Manifesto de urgência: CONVID-99

34 artistas de diferentes lugares do Brasil juntam forças criativas e se unificam em compilação pela resistência

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Após trabalhar cinco anos com a Mamba Negra, Victin sentiu falta de um coletivo independente capaz de, além de música, promover expressões libertárias pela cidade de Campinas, no interior de São Paulo. Apesar de seu tamanho e diversidade de vivências – e de estar a 100 km da capital paulista -, a cidade ainda é carente de eventos que esquentem a cena underground e que entreguem ao público maneiras de exercitar a contracultura por meio de arte. Com esse desejo, lá em 2018, nasceu BICUDA: selo, festa e rádio que apresenta trabalhos de artistas de diferentes estados.

Mesmo com as consequências que o isolamento e a falta de calor humano trazem, o tempo urge e o momento pede novas formas de incremento e divulgação da cena. CONVID-99 é um manifesto que extravasa a incerteza e subjetividade de cada artista durante a pandemia e o confinamento. “Tenho uma relação com essas pessoas, acompanho o trabalho delas há um bom tempo. De alguma forma, elas colaboram com o cenário independente no mundo”, afirma Victin, produtor e fundador da BICUDA. Com o distanciamento, programações sendo canceladas e sem uma concreta data de retorno a alguma normalidade, surgiu a necessidade de focar na gravadora e, assim, colocar ideias em prática. “No começo, ficamos desesperados e sem saber o que fazer. Mas temos que pôr a mente para rodar. Além da coletânea, teremos lançamento todo mês”.

CONVID-99 está sendo lançada totalmente independente e as vendas das faixas serão direcionadas para os 34 artistas que vieram de diferentes lugares do Brasil. Você pode ajudar? Corre lá. Se depender da BICUDA, tudo vai continuar como tem que ser: “festejando como forma de combate e resistência”.

Em que cidade você está agora e como está lidando com a quarentena?

Victin: Moro em Campinas, onde a BICUDA foi fundada, mas atualmente estou em São Paulo confinado com amigos. Tenho focado no desenvolvimento da gravadora e tocado meu projeto de gastronomia “vnacozinha”. Devido ao isolamento, preparei uma plantação de legumes e hortaliças para colher daqui uns 3 meses, isso tem me trazido muitos valores.

Bad Mix: São Paulo, alguns dias são bons outros mais ou menos. Resolvi me envolver em projetos e me conectar com pessoas que me fazem bem. Estou com um projeto para o período de isolamento chamado “Collective Impossibility”, que é um disco que tem sido alimentado frequentemente com novas faixas. 

Malka: Sou residente de São Caetano do Sul (ABC Paulista). Tenho passado basicamente a quarentena em casa, como deve ser. Desde o início, saí três vezes, sendo duas por conta do supermercado e outra para encontrar um amigo com o qual estou junto até hoje. Difícil, mas necessário.

Sheefit: Estou em Campinas, cidade em que moro e nasci. Até que estou lidando bem com tudo isso. Costumava achar muito difícil não poder viver apenas da música, mas, nessa circunstância, estou me sentindo sortuda pois continuo trabalhando em casa. Ter uma pessoa incrível e uma cachorrinha maravilhosa ajudam também.

Tellexotica: Em São Paulo tenho muita sorte de ter um quintal. Lidar com a quarentena é para além de uma opção, é um dever social. As relações de subjetividade e coletividade foram atualizadas. Para nós, que dependemos de eventos, a vida segue em um grande limbo.

Perrelli: Sou de Brasília, mas morando em São Paulo no momento. Agora sempre em casa…meu trabalho suspendeu meu contrato e tenho vivido um momento inicial. Acho que como todo mundo ando meio dormente, fazendo muita comida e dormindo com ódio do governo.

Guilherrrmo: Estou em Manaus evitando ficar doente, cuidando da minha saúde e da minha mãe, que mora comigo.

Kauan Marco: Moro em Socorro, interior de São Paulo. Como aqui é uma cidade minúscula e pacata, os efeitos da quarentena ficam um pouco amenizados, então estamos lidando de uma forma um pouco mais tranquila (mas nem tanto).

