Lord Apex fazendo a sua cabeça

Prolífico MC londrino convida ouvintes para o terceiro volume da série Smoke Sessions e coloca sotaque britânico em referências do East Coast Rap

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Fotos: Jack Cullis

Eu sequer fumo, mas não tem como não chapar no som de Lord Apex. “Muitas pessoas já fumaram marijuana, muitas viram marijuana, mas pouquíssimas pessoas ouviram marijuana”. A skit que abre a faixa “I Need a Light” é a descrição perfeita de Smoke Sessions, série de mixtapes do rapper britânico, que lançou o terceiro volume da coleção em 2021.

Londrino, Lord Apex atravessa o oceano e busca inspiração em Lil Wayne. “Para ser breve, devo crédito ao Wayne. A série Dedication trouxe à vida essa ideia de ter um trabalho que sempre estará lá para os fãs”. De Weezy, ele também importa a veia prolífica e, com apenas 24 anos, tem cerca de 20 projetos já lançados, entre discos, colaborações, EPs e mixtapes – a grande maioria disponível no Bandcamp. Para o artista, o formato da mixtape permite maior liberdade criativa e menos rótulos. “Não precisa ser ótimo, é só o que você sente e o que você quer botar para fora”.

Durante a infância de Lord Apex no lado oeste de Londres, o Grime começava a fervilhar no outro lado da cidade, mais especificamente no bairro de Bow. Hoje, o ritmo britânico originário do UK Garage é a principal exportador de MCs da Inglaterra e, apesar de Apex molhar a ponta do pé na crueza do gênero (“UK Shit”), o lance dele é mesmo o East Coast Rap em sua fase clássica – de Nas a Big Pun –, além de Madlib/Quasimoto, DOOM e essa galera que a gente adora. “Desde que me lembro eu amo música, hoje olho pros meus sobrinhos e vejo o mesmo. Um tem três anos de idade, tava chorando e eu coloquei um OutKast, tipo ‘ouve isso mano, é música’ e acho que era o mesmo comigo”.

SENSEI Apex, como também é conhecido, começou a levar a música a sério em 2018, época em que as músicas lançadas por diversão não só recebiam os elogios dos amigos, mas estouravam no submundo do SoundCloud. “Agora toda música que eu lanço eu destruo. Toda batida é destruída, todo mundo é destruído. Apex no topo do topo da lista.” – ele afirma com leve sorriso no rosto, como quem brinca na mesma medida em que acredita nas próprias qualidades.

Entre o primeiro volume da série Smoke Sessions e o mais recente, há uma diferença de cinco anos. Quando Lord Apex é perguntado o que mudou nele enquanto artista e músico neste tempo, a resposta é categórica: “tudo”.

Batemos um papo com o MC londrino sobre seu mais novo trabalho.

Como é uma “smoke sessions” perfeita para você? E uma sessão de estúdio? O que não pode faltar em nenhuma das duas?

Você tem que ter uma flor, mano. Boa iluminação. Para mim, hoje em dia, você tem que ter os vinis certos. Eu mantenho alguns sempre próximo a mim. E energia boa, tem que colar de boa.

Sendo de um país que gerou o Grime, quais foram suas principais inspirações para ser um MC de Rap?

Quando eu estava crescendo, tinha muito Grime que era interessante, mas não me fazia querer fazer música, era uma parada mais de boates, festas, mais regional, sabe? Não era nem para ser tão grande quanto é hoje! Sempre foi uma parada num nível underground, até que rolou um rebuff e hoje em dia tá em tudo quanto é lugar, então para mim enquanto criança, nunca me atraiu. Sempre fui atraído por Rap das antigas (early hip hop). Como criança você podia até gostar, mas não teria a experiência completa porque você não estava vivenciando, estava só ouvindo.

Sua música tem uma energia meio tranquilona quase sempre. O que você procura em uma batida quando tá fazendo um Smoke Sessions?

Eu procuro por coisas diferentes. Quando eu escrevi “Vernacular” eu sabia que era diferente. Não muito diferente de mim, porque tipo, meus amigos e todo mundo que me conhece sabe que eu faço freestyles em cima de qualquer coisa, pode ser Country, qualquer coisa. Então é normal para alguns amigos meus, mas meus fãs não me ouvem em muitos sons diferentes. Então eu quero chegar com diferentes tempos para que eu possa dar mais abrangência de quem eu sou. Normalmente vou sempre devagar, então eu gosto de uma parada suave e que soe atemporal.

