SINAPSE: orquestra improvável

Yuko Mohri, Battles, frutas e forças invisíveis

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Fotos: Mariana Poppovic

Um músico e suas livres associações nas zonas de contato da arte (às quintas-feiras – nesta semana, excepcionalmente, publicada na sexta-feira).

 

DECOMPOSIÇÃO

Yuko Mohri, Battles e as frutas

 

Deparei-me recentemente com o trabalho da artista japonesa Yuko Mohri, que elabora esculturas cinéticas e instalação sonora, explorando a composição de forma experimental. Seu trabalho é visualmente limpo, colorido, embora suas obras se manifestem como redes intrincadas de objetos interconectados.

Uma obra que exemplifica seu trabalho é 3 Musics, que conta com uma partitura e um tocador de fita cassete exibidos na parede. Durante o período em que o distanciamento social foi necessário devido à pandemia, Mohri registrou sua vida de várias maneiras. Neste trabalho, as gravações de campo feitas à época estão presentes no lado A da fita cassete; a música editada em MIDI a partir da gravação e tocada por um piano automático está no lado B. E a fonte sonora do piano é representada por uma partitura, transformando assim sua vida cotidiana em três diferentes formas musicais.

Outro exemplo é Paradeobra que, inclusive, ganhou uma versão brasileira com direito a citação a Tom Jobim –, com diversos objetos e instrumentos ligados a uma partitura-desenho que serve de gatilho para estímulos eletrônicos e automáticos. A escultura se manifesta como uma orquestra improvável: uma sanfona dobra o seu fole, uma baqueta tromba num bumbo, uma colher num pequeno sino de metal, formando uma bagunça sonora autônoma. Embora use maquinário, Parade pretende ser um espaço orgânico florido, porém tranquilo, repleto de som e movimento, inspirado “na poesia dos seres e das coisas”. O título da obra vem da peça do compositor francês, Erik Satie, que criou a “música de mobília“.

Um terceiro exemplo é a obra Decomposition, que traz um trocadilho esperto no seu título. A artista faz um arranjo de frutas, e insere nelas sensores de umidade. O resultado final é algo futurista e laboratorial, frutas coloridas com diversos fios e sensores acoplados. Para Decomposition, Mohri selecionou frutas danificadas de mercados e as conectou a placas de circuito, lâmpadas e alto-falantes. À medida que as frutas se deterioram, seus níveis de umidade mudam, o que por sua vez cria sons e faz as luzes piscarem. Por acaso, Decomposition me lembrou da capa da banda Battles no trabalho La Di Da Di, cuja música, embora seja super elaborada, possui uma tendência laboratorial, em que um estímulo sonoro desencadeia o próximo, resultando em um math rock de cientista maluco.

“Sempre me interessei por elementos instáveis”, diz Yuko Mohri. “Crio a base da instalação, mas como ela reage e se expressa ainda está se desenvolvendo. Há novas frutas e novo clima acontecendo o tempo todo. A estação muda, a temperatura está mudando, o nível de umidade está mudando”. Assim, o trabalho de Mohri se interessa por “forças invisíveis” – gravidade, clima, ar, campos magnéticos – que, contudo, conectam as coisas umas nas outras. Sua pesquisa é tentar entender como manipulá-las, torná-las visíveis e aceitar a nossa falta de controle sobre elas

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Autor:

é músico e escreve sobre arte