Saskia: Estou na centrífuga do surto em São Paulo. Estou lidando bem, mas tudo muito confuso pra mim. Me sinto saudável, só estou cuidando para não interferir na saúde de ninguém. Procuro achar meios de rir e fazer as pessoas rirem, sinto que meu propósito com entretenimento está altamente requisitado nos termos atuais.

Violet: Sou de Lisboa, mas humildemente aceitei o convite para estar no meio de tanto talento incrível brasileiro! Por aqui estamos há mais de um mês em quarentena, não tem sido fácil, porque a minha subsistência principal era tocar por todo o lado, coisa que agora não consigo fazer. Isso me preocupa, mas sobretudo, penso nas pessoas por todo o mundo que estão aflitas e afetadas por este vírus… identidades marginalizadas, pessoas com poucos rendimentos.

Ananda: Estou no Rio de Janeiro e lidando de forma bastante reflexiva. Para mim um momento de mudanças exige introspecção.

Qual a sua rotina?

Bad Mix: Minha rotina basicamente tem sido fazer música, limpar a casa, dar aulas por Skype e tentar fazer alguns exercícios.

Malka: Tenho trabalhado muito nas músicas que estou produzindo. Acabei de dar um start no meu álbum, agora ele está feito e pronto para lançamento. Inclusive, estou trabalhando também com outras pessoas em seus registros à distância. Depois caio em algum filme ou série, arrumo a casa e por aí vai… Não gosto daqueles discursos de que “precisa criar um cronograma”, marcar uma hora pra acordar. Eu funciono justamente ao contrário, se não fico me cobrando exatamente de que horas as coisas têm de começar.

Sheefit: Continuo dormindo e acordando cedo.Levanto, faço café ou levo a Beth (minha cachorrinha) para fazer suas necessidades, faço um treino físico de menos de meia hora antes de sentar e começar o expediente no computador. Quando o trabalho termina, sigo com meus projetos musicais ou gravo set para algum podcast.

Tellexotica: Cada dia a programação é diferente. As minhas duas atividades diárias são lidar com a terra e ler sobre feminismo. Cultivar tem sido uma possibilidade incrível de aprendizado. Outra importante é a dedicação total a alimentação como nunca tive antes, tirar o máximo de prazer do alimentar. Ignorar quase todas as redes sociais possíveis também tem sido uma escolha bem consciente na rotina para filtrar o pânico.

Perrelli: Durmo tarde, acordo tarde. Leio notícia, cozinho, faço música, estudo cursos online.

Guilherrrmo: Saio apenas para fazer compras. Tento ficar bem para não deixar a ansiedade dominar, focando muito em produção musical e aprendendo ao máximo antes que a rotina volte para a correria… mas sem forçar muito. Sempre respeitando meu tempo e dificuldades.

Kauan Marco: Está um pouco estranha. Essa sensação de ter todo tempo do mundo para fazer o que quer é meio bizarra. No geral estou produzindo, estudando bastante, bebendo mais que o necessário e vendo vários filmes.

Saskia: Depende. Eu tento manter rotinas de vez em quando, mas nem sempre me atenho a isso. Não seguir uma rotina restrita é um traço que me vem antes da quarentena. Tem coisas que eu acabo por repetir todos os dias que são: tomar café e fazer cruzadinhas quando acordo… tocar piano na sala antes das 22h. O resto eu procuro inventar cada dia.

Violet: Desde que começou a quarentena tento me manter sã através de passeios a pé em zonas sem pessoas. Cozinho absolutamente todas as minhas refeições, o que me tem extravasado minha  criatividade, eu adoro cozinhar e a ideia de combinar sabores. De resto tenho sempre trabalho com a minha editora Naive, e a rádio Quântica também com a minha prática artística…acabar o próximo disco, fazer música para coletâneas como esta e remixes.

Ananda: Estou focando nos estudos e em produção, tentando me manter longe da internet.

Você acha que a cena independente vai conseguir resistir a essa turbulência? Como podemos fazer isso?

