Sun Kil Moon e o Outro Lado Do Sonho Americano

Conheça Mark Kozelek, homem por trás da banda

Loading

Mark Kozelek, o cérebro por trás de Sun Kil Moon, é um workaholic. Desde 1992, ele já gravou mais de 40 álbuns, contando, além de sua banda atual, seu primeiro grupo, Red House Painters e trabalhos solo. O sujeito, simplesmente, não para. Pouco mais de um ano após o lançamento de seu último e impressionante disco, Benji, Mark já voltará ao nosso convívio com Universal Themes. Nativo de Massilion, no estado americano de Ohio, aos 47 anos de vida, afirmo que nunca vi Mark pessoalmente ou estabeleci com ele algum diálogo ao vivo, porém, é possível afirmar que ele é um dos artistas mais confessionais que já ouvi em muito tempo de atenção dispensada à música Pop. Aliás, o termo nem cabe no trabalho que ele realiza, nitidamente Folk atualmente, tendo alguns flertes bem sucedidos com o Rock, principalmente com Red House Painters, lá nos anos 1990. É bom que ele esteja sempre por perto.

Digo que conheço Kozelek porque tive chance de ouvir, lá em 1994/95, um disco de RHP, o belo Songs For A Blue Guitar, que chamou minha atenção por conter versões pouco ortodoxas de canções como Silly Love Songs (Paul McCartney) e Long Distance Runaround (Yes), totalmente refeitas e reconsideradas. Depois disso, atraído também pela estética monocromática das belas capas dos álbuns (alô, 4AD!), voltei ao som do grupo, procurando seus álbuns mais antigos (a carreira de RHP começa em 1992) e nunca mais perdi Kozelek de vista até o lançamento do último trabalho da banda, Old Ramon, em 2001. E achei sensacional a sacada do cineasta Cameron Crowe em lançá-lo numa carreira improvável de ator, ao dar-lhe o papel do baixista Larry Fellows, da banda fictícia Stillwater. Numa atitude esperada, ele não parou, logo iniciou uma carreira solo e, em 2003, já estava à frente de Sun Kil Moon, lançando o primeiro álbum, Ghosts Of The Great Highway. O tema de suas canções? Solidão, melancolia, dificuldade em se ajustar aos padrões estabelecidos pela sociedade. Mark é o avesso do astro de Rock, é um cara que pode ser encontrado na esquina, fazendo compras na padaria.

Se o rumo que a produção musical tomou a partir dos anos 1990 feriu a indústria e obrigou os artistas a encontrar novas fórmulas de divulgação de seus trabalhos, gente como Mark Kozelek já largou com vantagem sobre os demais. Dono do selo Caldo Verde Records, ele lança seu material frequentemente e, ao contrário do que a mídia nos faz acreditar, encontra ressonância numa plateia fiel, não só nos Estados Unidos, mas na Europa e Austrália. As letras são confessionais, típicas do homem comum, do cara que nasceu na América mas que, não necessariamente, é um valentão que oprime nerds na hora do recreio ou um brutamontes sem cérebro que vai entrar na faculdade para jogar futebol ou mesmo um reacionário que vai integrar as grandes corporações do país. Mark é um desses sujeitos que vai contra essa lógica, que fica perplexo com massacres e tiroteios em shopping centers e não entende a tal sociedade do espetáculo, optando por não fazer parte dela.

A audição de Benji, no entanto, levou minha admiração pelo cara a um nível ainda maior. Eleito o álbum mais bonito de 2014 aqui no Monkeybuzz, Benji emociona sem que percebamos. É um disco sobre morte, não necessariamente da forma usual, como aparece logo na faixa de abertura, Carissa ou em My Uncle. É um pequeno tratado sobre perdas em múltiplas direções e âmbitos, indo desde a perda da inocência, passando pela perda da virgindade, da juventude, de amigos e circunstâncias que podemos evitar ou não, não sendo bem clara qual a opção menos dolorida. