“LP2”: American Football Novamente

Banda retorna com álbuns de inéditas dezessete anos depois de seu único lançamento

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American Football é uma banda emblemática da década de noventa, mesmo que com apenas um álbum lançado. Sua carreira é marcada por alguns bons encontros e um timing excelente. O grupo gravou seu primeiro e único trabalho em 1999 e dissolveu-se logo em seguida. Com o tempo, e graças aos insistentes revivals do Emo (que já atinge sua quarta geração) seu debute homônimo American Football tornou-se um clássico: a gênese de um gênero musical que, ao mesmo tempo, engloba e subdivide o Rock em Indie, Emo e Math, enquanto fala sobre os conflitos da adolescência.

Em 2014, assistimos à reunião de seus integrantes originais em uma turnê que contemplava algumas cidades dos Estados Unidos. Tal reencontro parece ter sido frutífero, pois agora, dois anos depois, a banda – praticamente mitológica dentro de seu nicho – acabou de anunciar seu segundo lançamento, igualmente homônimo. Por isso, aproveitamos para fazer uma breve revisão – e reaudição – deste que é um dos álbuns mais importantes do Emo norte americano, e tentar deduzir o que podemos, possivelmente, esperar de seu trabalho inédito.

Uma das características mais marcantes de American Football, o álbum, é condensar-se naquele que talvez seja o principal drama de um adolescente americano: abandonar a sua cidade natal para ingressar em uma faculdade. Tal rito de passagem envolve uma série de questões delicadas, e essenciais para a formação do caráter emocional de uma pessoa. Sair da casa dos pais, distanciar-se do/a namorado/a, interagir menos com os amigos, enfim, o abandono de um território familiar, seguro e confortável forma uma malha intrincada de dramas e soma uma série de coeficientes de conflito emocional. Estes, por sua vez, não são amenizados no outro lado da equação, pois espera-se que o jovem, em sua nova vida, passe a se comportar como um adulto, seja na sua nova casa, seja nos estudos, no emprego ou qualquer ambiente muito mais “sério” e exigente desta etapa de crescimento.

Musicalmente, o álbum apresenta a mesma dose contrabalanceada entre ruptura e ingenuidade. Se, por um lado, não há dificuldade nenhuma em encarar American Football como um expoente do Emo noventista, equivalente a patronos do estilo como Sunny Day Real Estate, de outro, é justamente a inexistência de características marcantes do gênero que torna a banda tão interessante. A ausência de qualquer vestígio de riffs de guitarra distorcida proveniente do Hardcore, a presença de técnicas como o tapping do Math Rock e algumas seções instrumentais lideradas por uma linha melódica de trompete (uma apropriação extremamente ingênua do Jazz que cativa justamente por sua sinceridade), tanto tornam American Football aquilo que é, quanto colocam a banda como um pivô seminal do que viriam a ser dois ou três estilos musicais distintos dentro do Rock Alternativo.

Para o lançamento de American Football (LP2), de acordo com o single I’ve Been So Lost For So Long, podemos esperar a mesma fórmula instrumental de outrora, revisitada tal qual sua versão original. No entanto, parece haver uma diferença. Em seu debute, e num contexto formado por músicos recém ingressos na faculdade, o que chamava a atenção em American Football era justamente a maturidade emocional em relação aos seus conflitos. Se, como disse Nik Silva em seu artigo especial sobre o disco, “a abordagem a estes temas parecia mostrar uma visão mais adulta e madura de como lidar com esses sentimentos conflitantes, por mais que viessem sim acompanhados de certa sensação juvenil”, podemos notar que o segundo álbum da banda, ao ser muito mais orientado para as letras, recai justamente no melodrama. “Doctor, it hurts when I exist” é um dos versos mais marcantes dessa nova fase. Estranho que essa seja a abordagem de uma banda formada por integrantes muito mais prudentes; todavia, talvez a presença de letras elaboradas, em contraponto às genéricas de outrora, venha com a experiência adquirida por Mike Kinsella em todos esses anos como compositor de seus outros projetos musicais.

Como dissemos, há dois anos o grupo resolveu se reunir novamente e fazer alguns shows tocando suas músicas já aclamadas, encontro este que, muito provavelmente, despertou aquela sensação nostálgica de “nós deveríamos fazer isso mais vezes”. Aqui estamos, portanto, com a anúncio de seu segundo trabalho. “I’ve been so lost for so long” canta Kinsella na abertura dessa nova fase do grupo. Se em seu primeiro álbum o músico focava em sua partida de um ambiente familiar em direção a um território desconhecido, talvez esta nova fase diga respeito justamente à sensação de reencontro e de tempo perdido, uma longa jornada de dezessete anos, enquanto a banda se manteve separada.

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MARCADORES: Redescobertas

Autor:

é músico e escreve sobre arte