Victin: O cenário noturno está sem data concreta para um retorno. As soluções encontradas são os streams diários e os selos talvez ainda estejam pensando melhor em como relocar as produções para rodar. Claro, isso precisa de dinheiro e esse é um momento delicado, mas buscamos fazer o possível para colocar as ideias que estão no papel em prática.

Bad Mix: Acredito que sim, vamos resistir como sempre. Fortalecer ainda mais nosso sentimento de comunidade talvez seja o primeiro passo.

Malka: A cena independente é resistência. Vejo que as soluções surgem de forma espontânea. Ainda não está certo de quanto tempo vai levar até termos shows, mas tenho certeza que as soluções eclodem naturalmente. Inclusive, acho mais fácil o independente resistir do que os artistas de grandes gravadoras que dependem muito da rua para divulgação de seus trabalhos, de produções televisivas, etc.

Sheefit: Campinas já está acostumada a ter que resistir. A crise coloca todo mundo que vive de eventos no mesmo patamar tendo que se virar como pode. Acho que quando isso passar, todos estarão sedentos de festa e pode haver um “boom” inicial poderoso. Mas sinto falta de um senso maior de união, que é uma das únicas coisas boas que uma situação dessas pode revelar. Os coletivos seguem cada um com suas “panelas” e o egocentrismos parecem intactos… com tantas lives de dentro das suas casas sem dinheiro envolvido, os coletivos deveriam variar convidando artistas diferentes e revelando gente que poderia ser melhor introduzida na cena.

Tellexotica: Resistir, definitivamente, não é uma escolha. Quem conseguir vai resistir, mas já é nítido como isso tem afetado principalmente as pessoas do backstage da cena independente (dentre produtorxs, iluminadorxs, fotografxs, técnicxs, segurançxs, caixxs, faxineirxs). Uma classe inteira tendo que se reinventar e descobrir uma nova profissão em meio ao isolamento. Também já é nítido o desmonte de casas menores e independentes, o que me deixa muito preocupada pois a sensação é que todos teremos que recomeçar do zero, seja lá quando isso acabar.

Perrelli: Brasília está cheia de vida e sangue novo pronto para correr pelas veias da cidade. Com certeza isso vai salvar o futuro pós-apocalíptico de lá.

Guilherrrmo: Acredito que sim! A cena aqui em Manaus ainda é pequena e está começando, mas as pessoas têm muita saudade. Acho que isso pode fortalecer e ajudar a valorizar ainda mais.

Kauan Marco: Hoje existe apenas um coletivo que movimenta Socorro, o “Doze”, que eu faço parte. Isso tem nos afetado. Tínhamos uma sala alugada onde fazíamos festas minúsculas (porém intensas), e não foi possível mantê-la; mas acredito que quando tudo isso terminar, todos voltaremos à ativa com uma mentalidade mais madura.

Saskia: O pessoal de Porto Alegre sabe lidar com solidão, isolamento e tédio. Lá é fácil nada acontecer, as vezes é muito frio então todo mundo fica em casa. Acredito que o pessoal lá esteja na mesma. Para exemplificar, saiu a copilation do meu selo de lá Zonaexp. Um selo que tem o Tabu e a Marê como idealizadores. Lançamos um V.A das ultimas produções do pessoal.

Violet: A cena independente de Lisboa é bastante frágil e não tem muitos meios financeiros, nem apoios públicos. Por isso vai ser preciso fazer compromissos e construir um pouco tudo do zero, sem expectativas, apenas amor à causa.

Ananda: Os últimos dois anos foram bem positivos para a cena independente do Rio de Janeiro, e estávamos em um momento importante de formação de público, profissionalização de festas e artistas. Seguimos com um grande desafio pela frente, hora de pensar em outros formatos e dar maior apoio aos artistas locais. Mas, ao mesmo tempo, penso que temos pessoas muito comprometidas em fazer a cena acontecer, que continuarão acreditando e trabalhando por isso.

“A BICUDA é sobre trazer um posicionamento de fala corporal política”—Victin

Me conta um pouco sobre o processo criativo da sua track. Como surgiu?

Bad Mix: ”11 Steps” é uma clássica Acid House track. Resolvi limitar as ferramentas e fazer a música com apenas um sampler e uma tb03. Ela foi gravada ao vivo e a maior parte do processo de edição foi aceitar os felizes acidentes que surgiram durante a sessão. A linha ácida tem uma duração menor (11 steps) que o ritmo de bateria, minha ideia ao fazer foi criar uma sequência que raramente se repete exatamente da mesma maneira.

Malka: “Orca” foi fruto de uma colaboração minha com o Subaze, produtor de Brasília. Enquanto estávamos trabalhando junto no remix da Linn da Quebrada pro Pajubá (Necomancia) também entramos no processo de produção dessa track.

Sheefit: Essa track foi produzida antes da pandemia e do isolamento social, e por uma coincidência, nomeei-a de “Paredes”. Foi inspirada em momentos em que nos sentimos presos emocionalmente por atitudes que não temos forças para vencer, como se fossem paredes. Ela é resultado do meu processo de descoberta e libertação de muitas “travas” mentais. Até poderia explicar de forma mais literal essa “imagem criativa”, mas acho que isso tem que ficar aberto ao entendimento das outras pessoas, quase sempre existem vários sentimentos expressados em uma obra de arte do que a que o próprio autor consegue definir. 

Tellexotica: Essa é minha primeira track. Surgiu da minha vontade de explorar synths e criar um ambiente retrowave, contei com a ajuda e parceria de José Hesse na produção. Usamos alguns timbres do Prophet OB-6, que é um synth feito em colaboração com dois grandes criadores de synth Dave Smith e Oberheim. Pegamos também alguns VSTs e plugins controlados por um Juno.

Perrelli: Assim que começou a quarentena, eu sentei pra fazer música de um jeito que tinha tempo que não fazia. Antes não sobrava muito tempo entre o day job para virar noite, ficar noiando em cima de detalhe, estava sempre meio cansada… agora estou tendo mais tempo e disposição pra ficar umas horas viajando sem me preocupar com horário. Estou botando em prática o que aprendo nos cursos e melhorando minha finalização de mixagem, já que sempre tive bastante dificuldade. O que eu mais curto fazer na música é bateria, então comecei a fazer várias sequências de bateria e estudando o encaixe dos timbres. Deixei na track tudo que tava soando bem pra mim.

Guilherrrmo: Procurei montar um beat mais dançante. Queria algo bem groovado e simples, foi um processo lento no começo, até depois de umas 2 semanas produzindo ela é que boa parte das ideias surgiram. Finalizei ela em umas 2 horas.

Kauan Marco: Como em 90% do que faço…comecei na bateria eletrônica. Senti que a batida não estava pedindo algo muito melódico e harmônico (como minhas músicas geralmente são), então apostei em timbres e ambiências um pouco mais sombrios. Agora, o porque usei a música “In the Hall of the Mountain King from”, de Edvard Grieg, no break, não faço a menor ideia!

Saskia:  Eu estava bem no começo da pandemia, acho que nem tinha sido declarado o começo da quarentena no clima “meu deus, meus 2 meses de agenda sumiram”. Tudo que eu tinha construído em São Paulo, meio que estava desmoronando. O que é engraçado, porque a gente monta o futuro baseado em dados, e de repente, apagaram esses dados. “Você não tem essas datas… Você não esse dinheiro… Você não tem essa passagem”. Então eu entrei em estado de alta percepção do presente. Comecei a deixar minha criatividade fluir livre de profissionalismos e condutas. O clima dessa track foi um grande “foda-se está tudo acabando mesmo”. Eu queria falar o que eu realmente achava, sem ser num texto de rede social. Imprintar minhas emoções e percepções pros robôs e alienígenas que ocuparão a Terra no futuro.

Violet: Eu amo Techno e quando comecei a fazer música para a pista de dança, algumas das primeiras tracks com que fiquei contente eram puramente Techno, com melodias e sound design interessante. Nesta faixa eu queria recuperar esse espírito, pegando um beat forte, consistente e, trabalhando os sintetizadores de forma a imprimir ritmos extra, melodias e alguma estranheza para o ouvinte sentir alguma intriga.

