Entrevista: Filipe C.

Conversamos com o músico paulistano sobre sua carreira e a estreia solo com “Silence”; veja fotos exclusivas

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Fotos: Todas as imagens são exclusivas do Monkeybuzz

Há poucas semanas, o paulistano Filipe C. nos surpreendeu com o lançamento de Silence, um disco sensível e muito bem construído sobre relacionamentos.

O músico, que trabalha com trilhas de publicidade, tem tido seu trabalho comparado a Badly Drawn Boy e Elliot Smith, dois nomes que ele tem ouvido recentemente (desde que as comparações surgiram) e com quem compartilha sonoridades ricas em canções que, por mais melancólicas, conseguem nos fazer sorrir.

Em uma tarde de inverno em São Paulo, nos encontramos com Filipe para conversar sobre o lançamento desse seu primeiro EP solo. Você pode conferir abaixo como foi o bate-papo e ver mais fotos exclusivas em nossa página do Facebook.

Filipe C.

Monkeybuzz: Como as experiências que você teve com as bandas em que tocou contribuíram para seu trabalho solo? Filipe C.: Eu estava pensando um dia desses que com as bandas eu aprendi muito sobre gravação, sobre produção, pré, mixagem… aprendi muito. Na Venus Volts, eu tive muito contato com show grande, a gente tocou na Virada Cultural no interior logo antes da Pitty para 18 mil pessoas. Então, esse tipo de experiência te deixa: “Pô, agora, o que vier eu tô tranquilo”, sabe? (risos) Foram coisas que eu nem percebi que estava adquirindo, mas acabaram me formando para eu lançar este trabalho. Mas, na hora de fazer o EP, eu não parei e pensei “vou lançar”. Eu fui compondo, tendo umas ideias, e então, desde outubro ou novembro do ano passado até abril desse ano, eu gravei, produzi e mixei. Quando olhei de fora, pensei “putz, tem um negócio bem legal aí que dá pra fazer um disco”. Daí foi isso, uma coisa que nasceu totalmente orgânica, não teve nenhum planejamento, um “vou parar e gravar um EP”.

Mb: Então ele tem músicas que refletem mais um momento de sua vida do que um conceito específico? Filipe C.: Total. Foi engraçado, porque elas tem realmente essa ligação entre si, só que ela simplesmente aconteceu, porque são sobre um mesmo momento da minha vida, então tem tudo ali. Quem me conhece consegue identificar que eu estava passando, uma coisa muito louca, e acho que, talvez, por isso que seja tão sincero, porque como eu não planejei nada, não parei, só “saiu”, tem uma sinceridade direta, o que é um ponto positivo nas músicas. Quando eu parei, olhei de fora, falei “tem esse tema recorrente em todas”, aí eu comecei a pirar nisso e bolar alguma coisa, um discurso, “isso é aquilo, isso é ali”, colocar as coisas no seu lugar e saiu um projeto fechado. Mas eu não fiz só aquelas sete faixas, fiz umas 20. Então, teve uma pré-seleção.

Mb: E a sonoridade do disco é, também, mais orgânica ao invés de decisões que você tomou para o EP ficar com uma tal cara? Filipe C.: É difícil parar para pensar sobre uma coisa que você fez desse jeito, né? Foi realmente uma fase. Eu tenho um piano lá no quarto e a maioria das coisas foi gravada ali, em uma sala que eu tenho com meus equipamentos e tal. Foi muito tranquilo, eu tinha uma ideia, ia lá pra sala, voltava, não sei o quê, ficava testando até 3 horas da manhã – então é bem mais fácil, sabe? Mas não sei, acho que a sonoridade é realmente consequência de uma fase. Eu poderia ter usado mais sintetizadores, fazer mais eletrônico, porque tem umas coisas assim, mas poderia ter usado muito mais. Poderia ter colocado mais violão, mas por algum motivo não coloquei tanto violão, poderia ter colocado muito mais guitarra, que é o meu instrumento, mas preferi colocar mais piano, sabe? Não tem realmente algo tipo “ah, eu tava ouvindo isso, isso veio daqui”. Foi espontâneo, “essa música, vou colocar uma harpa, então beleza”, “ah, essa música eu vou encher de piano e cordas”, aí tem uma que não tem nada disso, só duas guitarras, baixo e bateria. Saiu assim.

Filipe C.

Filipe C.

Mb: Como é trabalhar sozinho e não com uma banda? Filipe C.: Cara, é uma coisa muito legal, porque você pode ficar umas duas horas em uma mesma linha de guitarra, enquanto em um ensaio você não tem esse tempo para fazer isso. Mesmo que seja na casa de alguém sem horário de estúdio, você não vai pedir pro cara falar: “Volta. Não, volta. Não, volta”, sabe? A banda inteira não vai querer ficar tocando uma mesma parte só para você fazer uma linha, então torna algo muito mais intuitivo ainda. Você ouve e achou legal, depois de três dias você muda um pouco, aí você fala “a bateria poderia fazer tal coisa nessa hora”, aí você vai e faz. Você tem, o tempo inteiro, a visão de fora da coisa, sabe? Pra mim, é o melhor jeito de trabalhar. Em banda, eu não sei trabalhar direito. Eles me passam uma base e eu fico em casa gravando (risos), que é o melhor jeito que eu descobri que consigo funcionar.