O produtor Angus Luke sampleou música brasileira no seu trampo. O que você curte de música do Brasil?

Madlib foi a primeira pessoa que me introduziu ao funk brasileiro através do Medicine Show #2 Flight to Brazil (2010) e eu amei de cara, mas ainda não tive a oportunidade de realmente mergulhar na parada.

Sobre escrita de Rap – você disse que faz muito freestyle. O que você valoriza mais quando escreve uma música?

Depende do assunto, mas eu gosto de escrever como se estivesse nas nuvens falando com as pessoas. Não de uma maneira hierárquica, mas é apenas a minha perspectiva: eu olho de cima e consigo ver o que tá rolando. Então eu gosto de rimar assim, sempre olhando para a perspectiva maior, para perceber tudo que tá rolando ao mesmo tempo.

É essa a sensação quando cê tá fumando?

Quando eu tô fumando, é mais a sensação de não ter tempo ou espaço, só o agora.

O que você disse tem uma relação muito forte com meditação, tipo, estar presente no momento. Smoke Sessions e sua arte em si são sempre “Elevation-Meditation”, como indica o nome do coletivo do qual você participa. De onde vem essa energia?

Sempre fui interessado em autoconhecimento, história humana, de onde viemos, tudo sobre história antiga – e conhecer e alcançar a melhor versão de mim mesmo. Antes de eu sequer começar a meditar, sabia que quando fosse mais velho, eu queria ser a versão mais elevada de mim mesmo. É para lembrar todo mundo de fazer isso mas lembrar também a mim mesmo.

Você sempre fala sobre animes sendo uma grande influência. Qual anime seus fãs tem que assistir se eles querem saber mais sobre quem você é?

Eles têm que assistir Gurren Lagann (2017). Todo o conceito por trás, é um dos meus favoritos. A progressão dos personagens, e o personagem principal que vai de nunca acreditar em si e duvidar de tudo para se tornar a pessoa que está no topo. É uma ótima história. Os visuais também são incríveis.

“Gosto de escrever como se estivesse nas nuvens falando com as pessoas. Não de uma maneira hierárquica, mas é apenas a minha perspectiva: eu olho de cima e consigo ver o que tá rolando. Sempre olhando para a perspectiva maior, para perceber tudo ao mesmo tempo”

“EM3” em Smoke Sessions 2 (2019) é uma das suas músicas mais notáveis para mim. Você cobre um monte de tema, até mesmo a saudade do pai e recentemente foi sampleada pelo Brockhampton. Qual a história por trás desse som e o que representa para você?

Representa o maior ponto da minha vida. Tem um momento na vida que você tem que lidar com as responsabilidades e amadurecer (“man up”). Eu senti que eu capturei esse momento em uma música em vez de deixar quieto. A batida era especial porque eu a guardei por uns dois anos – desde o primeiro momento que ouvi eu soube que era especial. Eu não sabia o que fazer com ela, mas sabia que quando o momento fosse certo, seria especial.

Eu conheci seu trampo em Virtual Dojo (2014). Você pode me falar mais sobre esse trabalho em particular?

Virtual Dojo é especial para mim. Para falar a verdade, quando eu era mais novo eu sentia que eu poderia fazer uma tape e essa única tape ia estourar. Então essa foi a primeira vez que eu achei que tudo mudaria. Meio que mudou, mas tipo, eu não conhecia a indústria nem o que tinha que fazer por trás dos bastidores pzra tudo dar certo. Essa foi a energia que eu coloquei. Num “nível SoundCloud” foi um sucesso, muita gente conheceu e gostou, é o projeto que me ajudou a ter shows em Londres e no Reino Unido.

Como você descreveria sua própria música?

Eu acho que é muito comum: você pode meditar com o som, papo reto. Sentar, fechar os olhos e pensar sobre sua vida. É assim que me sinto ouvindo: sempre que estou esquecendo qual é minha missão, eu volto e ouço meus próprios sons. É “música de jornada de vida”, é como eu descreveria.

E qual é sua missão?

Minha missão é mudar o sistema.

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ARTISTA: Lord Apex