Ananda: Fiz essa música há bastante tempo, nem se pensava em Corona. Lembro que quando a produzi estava com aquele sentimento de energia renovada… que você tem quando toma uma xícara gigante de café bem forte pela manhã depois de dormir bem. Eu estava positiva no dia e acho que você sente isso quando ouve a track.

Quais sentimentos e pensamentos você teve enquanto a produzia?

Bad Mix: O sentimento foi: “tadinho do meu vizinho, o som está alto para p*rra”. Fazer música é o mais próximo que chego em um estado meditativo, então foi um momento de focar na respiração e deixar as coisas rolarem, sem pensar muito no resultado. No fim gostei de como estava batendo… e concluí que seria uma track divertida de mixar com outra numa pista ao amanhecer.

Malka: Tenho muito interesse em colocar sons de animais nas músicas e esse sintetizador, com um som de orca, me incentivou. Amo pegar sons, distorcê-los e modificá-los para criar um sentimento selvagem misturado com a tecnologia do Techno. Quando ouço, enxergo uma orca desbravando o oceano com sua coragem na batalha diária pela vida.

Tellexotica: “Retomada” explora a narrativa de um ambiente distópico e caótico, que encontra uma nova forma de vida pós apocalíptica. Vem da inspiração  Amazonas e a instituição de uma nova era ecológica e matriarcal. Começa com a batalha das guerreiras sereias que, depois da destruição, renascem como lótus, e no sangue perdido se enraízam e viçam. Uma perspectiva da dor e da batalha como alimento místico, revelador. Tangerine Dream é uma grande inspiração musical.

Perrelli: “kkkry” é o que gosto de dançar na pista, e tenho sentido falta de ouvir em som alto de festa. Tem referência de gueto, Club music, Ballroom… e o Acid que é eterno? Saudade de uma pista com som quebrado e jogado.

Guilherrrmo:  A track se chama “Controle”. Escolhi esse nome porque quando estou produzindo ou tocando, não me sinto ansiosa. Considero esse ser o único momento em que realmente estou no controle de algo.

Kauan Marco: Na verdade, eu a fiz antes da pandemia  enquanto estava produzindo as últimas músicas do álbum Histórias, que saiu no final de 2019 pela 40% Foda/maneiríssimo. Logo vi que ela não fazia muito sentido nele, então acabou ficando bem guardada (até agora).

Saskia:  Me senti livre. A comédia me liberta. No meu trabalho eu estava ficando cada vez mais séria – até lançar meu álbum que vai para o âmbito da raiva. Diante de um tema tão absurdo de fim de mundo, pandemia, isolamento, e principalmente a incerteza dessa situação global, eu cheguei na libertação da comédia. Decidi rir disso, documentar e abraçar a situação do que sentir pena dos outros ou de mim. Resolvi rir da cara da humanidade comigo inclusa. E sim, quando eu gravei, estava pensando: “os artistas vão explodir conteúdo agora. É na arte que vai sobrar a humanização, dentro da automação”.

Violet:  Quando isto vai tocar numa pista de dança?! Mas o mais importante é a saúde mental, e o emocional…é daí que vem tudo. Por isso espero que alguém a possa ouvir e sentir-se de alguma forma acompanhado, como se sentiria numa festa.

Ananda:  Essa track é bem feliz e para cima. Imaginei que seria legal tocá-la pela manhã em uma festa com pista aberta. Se tivesse sido produzida agora o resultado seria outro, estou bem menos expansiva neste momento.

“Masterizei 16 faixas do VA. Foi um dos trabalhos de áudio mais legais que já fiz. As faixas são lindas. Foi um privilégio escutar e poder por a mão no trabalho de artistas tão incríveis” — Bad Mix

Um conselho para quem quer trabalhar com produção…

Bad Mix: Comece, termine suas tracks e faça mais. Não se compare com outros artistas e quando não tiver inspiração, foque na parte técnica.

Malka: Repetição. Sempre que possível, trabalhe. A qualidade só vem com uma constante evolução. Procure técnicas novas e caminhos diferentes. Inove.

