Keaton Henson: Gênio Frágil

Enquanto encanta diversos ouvintes ao redor do globo com sua melancolia, o músico britânico fica famoso também por não dar entrevistas e quase não fazer shows

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Se é na intimidade que mostramos quem realmente somos, é quando estão sozinhos que os músicos mais revelam seu potencial. Não me refiro a carreiras solo ou algo do tipo, mas a algum tipo de isolamento ou confinamento que contribui tão positivamente na obra dos artistas. Por mais que a realidade agitada, populosa e barulhenta ocupe a mente, é no silêncio de si próprio que as melhores ideias tomam forma.

Esse conceito parece se aplicar ao britânico Keaton Henson, um “bicho do mato” criado, crescido e residente em Londres. Como a descrição em seu próprio site diz, ele “passa seu tempo sozinho escrevendo músicas e, às vezes, desenhando” e esclarece que “ele não gosta de falar sobre si mesmo”. Sua figura magra, alta e cabeluda, sempre usando trajes mais formais do que a maioria dos jovens de 24 anos, é tímida e arisca por si só, mas o mesmo não pode ser dito sobre sua música.

Keaton ficou conhecido por um som Folk com alma de Rock, frequentemente apenas na combinação voz e guitarra elétrica. Ele costuma cantar baixinho, sussurrado e choroso, com uma interpretação orgânica e melancólica – o que não poderia ser feito de outra forma, já que suas canções costumam ser tão confessionais que mais cartas repletas dos mais dolorosos desabafos.

Um tanto silencioso e demasiadamente triste, Dear é seu álbum de estreia, lançado internacionalmente no início de 2012. Ele veio acompanhado de diversos vídeos, como o da faixa acima, Charon e Small Hands (um dos melhores clipes do ano), que ajudaram a propagar sua música pela Web para que pessoas de seu país e outros pudessem encontrar sua arte e se identificar com ela.

E esse é um fator importante para entender sua obra. A música de Henson não é atraente só por sua beleza, mas porque passa facilmente uma qualidade muito humana, como se ela carregasse sempre uma dose de pessoalidade que não se encontra sempre por aí. É mais ou menos o que aconteceu com o carioca Cícero e seu Canções de Apartamento, no qual o confinamento entre as quatro paredes de casa fizeram com que o músico encontrasse e externalizasse sua condição mais honesta, seguido da mesma forma que o público achou sua música e nela se encontrou.

Mas o isolamento de Keaton é outro. Um certo grau de fobia social faz com que ele se prenda em casa e evite contato com as massas, a não ser pela sua arte. Com pânico de palco, não foi fácil convencê-lo a subir aos palcos pela primeira vez – o que aconteceu em novembro passado com vendagens esgotadas em uma hora para a primeira noite em apenas sete minutos para a apresentação seguinte.

Antes disso, o músico já chamava a atenção de muita gente também do outro lado do Atlântico – caso do produtor Joe Chicarelli (que já trabalhou com The White Stripes, The Strokes e The Shins, entre tantos). Ele se ofereceu para comandar o próximo trabalho de músico, de olho em sua dramaticidade e no grande valor de suas composições. Isso implicou em outra fobia ser confrontada, além do medo do público: Vor de avião.

Keaton venceu o medo e foi a Los Angeles para gravar o que se tornou Birthdays, disco que será lançado em fevereiro. Em solo americano, o músico fez amizade com músicos de diversas bandas, como Pearl Jam, Band of Horses e The Raveonettes, o que rendeu diversas participações no álbum e uma nova perspectiva na hora de trabalhar as novas músicas, como ficou claro com a faixa Kronos, lançada já em setembro.

Quem ouviu Dear poderá se surpreender com o novo som, mas não necessariamente estranhar, já que o que Chicarelli fez foi canalizar a energia para ser liberada em outra forma, mas com a mesma intensidade de antes. Isso faz mais sentido ainda para quem acompanha de perto a mente inquieta de bons artistas e sabe que a limitação a um só formato que é um confinamento prejudicial à criatividade, não o isolamento humano.

Com livros de desenhos já lançados, uma exposição em Londres (que começa no fim desta semana), uma pequena turnê por seis cidades da Grã-Bretanha e o segundo álbum prestes a sair, Keaton Henson segue como um personagem intrigante. Esse caráter de artista genial e, ao mesmo tempo, garoto frágil acaba conferindo um atrativo a mais à sua música, que ajuda por sua vez o público a superar experiências traumáticas e medos, como os que o artista tem do palco, avião ou da câmera, em um misto de identificação e fascínio.

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ARTISTA: Keaton Henson

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.