Mb: E você imagina como seu trabalho solo vai agregar ao seu trabalho nas bandas? Filipe C.: Eu acho que já agrega, é um processo de duas mãos o tempo inteiro. Com essas ideias, por exemplo, eu estou lá testando uns efeitos de guitarra, com dobra de piano, não sei o quê, aí a gente está tendo uma ideia em um ensaio e eu penso “vou usar aquilo lá”, e às vezes você está em um ensaio e alguém faz alguma coisa interessante e você pensa “legal, vou usar essa ideia lá” Acho que, por isso, se não tivesse as bandas, o EP teria saído uma coisa completamente diferente. Tem ainda a convivência com outros músicos, cada um no seu instrumento, o que me deixa com uma cabeça muito aberta. São três músicos: o baixista da Venus, o baixista da Finger e o baixista do Volantes, sabe? Então eu fui só aprendendo aquilo para utilizar depois.

Mb: Você é um cara daqueles muito conectados, muito atentos às novidades que aparecem pela Web? Filipe C.: Eu fico o tempo todo conectado, mas eu não fico buscando, sabe? Eu deixo as coisas virem, não sou um cara mega nóia que tem que ver tudo o que saiu. Aliás, acho que isso é um ponto positivo para não influenciar seu trabalho. Você começa a ficar tão noiado com o que as pessoas estão fazendo, de repente você quer colocar tudo aquilo na sua música e você tem só um “copia e cola” de outros trabalhos, não tem a sua personalidade. Você não consegue processar aquilo tudo, digerir. É muito louco, quando eu estava na fase de finalização, já tinha terminado as músicas, mas estava rearranjando algumas coisas, eu só ouvia o meu EP. Até escutava alguma coisa ou outra, mas sem atenção, tipo entrava no carro e ligava o rádio. Aí, se eu tinha alguma dúvida, tipo “como é que eu posso encaixar esse violão com essa bateria?”, eu pensava “tem uma música do Blur que é legal, vou fazer isso”, aí ia lá e ouvia, mas do mesmo jeito que faço na publicidade, indo atrás de uma referência.

Mb: Imagino que o que seu trabalho com a publicidade agrega à sua criação seja essa dinâmica de referências mesmo, não é? Filipe C.: É uma mistura das banda com a publicidade, sabe? Porque em publicidade é chato, eles te passam uma referência e querem que você cole com isso, mas você pode aprender muita coisa. Tem muito timbre que eu aprendi a tirar colando na referência do cara lá. Me passaram uma vez uma referência de Fela Kuti. “Como é que eu vou tirar Fela Kuti aqui, esse timbre de guitarra, essa bateria?”, mas daí você aprende a correr atrás e aprender isso, uma coisa que eu não faria sozinho, e isso é legal.

Filipe C.

Mb: Como foi a escolha de cantar em inglês? Filipe C.: Também foi algo natural. As bandas pelas quais passei, tirando Volantes, cantavam em inglês e eu sempre ouvi muita coisa em inglês, agora que eu tô começando a ouvir coisas em português, como João Gilberto e Chico Buarque. Isso vem dos meus pais, eles não paravam para ouvir música brasileira em casa. E estou pirando, quem sabe agora eu faço uma música em português? Comecei a sentir necessidade, depois que lancei o EP, não de necessariamente compor em português, mas de começar a testar, sabe? Escrever umas coisas, amadurecer mesmo essa ideia.

Mb: Sobre Silence, existe uma certa dicotomia no título, afinal, não é possível haver música e silêncio ao mesmo tempo. Filipe C.: Assim que eu fechei o nome, eu pensei “putz, talvez as pessoas possam esperar algo meio minimalista”, sabe? Mas é outro tipo de silêncio, que vem mais nas letras do que na música, aquela ideia de que existe um silêncio no começo e outro no fim de um relacionamento e esse é o ponto em comum entre os dois momentos. O amor é isso, você não consegue se expressar no começo, tem aquela insegurança de falar pra pessoa o que você sente, ou até de conseguir juntar tudo o que tá rolando e expressar aquilo. Ao final, você escolhe não falar, você meio que vê todos os problemas, sabe pra onde tudo está indo e fica quieto, deixa quieto. É aquele almoço em que ninguém fala nada, aquele filme em que ninguém faz nenhum tipo de comentário, é esse tipo de silêncio. Um tem muito a dizer e o outro já não tem mais nada. E é meio complexo tentar explicar isso (risos).

Mb: E você imagina que seu próximo trabalho nascerá a partir de um novo silêncio desses? Filipe C.: Cara, espero que não, espero que eu já tenha abordado esse tema o suficiente. Mas não tenho nem ideia do que vai acontecer, acabei de lançar esse.

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ARTISTA: Filipe C.
MARCADORES: Entrevista

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.