Sheefit: Não ouvir conselho de ninguém…Brincadeira! Mas, sim, temos que tomar cuidado com conselhos. Muita gente pode acabar te desmotivando, te vomitando um monte de regras ou te assustando com o monte de equipamento caro que, obviamente é maravilhoso ter, mas provavelmente impossível. Quando existir uma ideia na cabeça, use o que tem para colocá-la pra fora. Produzir música não é algo que você faz pra viver, e sim, que vive pra fazer, porque realmente gosta e precisa, porque não consegue ficar segurando esse monte de coisa dentro de você. Não é fácil viver disso dentro do capitalismo, já que tem mais empresários na música do que artista. Apenas tenha consciência disso e deixe seu trabalho fluir como você puder.

Tellexotica: Não ter medo de simplesmente tentar, sentar e gravar.

Perrelli: Não ter medo de ir atrás de informações. Eu tenho muita dificuldade com tecnologia e aprender certas coisas, sempre tenho medo de mexer em programas que não entendo, mas é a única coisa que você pode fazer pra aprender, num lugar onde não se ensina esse tipo de coisa por menos de mil reais. Vai fuçando e apertando botão, abrindo as janelas e apagando sem querer alguma coisa, e prestando atenção em todos os sinais sonoros que você está emitindo alí, o que cada parâmetro faz, as diferenças de corte, frequência, ataque e duração de som.

Guilherrrmo:  Ser consistente, fazer algo todos os dias – nem que seja só pra abrir o programa e fazer um loop. Praticando a gente evolui mais rápido do que imagina. 

Kauan Marco: O conhecimento teórico é fundamental, mas o feeling é realmente essencial. Se suas decisões forem baseadas na teoria, e não na intuição, você virou um robô.

SaskiaPara começar, não sigam meus conselhos. Eu só falo merda. Para continuar, não se obriguem a fazer o que o mundo virtual pede. O mundo social virtual ainda é pequeno diante da nossa existência. Procure fazer o que te contempla fazer, não o que esperam de você. Seja detalhista, esconda informações e curiosidades que só você notaria. Faça da sua arte algo que um computador teria que quebrar a cabeça pra entender. Ritalina ajuda sim. Exagere, amplifique.

Violet: O meu software favorito é o Ableton Live, é o mais fácil de usar, especialmente para quem está começando. Procure dicas de produtoras. Experimente as funcionalidades e divirta-se… a proficiência vem da experimentação!

Ananda: Para mim fazer música é um compromisso de vida, então nada de imediatismos. Foi um processo muito desafiador no início e eu trabalhei, e ainda trabalho muito, a minha ansiedade e insegurança. Hoje em dia é algo que se tornou prazeroso, mas é um processo que exige muita dedicação, paciência e amor.

Sugestões e ideias para o tempo passar mais rápido e não pirar…

Bad Mix: Além do básico: escutar música, dormir, cozinhar e se desconectar. Agora é uma boa oportunidade para se jogar em cursos online e tutoriais, aprender algo novo.

Malka: É um bom momento para aprender a tocar um instrumento. Construa algo a longo prazo, por mais tolo que pareça. Planos assim tendem a manter nossos corações sob controle. 

Sheefit: O segredo é não querer fazer o tempo passar mais rápido, e sim estar mais presente nele. E sempre que puder, ajudar com doações a instituições carentes, consumindo coisas de produtores pequenos e ajudando vizinhos e familiares.

Tellexotica: Cozinhe todas as suas refeições e explore receitas que demandam tempo mais alongado. Transforme aquela sopinha de liquidificador no grande caldo da sua vida. Reduza o dia inteiro. Desenvolva maior consciência do seu lixo, faça uma composteira.

Perrelli: Música salva.

Guilherrrmo: Fazer o que você gosta, mesmo sem se pressionar em ser produtiva ou nada do tipo. Fazer mais coisas por prazer.

Kauan Marco: Um bom revezamento entre lazeres e “obrigações”, e também entre saladas e cigarros.

Saskia: Fuja da repetição, mas não se obrigue a nada. Estipule trabalhos para terminar, mini-objetivos. Eu invento objetivos novos todos os dias. Ainda faço listas do que quero fazer na semana. Tento explorar ao máximo minha capacidade. É um privilégio ser um ser humano, algum dia todos vão deixar de existir. E o que faz de nós tão especiais entre as outras formas de vida? Nós pensamos, nos adaptamos, nó criamos. Então exerça essa humanidade, crie, adapte, pense, filosofe, duvide o quanto der. Não fique em stand by demais, você pode perder sua personalidade.

