Letrux: “Sou muito aberta a me emocionar”

Leticia Novaes comemora sucesso de “Letrux em Noite de Climão” também nos palcos

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Fotos: Ana Alexandrino

Não é de hoje que conhecemos Letícia Novaes, visto que sua finada banda Letuce foi um dos maiores destaques da cena autoral do Rio de Janeiro há alguns anos. Ainda assim, é certo afirmar que foi sob o nome Letrux que ela cruzou de vez os limites da cidade, estado e região sudeste de vez ao se tornar um dos mais celebrados projetos do país como um todo com seu Letrux em Noite de Climão. Na semana em que se apresenta em São Paulo no Festival XXXBórnival, a cantora e compositora conversou ao Monkeybuzz por telefone sobre as novas dimensões de sua carreira.

“É muito louco, né? Isso envolve tanta coisa, envolve um fator de mistério”, comenta ela, “mas também envolve o fator de que eu tomei as rédeas. Porque no Letuce eu dividia criação, produção e todas as ideias com o Lucas [Vasconcellos]. Agora, eu segui meu instinto, fiz letras que eu queria. Acho que é o famoso ‘hora certa’, são tantas nuances. É uma mistura um pouco de tudo”.

A tal da “hora certa” tem a ver também com o momento em que os ouvintes de todo o país se encontram, muito abertos à respostas para a desesperança tão presente por aqui ultimamente. “O momento do país é climático, é um golpe”, conta Letícia, “acho que, de alguma maneira, meu disco mostrou que ‘caralho, a gente tá na merda mesmo’, né? Mas a gente vai desistir? Não. A gente vai rebolar, a gente vai dançar, a gente vai rir, se apaixonar. Eles querem mais é que a gente vire zumbi, viva no modo automático dos boletos. Mas a gente ainda tem muitas emoções e sensações, acho que o meu disco deu uma catalisada nisso tudo”. “São onze músicas em um momento que o Brasil queria ouvir isso”, ela sintetiza.

Seu catalisador é o resultado de muitos elementos que cercam seu trabalho, da escolha de palavras na mensagem à forma com que ela é interpretada no disco, nos vídeos ou nos shows. “Antes de me achar cantora, sou artista”, ela explica, “calhou de algumas expressões minhas virem em forma de letra e melodia, de uma canção. Mas acho que, genuinamente, me enxergo mais como escritora, meu lance é escrever. Ainda me acho super engatinhando em música. Tô aprendendo, me coloco pra jogo, tô aqui pra tentar melhorar, mas eu acho que eu tenho uma visão mais de uma pessoa que escreve. Sou muito observadora, escrever me ajuda a raciocinar, parece que me entendo melhor”.

“Acho que, de alguma maneira, minha poética tenta passar isso pras músicas. É claro que as preocupações musicais, de arranjo e melodia, passam pela minha cabeça, mas o que passa primordialmente é a historinha que eu vou contar, uma poética. E acho que as pessoas percebem que tem uma verdade ali, não é só ‘olha, agora é o refrão, agora é aquela parte que explode’ (risos). Não tem uma fórmula, é uma coisa que precisa passar pela minha emoção e pela minha sensibilidade. Por isso que as pessoas se sensibilizam a isso também, eu acho”.

Letícia entrou na faculdade de Letras, mas achou “muito normativa, pouco poética” e largou para estudar teatro, onde encontrou melhor sua voz como artista. “Foi lá dentro que encontrei a música”, diz ela, “acho que ali que eu aprendi não que eu seria atriz, mas que eu seria uma cantora com uma outra base de palco, que eu iria encará-lo de uma outra maneira”. Conhecer esse detalhe de sua biografia ajuda a explicar não só o sucesso que Letrux tem encontrado, mas também a natureza múltipla de suas canções.

Nascidas de uma fase pós-divórcio, as músicas brincam com sinceridades e ousam dar suas caras aos tapas de uma maneira – sim – teatral, mas também bastante sensível. A experiência se completa musicalmente com ambientações que evocam sons divertidos e nostálgicos – “As pessoas identificam muitas reminiscências dos anos 80 no disco, mas eu acho ele muito contemporâneo. Ele fala de coisas atuais, ele é o que tá rolando agora. Mas nós da banda fomos todos crianças e adolescentes nos anos 80 e 90, então tem lembranças, sinto que até mais dos anos 90” -, uma leitura carismática e honesta que só uma mente que se abriu à vida consegue gerar. “Sou muito eclética e muito aberta a me emocionar”, conta Letícia, “tenho pavor dessa coisa ególatra de ‘só gosto de quem parece comigo’ – claro que não”.

Estar aberta às próximas experiências vividas é também uma qualidade que colabora com o tesão de viajar pelo Brasil e tocar em tantas estruturas diferentes, de situações como o XXXBórnival e a Virada Cultural em São Paulo como locais bem menores. “Sinto que cada show é um show. Em um festival é uma coisa, em teatro é outra, em um inferninho… cada lugar tem sua dinâmica”, explica Letícia, “isso é bom porque a gente não enjoa, a gente nunca faz o mesmo show. Uma menina foi em um show em um teatro, depois foi na virada e falou ‘Meu Deus, parece que eu vi dois shows diferentes’. Fico feliz quando falam isso”.

“Nesses festivais tem mais jovens, porque é madrugada, é um perrenguinho que, sei lá, uma pessoa de 50 anos não quer passar. Mas quando a gente tem a oportunidade de tocar em um lugar mais democrático, ao ar livre, eu percebo como nosso público é diversificado. Tem casais LGBT mais velhos, mais novos, tem adolescentes… Não tem essa coisa do ‘nicho’”.

Os lugares e as pessoas podem variar bastante, mas o que ela não questiona é que o público que ouve Letrux é aquele que “não precisa do mainstream, que está curioso para saber o que sua vizinha está gravando” – isso mesmo em um momento quando ainda tem gente esbravejando que não existe música boa no país, como ela mesmo lembrou. “Eu acho que essa pessoa tá vivendo em outro planeta, eu não sei nem por onde começar a explicar”, ela conta, “é claro que você pode ouvir The Beatles, eu também acho Abbey Road uma obra prima, mas é só abrir a cabeça um pouquinho. Tem tanta coisa boa acontecendo”.

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ARTISTA: Letrux, Letuce
MARCADORES: Entrevista

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.