico esticado e com a ajuda da minha namorada. Fiz “Ziziphus” para ela e é minha música preferida do disco.

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