Violet: Cozinhar, fazer coisas na casa que não gostava tanto. Novos métodos de arrumar livros, discos e objetos pessoais, dar uma conferida nas coisas que temos para doar ou reciclar, ler muito, escrever também. Durante a quarentena criei um grupo de escrita com amigos e fazemos tudo online, é muito massa!

Ananda: Não se cobrar em ser produtivo o tempo todo. Acho sem sentido toda essa necessidade e preocupação em gerar conteúdo. Um dia de cada vez.

Qual a primeira coisa que você quer fazer quando acabar tudo isso?

Bad Mix: Quarentena reversa.

Malka: Ir pra uma festa de Techno de 3 dias.

Sheefit: FESTAAAAAAAAA.

Tellexotica: Encontrar minha família e, principalmente, minhas sobrinhas. Abraçar muito. Encontrar pessoas. Abraçar demais.

Perrelli: Ser mais engajada nas festas… coisa que me afastei um pouco nos últimos tempos por conta do meu outro trabalho.

Guilherrrmo: Dar um abraço super apertado em minha namorada e meus amigos.

Kauan Marco: Sem dúvidas ir a uma festa…uma Bicuda, quem sabe?!

Saskia: Ficar pelada na rua, me esfregar em alguém enquanto eu uso drogas, e gritar no microfone: “vamos tossir uns nas caras dos outros e exercer a liberdade da nossa saúde!”. Também quero fazer uma jam absurda com o máximo de pessoas que der, por várias horas, rolando aquela rotação de instrumentos marota…também usando drogas. Mas, provavelmente, eu vou sair com a câmera na rua e vou gravar videos engraçados. Usando drogas, claro.

Violet: Tenho saudades de estar calma com a minha família, de dizer coisas idiotas e rir muito. Tenho saudades dos meus amigos da música…tocar com eles, colaborar ou só dançar mesmo.

Ananda: Estou com muita saudades de uma pista e de abraçar meus amigos.  Acho que vai ser o momento de se rebelar também. Fora Bolsonaro!

Indique artistas independentes…

Bad Mix: b144, Victoria Ortiz, Dj Due, João Villaça e Otto.

Malka: Badsista, Cashu, Ana Giza, Trinitas, Lua Negra, Luna da Paz, Paulety Lindaselva, Martinelli e Zopelar.

Sheefit: Nem preciso citar todos os artistas que fazem parte ou se apresentaram na Bicuda, né?! Então vou falar de alguns que descobri recentemente ou tem feito parte do meu repertório musical: Makna, Ohm.io, Plpz, Martinelli, MØ.TA, Pablo Wesler e Nisek.

Tellexotica: Isis Passos @isispasz (visuais / luz), Ivi Maiga @ivimaigabugrimenko (visuais / foto), Aretha Sadik @arethasadick (performer / cantora), Lina Kaplan  @_linakaplan (visuais / luz) e Bruna Werneck @brunawerneck (visuais / luz).

Perrelli: Indico toda a galera do coletivo Zona Exp de Porto Alegre. Também o coletivo Caldo e Bicuda de São Paulo. Coletivo SUJO e SNM de Brasília.

Guilherrrmo: vyrus, Lofail, Missa Negra, Mady, Eletrofagg, Chantall e Uyra Sodoma (performer). São todos artistas que tem produzido bastante em Manaus, tanto em música como festas e visuais.

Kauan Marco: Os DJs socorrenses Luska, Higor Mucciacito e Hobb, e alguns produtores que conheci mais recentemente como o Gabto, a Kakubo e Bad Mix.

Saskia:  VICTOR BRITES, GABRIEL KOI, NARA VAEZ, MARCELULOSE, NOSHUGAH, UNA, ZONAexp label, RAIO X label, CHICO composições, IKNAIP, Yan Higa e QTV label.

