Playlist da Vida – Akin Deckard

Elis Regina, Miles Davis, Sade, New Order, Faith No More, “Blade Runner”

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Fotos: Ivi Bugrimenko

Playlist da Vida é um quadro em que convidamos artistas para escolherem as 10 músicas mais marcantes de sua vida.

Akin Deckard é daquelas pessoas que fazem de tudo um pouco. Pouco não. De tudo, muito, vamos dizer. Ele é curador musical, diretor de arte, DJ, produtor do selo Domina (Rio de Janeiro) e co-fundador do núcleo Metanol FM, coletivo de festas de rua e rádio online pioneira na difusão da produção eletrônica contemporânea brasileira.

Desde pequeno se lembra de ter um rádio ligado ou um disco tocando. Akin cresceu em uma casa musical, variando entre os álbuns de Elis Regina de sua mãe e a coleção de Jazz, Rock e Soul de seu pai. “Não me recordo de qual foi o último dia da minha vida que passei sem ouvir música”, afirma. “A coisa mais marcante foi quando tinha 13 anos, quando fui ao Rock In Rio II com meu pai. Eu já ouvia bastante música na época, mas foi a primeira vez em que vi um show ao vivo e isso mexeu muito comigo”.

Quanto mais Akin olha para o futuro de sua musicalidade, mais ele se sente conectado às referências do passado. “É muito revelador perceber que muitos dos artistas desta lista seguem fazendo parte do meu acervo particular em vinil e das predileções estéticas e influência no meu trabalho autoral. Esta seleção representa parte das minhas lembranças particulares mais valiosas, aquilo que de forma sutil ou arrebatadora ajudou a definir quem sou hoje musicalmente.” Para essa edição do Playlist da Vida, perguntamos a Akin quais são os sons que mais marcaram sua trajetória.

Elis Regina – “Um Por Todos”

A primeira artista de quem tive conhecimento na vida foi a Elis Regina. Ela sempre foi a preferida da minha mãe, que se emocionava todas as vezes ouvindo suas canções. Falso Brilhante, de 1976, foi o primeiro disco que coloquei para ouvir em casa quando aprendi a ligar um toca-disco sozinho. Gosto muito da instrumentalização deste disco e, quando comecei a produzir música, na época em que ainda era MC, a primeira coisa que sampleei foi um trecho de vocal e bateria de “Um Por Todos”.

Miles Davis – “Sanctuary”

Em casa, Jazz sempre foi algo sagrado. Era o tipo de som presente quando recebíamos visitas, nas datas comemorativas e no toca-fitas do carro nas viagens de família para o litoral. Miles Davis era o regente máximo do trajeto até Santos via Anchieta, onde parte da minha família morava. Quando estava um dia chuvoso e de trânsito lento, Bitches Brew era o disco escolhido por meu pai. Acho que por seu tom meio espiritual psicodélico, que combinava com aquela pangeia infinda de árvores em meio à neblina e fumaça de ônibus e caminhões. Gosto de imaginar que este disco tem alguma relação afetiva com o fato do meu pai ter largado o seminário para padres após uma viagem de trem ao Chile, onde conheceu o Jazz e experimentou psicotrópicos pela primeira vez. “Sanctuary” é uma viagem de redenção e a minha favorita do disco.

Vangelis and New American Orchestra – “Love Theme”

Filmes de ficção científica sempre foram os meus preferidos. O primeiro que vi no cinema foi E.T – O Extraterrestre, mas quando assisti Blade Runner com meu pai, fiquei obcecado pela trilha sonora, que despertou meu interesse por música New Age, Ambient e trilhas originais de filmes. “Love Theme” está entre as minhas composições preferidas do Vangelis. Toda vez que a escuto, me lembro exatamente da cena entre Deckard e Rachel, o casal mais foda que o cinema de ficção já produziu. Me emociono sempre com o diálogo entre o piano, sax e sintetizadores. Eu poderia morar dentro desta canção.

Michael Jackson – “Bad”

Para as pessoas da minha geração, nascidas no início dos anos 1980, Michael Jackson provavelmente foi o maior artista pop de todos os tempos. Suas músicas sempre causavam um frenesi nos amigos pretos como eu, como se todo mundo fosse imediatamente tomado por uma vontade incontrolável de dançar quando tocava alguma do Michael. Meus pais já tinham o Thriller e Off The Wall em casa, mas Bad foi o primeiro disco que comprei na vida, na sessão de música do antigo Mappin, loja de departamentos que ficava no centro de São Paulo. A batida meio slow electro, meio funky soul estelar de “Bad” é infalível.

