Entrevista – Arthur Matos

Cantor e compositor de Aracaju lança seu segundo trabalho solo, “Pacífico Atlântico”, cheio de influências de clássicos do Folk e conta um pouco de sua trajetória

Loading

Quando os primeiros acordes de Pacífico Atlântico se fazem ouvir, a idéia que nos vem à cabeça é que estamos diante de algum cantor americano, da mesma linhagem de Elliott Smith. O som é denso, melancólico, flutua no ar e nos remete a reminiscências meio sem foco. Algo como se a música que sai das caixas de som fosse capaz de ativar o reservatório de nostalgia pura e simples, que todos levamos nessa vida. Assim é a música de Arthur Matos, natural de Aracaju, Sergipe, que participou da banda Nantes e, desde 2011 está em carreira solo. Pacífico Atlântico é seu segundo disco e, por causa da beleza de suas canções, fomos ver quem era esse sujeito tão talentoso. Com vocês, Arthur Matos.

Monkeybuzz: A sonoridade de Pacífico Atlântico aponta para uma espécie de melancolia urbana, muito comum desde os anos 90, a partir da obra de gente como Elliott Smith. Como é sentir isso em Aracaju, Sergipe?

Arthur Matos: Aracaju é uma cidade extremamente propícia a este tipo de melancolia que você menciona. A cidade tem um clima de calmaria muito presente, por ser uma cidade pequena com belas paisagens e praias muito legais o que sempre tem renovado meu espírito por aqui. Porém ao mesmo tempo a cidade possui uma limitação que é natural da região, afinal estamos no menor estado do Brasil e no departamento das artes (música, teatro, literatura) enfrentamos muitas dificuldades, desde espaços para podermos apresentar nossos trabalhos e público (este que é muito pequeno e não sustenta as empreitadas propostas pelos artistas), são dois exemplos básicos do que se passa por aqui. Aliado a estes percalços Aracaju funciona muito bem para as composições que tenho feito até então, definitivamente a vibrações deste lugar influenciam no meu modo de compor, aliado com as coisas que venho escutando, algumas de muito tempo e outras descobertas recentemente. Pacífico Atlântico sofre grande influência desta cidade tão charmosa que é Aracaju.

Arthur Matos – Estação

Mb: Existe uma cena de compositores, cantores e bandas na sua cidade?

Arthur: Existe sim! Temos compositores e artistas extremamente talentosos por aqui, desde que eu nem sonhava em nascer, muita gente boa mesmo, mas posso falar com mais propriedade da minha geração, bandas como Snooze, The Baggios, Plástico Lunar, que são bandas que particularmente sempre me agradaram mais. Mas aqui existe um celeiro de grandes artistas, cada um na sua diversidade e criatividade.

Mb: Fala um pouco da sua carreira, na Nantes e depois solo.

Arthur: A Nantes foi um projeto que criei junto com grandes amigos meus em 2007 e durou até 2011. Considero a Nantes como meu primeiro projeto bem sucedido, foi onde eu aprendi a compor, fazer arranjos, explorar ideias e trabalhar em grupo. A proposta da banda era bastante ousada e foi um desafio muito grande para todos nós. Tínhamos um foco no Pop Psicodélico de 67 ou Baroque Pop se preferir, com influencia de bandas que usavam harmonias vocais com maestria, como os Beach Boys, Mamas and the Papas, The Turtles, The Byrds, The Zombies, alinhadas ao som acústico do Laurel Canyon de artistas como Crosby Stills and Nash, Neil Young, Joni Mitchell. Os arranjos eram sempre pomposos e adorávamos inserir diversos elementos pouco usados na música pop, Mellotron, Cravo, Vibraphone, celesta, e um monte de coisa maluca.

Lançamos além de um EP em 2008, um disco no final de 2010 intitulado Alvorada, disco esse que tenho bastante orgulho e volta e meio me pego escutando o mesmo por aqui. Após o lançamento de Alvorada, algumas dificuldades foram surgindo no grupo, devido as perspectivas e a força que cada um estava disposto a inserir na banda, e chegamos num momento em que vimos que não daria para continuar com a banda de uma forma digna para ela mesma. Foi aí que me vi atolado de novas composições que já vinha há algum tempo trabalhando, mas não tinha como inseri-las na Nantes, pela falta de disponibilidade da mesma.

Resolvi então me jogar com o meu próprio nome e ver no que dava. Como eu era o compositor da Nantes e junto com os outros rapazes aprendi bastante a trabalhar na estrutura de canções e etc, respirei fundo e me joguei. Em um mês, Seu Lugar, meu primeiro disco, estava pronto. Recrutei Fabrício Rossini (Produtor, Multi-instrumentista e guitarrista da Nantes) e formamos uma parceria, eu chegava com as ideias e trabalho! Desde então Fabrício tem sido meu braço direito neste projeto solo e alguns meses depois de ter gravado Seu Lugar, entrávamos em estúdio novamente para colher Pacífico Atlântico.

