Entrevista: Boogarins

Banda se apresentará hoje (24) em São Paulo no “Monkeybuzz no Breve”

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Além de comentar faixa a faixa o lançamento de seu terceiro álbum, Lá Vem a Morte, o grupo goiano Boogarins ainda bateu um papo com o Monkeybuzz durante seu último dia de estadia em Portugal, país em que a banda encerrou sua turnê europeia antes de voltar ao Brasil para uma série de shows – que inclui uma apresentação hoje (24) no Monkeybuzz no Breve.

Benke Ferraz, Raphael Vaz e Dinho Almeida conversaram com a gente sobre o novo álbum, literatura e shows fora do Brasil.

Monkeybuzz: Sinto que o primeiro disco tinha referências mais internas ao grupo (como livros e filmes) e o segundo foi mais ligado aos dois anos que vocês passaram em turnê. Qual a diferença entre esses dois primeiros álbuns e Lá Vem A Morte?

Benke: O primeiro foi mais centrado na experiência de estar fazendo pela primeira vez; o segundo, Manual, já foi mais ligado a gravação de músicas que começaram a tomar forma em processo de turnê, mas que ainda remetem à momentos do As Plantas Que Curam. Já esse, é o primeiro disco que todas as músicas surgiram depois da nossa primeira turnê gringa, em 2014. Esse é o primeiro álbum totalmente do Boogarins e não tem nada das coisas que a gente estava fazendo antes. Mas, ao mesmo tempo, esses dois primeiros discos tem tudo a ver com o Lá Vem A Morte, sendo que algumas faixas tem o clima do As Plantas, gravadas e arranjadas em frente ao computador, enquanto outras, como Corredor Polonês, a gente tocou à exaustão ao vivo e as partes delas foram sendo criadas ali, às vezes um solo, às vezes um efeito no baixo. Ele é meio que reunião dos dois discos e do que eles causaram na gente.

Mb: Este terceiro disco me parece mais próximo aos shows, com as jams alongadas e com espaços maiores para experimentação, do que os outros dois discos. Ele foi criado dessa maneira?

Benke: Engraçado isso. Pra mim, ele é tão distante do ao vivo quanto o As Plantas. Talvez seja pela continuidade dele, dessa coisa de ser uma faixa emendada na outra e nos nossos shows a gente deixe alguns barulhos rolando entre as músicas, que cause essa impressão.

Dinho: Ele tem a ver com o show porque ele é mais “fritura”, mas talvez seja um dos discos mais difíceis de tocar ao vivo.

Mb: Em nossa resenha de Lá Vem A Morte, surgem escritores como Franz Kafka e Aldous Huxley para tentar ajudar na compreensão da obra. Qual a conexão da sua música com a literatura?

Dinho: Acho engraçada essa pergunta. Porque acho que, quando você lê um livro, ele dura em você por muito mais tempo que um, dois ou três anos. Estamos em um processo de cinco anos de banda e Raphael lê muita coisa, o Benke também, eu li muita coisa e acho que hoje em dia ninguém pode se dizer influenciado só por literatura ou dizer que aquela ideia veio daquele livro. Do jeito que a gente trabalha a associação de ideias, se eu for te dizer como a música do Boogarins está ligada somente a literatura eu ia ficar falando um monte de baboseira. Então, se for pra falar em como a nossa música se desenvolveu a partir do primeiro disco até agora, prefiro dizer que ela está associada com mais coisas. Pra mim, é mais profundo e vale muito mais a pena, você ouvir aquilo e ver o tanto de associações que pode ter, seja de literatura, artes visuais ou sonora. Pra mim é legal ver Huxley citado, porque eu leio bastante e acho genial a forma como ele trabalha a relação humana, mas eu me sinto meio bobo falando isso, porque quero que quem ouça possa identificar ali mais uns cinco autores que goste e que de alguma maneira consiga fazer uma conexão com nossa música. Que de alguma forma ele consiga desmanchar essa ideia de associação, que normalmente é tão direta.

Mb: Falando nisso, li um texto já antigo sobre vocês em que em que o redator dizia não entender suas músicas e pedia pra você explicarem. Na última delas, vocês dizem que preferem deixar as letras abertas à interpretação do ouvinte. Essa liberdade com as letras continua ainda hoje?

Raphael: Eu vi hoje um vídeo de um cara resenhando o Lá Vem A Morte no YouTube, ele fala super bem, fala que é nosso melhor disco, que tem um conceito magnífico por trás e que as músicas se entrelaçam muito bem, mas também fala que se a gente queria apresentar um conceito tão grande, deveríamos ter apresentado ele melhor. Não sei, acho que está tudo tudo lá, são músicas pequenas, de três ou quatro frases, mas que ganham um significado maior do jeito que elas apresentadas com a gente tocando.