Violet: Aqui de Lisboa alguns dos meus favoritos são BLEID, Assafrão, Odete, Shcuro, Maria Amor, Luar Domatrix, Phoebe, Ness e Herlander.

Ananda: Artistas do RJ: Performance…Gui Mauad, Una, Shaniqua, Kashlotte, Akira hell, Buraco Negros Cosmos, Yollanda Makeo e Bruxa Cósmica. DJs/lives…Kenya, A hank, Glau Tavares, Andre, Escola de Mistérios, Gabriel Schettini, Peko e DJ Jabour.

O que você costuma ouvir em dias como estes?

Bad Mix: TM404, Susumu Yokota e Microlith.

Malka: Tenho ouvido muito low/no beat. A dupla de discos do Nine Inch Nails que saiu agora, Ghosts V e Ghosts VI, tem feito minha cabeça.

Sheefit: Enquanto estou trabalhando, tenho ouvido as milhares de lives de Techno que os artistas estão fazendo em suas casas. Bossa Nova e MPB clássica também nunca sai de moda por aqui!

Tellexotica: Estou ouvindo o álbum “////” do José Hesse aka Kinkid, meu colaborador nessa track, que vai lançar já já. Também estou descendo até o chão com “Tuck 2 Me” da Mavi Veloso.

Perrelli: Tenho ouvido de um tudo, contanto que seja quebrado. 

Guilherrrmo: Minhas músicas favoritas. Nem estou fazendo pesquisa, apenas ouvindo aquilo que me inspira e que traz sensações fortes – sejam elas boas ou ruins.

Kauan Marco: Tenho escutado muitos sets….Higor Mucciacito, Luska, Hobb, Vermelho, Trepanado, também algumas lives como a do Zopelar, Érica e Gabto.

Violet: Hip Hop, Jazz, House…um pouco de tudo!

Ananda: Tenho ouvido algumas coisas de Jazz contemporâneo que tenho curtido  como Kamaal Williams, Christian Scott…

Um recado para o mundo…

Victin: Se valorizem, se encontrem. Esse momento forçado foi um alerta para nos conectarmos com nós mesmos e descobrirmos o amor nas pequenas coisas.

Bad Mix: O momento pede organização, união e novas formas de pensar. Nos vemos em breve.

Malka: Três em cada quatro doenças pandêmicas que nos assolam vêm dos nossos hábitos de comermos carne. Se não mudarmos nossos hábitos, a próxima pandemia pode ser muito pior. Deixe seu ego, seu privilégio, e tudo o mais de lado. Pense em como isso afeta a vida de todos, inclusive de quem não come carne. As vezes é mais fácil apontar para um bolsonarista e dizer que ele é contra o isolamento e vai contra os fatos científicos, mas quem continua comendo carne faz exatamente o mesmo quando vamos discutir as causas da epidemia. Abra sua mente, entenda que o planeta e nós somos uma coisa só.

Sheefit: CHEGA DE CAPITALISMO! Uma economia que não resiste às pessoas comprando só o essencial, não pode ser uma economia. Vamos consumir, sempre que possível, dos produtores menores e locais, e boicotar as grandes corporações.

Tellexotica: Fique em casa e armazene toda e qualquer semente (principalmente se consumir produtos orgânicos) – elas podem ser o seu salário numa nova configuração, não tem validade. Sementes crioulas estão ameaçadas pelas grandes empresas de agrotóxicos, e depende apenas de nós preservar essa ultra tecnologia ancestral de alimento.

Guilherrrmo: É uma boa hora para cuidarmos de nós e revermos tudo em nossas vidas. O que está acontecendo é mais uma prova de como as coisas podem mudar de uma hora para outra. Vamos cuidar e valorizar o que temos.

Kauan Marco: Valorizem os artistas locais.

SaskiaAGORA É O MOMENTO DE VOCÊ ABRAÇAR SUA LOUCURA E ESQUECER DAS REDES SOCIAIS. DEIXE SUA INVENÇÃO NO MUNDO, AJUDE AS MÁQUINAS A TEREM CRIATIVIDADE.

Violet: Ame sua irmã!

Ananda: Chegou a hora da revolução. Assim que isso passar é hora de colocar fogo no parquinho!

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