Arthur Matos – Duas Cidades

Mb: Conta como foi participar de uma turnê nos Estados Unidos com a banda Rosie And Me. Como isso aconteceu? Há perspectivas de voltar?

Arthur: Foi a maior e mais gratificante experiência que já tive em toda a minha vida. Em uma tarde monótona, deitado na minha cama, recebo uma ligação da Rosanne Machado (Compositora, arranjadora, produtora, desenhista, canta, toca, enfim, faz tudo) que conheci, junto com os meninos da banda em 2010 aqui em Aracaju. Quem conhece a Rosanne sabe que ela não é de ligar e dificilmente lhe dá bola na Internet, então achei bastante estranho e de imediato atendi.

Então ela me conta que a banda havia recebido o convite para ir tocar no SXSW 2012 e além do festival a possibilidade de fazer uma turnê legal pelos EUA, porém o violonista da época não poderia ir na viagem pois acabara de ingressar num bom emprego. Assim ela me fez o convite de integrar a banda durante a turnê americana deles. Isso foi em Setembro de 2011.

Em Janeiro de 2012 fui passar uma temporada em Curitiba ensaiando com o Rosie and Me, onde fui extremamente bem acolhido pela família Machado e em março embarcamos em uma tour que passou por várias cidades da California e do Texas respectivamente. Além do SXSW, pisamos em palcos importantes no território americano, como o Hotel Cafe em Los Angeles, e o Zooeys Cafe em Ventura, ambos berço de compositores e bandas extremamente talentosas como o The Milk Carton Kids, Harper Blynn, Rachel Yamagaha, Cary Brothers, Joshua Radin e muitos outros. Além de ser o lar de alguns artistas do Mainstream no início de suas carreiras, como John Mayer, Adele. A turnê foi extremamente bem sucedida e para mim apesar de não ter sido com o meu trabalho depositei todas as minhas energias no projeto e ficava extremamente feliz com a resposta das pessoas nos lugares em que passamos.

Infelizmente, o Rosie and Me chegou ao seu fim no final de 2012, mas acredito que em breve vem coisa boa da Rosanne por aí. Este ano irei me inscrever no SXSW para ver o que acontece, seria muito bom poder voltar e viver novas experiências. Toda essa experiência foi a responsável pelo nascimento de Pacífico Atlântico, a idéia das canções nasceram basicamente no período em que estávamos em Los Angeles e quando voltamos para o Brasil organizei os pensamentos e sentimentos vivenciados por lá.

Mb: Quais as suas maiores influências como cantor e como compositor?

Arthur: Boa pergunta, pois gosto de falar sempre de quem me influenciou e ainda influencia. Os Beach Boys são eternamente meu grupo favorito (obrigado aos Beatles por me fazer chegar até eles), Brian Wilson é meu herói definitivo e me influenciou até não poder mais; Carl e Dennis com suas vozes e belas composições; Bruce Johnston com Disney Girls; Al jardine com All this is That; e até Mike Love cantando All I Wanna do do belíssimo fiasco Sunflower. Toda música que escrevo eu penso na doçura e verdade que esses caras passavam através das suas vozes e arranjos.

Além deles Judee Sill, Beatles Paul Simon e Art Garfunkel, Nick Drake, The Zombies, Neil Young, Graham Nash, Allan Clark, Four Freshmen, David Crosby, Stephen Stills, Roger McGuinn, John Sebastian, Mamas Cass Elliot, John Philips, Denny Dorety, Chris Hillman, Gram Parsons, Levon Helm, Richard Manuel, Robbie Robertson, Rick Danko, Bob Dylan, The Who, The Turtles, Buffalo Springfield, Jimmy Weeb, Glen Campbell, Jackson Browne, Joni Mitchell, Vashti Bunyan, Sibylle Baier, Elton John, Johnny Cash, Saggitarius, Carole King, James Taylor, Badfinger, Harry Nilsson, Fleetwood Mac.

Há também alguns artistas mais contemporâneos que sempre escuto e me influenciam bastante: Fleet Foxes, J. Tillman, Father Jonh Misty, R.E.M., Wilco, The Milk Carton Kids, The Wondermints, The Now People, Nelson Bragg, Bryan John Appleby, City and Colour, Dawes, Great Lake Swimmers, My Name is You, Joey Ryan, Ryan Adams, Laura Veirs, Kings of Convenience, Neil Halstead, Sean Lennon, The Shins, Sleeping at Last, Tha Staves, Travis, Venus in Flames, The Wilderness of Manitoba e por ai vai.