Benke: O fato de darmos o nome de um disco em cima de uma música não quer dizer que a gente tenha que dissecar aquele tema. Lógico que sabemos que tem gente que vai escutar isso de forma solta, tem gente que vai escutar como um álbum e viajar nisso, e acho que é pra isso que a gente faz música, pras pessoa ter bons momentos escutando, bons insights, bons sentimentos. Depois que a gente pega um produto finalizado e gosta dele, que paramos para pensar em como vai se chamar, qual vai ser a ordem e como vai ser o videoclipe. Ai sim é legal dar uma liga nisso tudo.

Mb: O processo de composição de vocês então é mais solto, do que algo conceitual?

Benke: O fato de ser tão solto e dar certo para mim é muito conceitual, na verdade.

Raphael: O conceito a gente sempre colocou depois, nunca foi um ponto de partida.

Mb: Qual a principal diferença em fazer turnês fora do país? Em questão de infraestrutura desses shows, qual a diferença em relação ao Brasil?

Benke: Toda a diferença. No Brasil é muito difícil de fazer turnês. Bandas bem sucedidas na cena independente fazem, sei lá, uns oito shows no mês. Se uma banda de médio porte quer fazer uma turnê igual nos EUA, com 25 datas, não vai se apresentar todo dia para 400 ou 500 pessoas. Você tem que se apresentar em cidades menores que às vezes não tem estrutura – e às vezes nem uma cidade grande tem essa estrutura, nem mesmo as capitais às vezes têm. As estradas são muito ruins, o que também impossibilita fazer um planejamento de turnê apropriado. A questão é que tudo é muito caro, por exemplo, ter que alugar uma van e levar seu próprio equipamento. Então, o que acontece muito no Brasil é você voar para os lugares e se der certo tenta amarrar um show ou outro, todos com um backline diferente e nunca com a mesma bateria. Isso é uma lógica totalmente diferente da turnê. Mas isso não quer dizer que só tem pontos positivos em fazer show fora do Brasil e pontos negativos em fazer show por aqui. São coisas bem diferentes e estamos bem habituados as duas.

Mb: E estar tocando com maior frequência também ajuda nos shows, não?

Benke: Lógico que quando você tá tocando mais vezes seguidas, fazendo cinco ou seis shows por semana, e tendo que dirigir só algumas poucas horas por dia ao invés de ter que pegar voo e despachar suas coisas, pode passar o som, gasta mais energia só na parte do tocar. Às vezes eu tenho a impressão de que os melhores shows que a gente faz são difíceis de acontecer no Brasil por causa disso, pela questão de não estar tocando a vários dias seguidos com os mesmos instrumentos sendo tocados e afinados todo dia do mesmo jeito

Mb: Uma coisa que eu acho engraçada no tratamento de vocês lá fora, principalmente pela imprensa, é colocar como principal influência a Tropicália, sendo que aqui a tendência é tentar comparar seu som com bandas mais atuais. Como vocês enxergam isso?

Rapahel: Olha, ainda bem que no Brasil não ficam que a gente é só Tropicália. Até porque acaba gerando uma discussão eterna sobre isso, sobre se a Tropicália acabou ou não, se durou 1 ou 40 anos, se está rolando até hoje? Existe Neo Tropicália? Mas pros gringos essa é a associação mais simples.

Benke: Acho que é mais pelo fato da música soar alegre para eles, bem humorada, em tom maior. Isso é um reducionismo, mas acho que eles não tem outra referência de música brasileira. A maior parte do pessoal lá fora só ouviu Os Mutantes, fora do Cansey De Ser Sexy e Sepultura, então, a referência do nosso som para eles vai ser Mutantes. Já o que se diz aqui também é plausível pra gente. As comparações com Tame Impala, por exemplo, vem porque é a grande banda do momento e a gente também surgiu de um jeito meio surpresa tocando um som psicodélico. Além disso, tinha Erre no primeiro disco, que tinha bastante flanger na guitarra e uma melodia com fuzz, mas acho que tem pouca música que parece de verdade. Ainda assim é a associação mais fácil, a mesma coisa com a lá fora.

Ingressos on-line já estão esgotados, porém haverá na porta do casa um número limitado de entradas

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ARTISTA: Boogarins
MARCADORES: Entrevista

Autor:

Apaixonado por música e entusiasta no mundo dos podcasts