New Order – “Ceremony”

As primeiras festas que frequentei na pré-adolescência eram chamadas de Baile da Vassoura, reunindo todos os amigos da minha idade num bailinho onde quem ficava sozinho na hora da lenta, dançava com uma vassoura como forma de consolação. “Blue Monday”, “The Perfect Kiss” e “Bizarre Love Triangle”, do New Order, sempre rolavam nesses bailinhos. Minha escolhida do disco é “Ceremony”, uma balada shoegaze que tocava no encerramento do Grito da Rua, programa de skate que assistia religiosamente todos os domingos e que me deixava pilhado a andar ainda mais. Já encerrei muito set em vinil com esta.

Faith No More – “Epic”

Nunca tinha ido em um show ao vivo, até meu pai me levar ao Rock In Rio II. Uma tia prima trabalhava na produção na época e ganhamos um passe livre para todos os dias do festival. Na ocasião, o Faith No More se apresentaria pela primeira vez no Brasil, numa data da turnê do disco The Real Thing. Entre os shows de Rock infinitos do rolê, o Faith No More foi o que achei mais alucinante. Aquela sonoridade funk metal da faixa “Epic”, com uns pianos bonitos no meio, me pegou de jeito no show do Maracanã.

Run DMC – “My Adidas”

Outro grupo que conheci ao vivo no Rock In Rio II foi o Run DMC, primeiro show de Rap que assisti na vida. Depois de dias vendo bandas tocarem no festival, perguntei ao meu pai como três pessoas sozinhas estavam fazendo tanto som naquele palco gigantesco, sem banda nem nada. Foi quando ele me explicou o que era um DJ, aquele cara que soltava as bases para os MCs cantarem e ainda fazia uns arranhados de efeito por cima. No dia seguinte falei pro meu pai que precisava muito de um tênis da Adidas, influência direta do momento em que eles cantaram “My Adidas”, erguendo os pares brancos de Superstar na mão.

Hip Hop Cultura de Rua – “Homens da Lei”

Uma prima me presenteou no Natal com essa coletânea uma vez, que tenho e toco até hoje. Na época eu já andava de skate na rua e era comum tomar geral da polícia por qualquer motivo. Toda vez que isso acontecia, eu lembrava da ideia do Thaíde na faixa “Homens da Lei”. Foi a primeira vez que senti a personificação dos meus dramas da adolescência em forma de canção, como um manual de sobrevivência para seguir sempre esperto a respeito das estruturas de opressão que nos rodeiam. 

Kraftwerk – “The Telephone Call”

Espero que minha mãe não leia isto, mas a partir dos meus 15 anos comecei a usar identidade falsa para parecer mais velho e entrar nos rolês. Nos meados de 1990, caí num lugar chamado Espaço Retrô, reduto underground que ficava na Santa Cecília e que tocava muito EBM, Punk, Industrial e afins. Entre músicas do Soft Cell, Front 242, Depeche Mode, Siouxsie and the Banshees e Joy Division, rolava algumas do Kraftwerk. Pirava muito com a batida e as vozes robóticas sintetizadas ecoando naquela sala de chão quadriculado. “The Telephone Call” era o meu tema e eu tinha até um jeito específico de dançar ela de olhos fechados, quase coreografado, sem perder o ritmo e o centro de gravidade com a cara enfiada no P.A.

Sade – “Smooth Operator”

Sade é música de gente apaixonada. Aquela voz que te abraça numa aura de desejo e sedução. O primeiro disco que comprei foi o Stronger Than Pride. Não a conhecia até então, mas de tão linda comprei pela capa. Depois fiquei obcecado e procurei outros dela, sendo o Diamond Life o último que adquiri quando ainda morava com meus pais. Difícil escolher uma, mas “Smooth Operator” é hit máximo em qualquer ocasião. Quando estiver em apuros para levantar uma pista, toca Sade. Quem não gosta de Sade boa pessoa não é.

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ARTISTA: Akin Deckard