Mb: Canções como Fotografia e Uma Vez Você são bem nostálgicas e tristes. Do que você sente saudade?

Arthur: Não sei te responder com tanta certeza. O que posso lhe dizer é que sempre que escrevo uma canção, até agora, nunca foi para uma determinada pessoa, lugar ou situação, é sempre um lance mais espiritual que real sabe? Sou péssimo para explicar minhas canções, e muita vezes me pego pensando o que eu queria dizer com esta ou aquela música. Gosto bastante dos pensamentos diferentes que cada pessoa que comenta comigo sobre minhas canções tem, acho interessante essa fórmula em aberto que elas possuem, partindo da minha perspectiva.

Arthur Matos – Fotografia

Mb: Pacífico Atlântico é um disco totalmente independente. Quais os planos para ele chegar numa audiência maior? Isso importa muito?

Arthur: Na verdade nunca tive muita pretensão de estar num patamar maior da cena musical brasileira. Obviamente sempre almejamos que o nosso trabalho renda bons frutos, sejam eles duradouros ou não, sejam eles simples ou mais pomposos, mas sempre tive consciência que a música que faço é difícil de ser digerida com facilidade, a maioria pessoas tem medo da melancolia, de letra triste, enigmática, eles preferem cair por um “esquema” mais fácil de entender, da célula rítmica pulsante e dançante.

O som que faço é reflexo de um tempo onde as pessoas vivenciavam totalmente aquilo que escreviam eles precisavam expressar aquilo de qualquer maneira, por mais que doesse, ou até que fosse extremamente feliz, então eu já sou muito realizado em estar escrevendo e cantando algo que eu acredito e que creio eu pode ajudar a acolher e que de certa forma a pessoa se veja naquele retrato exposto em forma de música. Ainda tenho muita estrada pela frente e espero que mais pessoas possam conhecer meu trabalho, sempre aos poucos tentado com os recursos que tenho, espalhar o som por ai.

Mb: Quais os seus dez discos para levar para uma ilha deserta?
Arthur: The Beach Boys – Pet Sounds The Beach Boys – Sunflower Judee Sill – Judee Sill Judee Sill – Heart Food Simon and Garfunkel – Bridge Over Troubled Water The Zombies – Oddesey and Oracle Crosby Stills Nash and Young – Deja Vu Nick Drake – Pink Moon R.E.M. – Reveal The Beatles – The White Album

Mb: Você lançou seu primeiro disco solo, No Seu Lugar, há pouco mais de um ano. O que mudou desde então?

Arthur: Creio que a diferença entre Seu Lugar e Pacífico Atlântico está na acessibilidade. Pacífico Atlântico possui uma dinâmica mais leve que Seu Lugar, as letras de certa forma são mais otimistas, os arranjos e a sonoridade estão mais coesos. Seu Lugar foi gravado de forma muito rápida e no final não sabia como iria ficar o produto final. Já Pacífico Atlântico teve um processo mais demorado e toda a sonoridade por traz dele foi pensada.

Mb: O que você acha da música Pop produzida no país e no mundo atualmente?

Arthur: No geral, acho um saco. Muita coisa plástica e achando que temos cara de trouxa sabe? Fico de cara como tanta gente consegue gostar de umas coisas totalmente sem um conteúdo decente, influenciados por um som que é somente ritmo, “feito para dançar”, acaba que melodia, arranjo, cada vez mais perde espaço para uma sonoridade que acho medíocre. Questão de gosto. Mas sempre tem umas coisas animadoras por aí. Do Brasil, cito o Transmissor, banda mineira, provavelmente a melhor que ouvi do Brasil em muito tempo. De fora tem o Milk Carton Kids, um Folk duo de Los Angeles simplesmente sensacional.

Mb: Todas as suas letras são em (bom) português. Você não faz parte do time que pensa que Rock e e Folk têm que ser cantados em inglês?

Arthur: Na verdade o fato de escrever em português foi uma coisa natural. Apesar de 99% das coisas que eu escuto sejam cantadas na língua inglesa, desde que comecei a compor já escrevia em português. O Inglês realmente tem uma sonoridade bastante propícia para esse estilo que faço, mas creio que consegui achar uma identidade bacana cantando em português. Porém meu próximo lançamento será em inglês. É um projeto que venho pensando desde as gravações de Pacífico Atlântico, gravar um material em inglês, material este que está composto, estou trabalhando nas letras neste momento e pretendo lançar algo ainda este ano.

Loading

ARTISTA: Arthur Matos
MARCADORES: Entrevista

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.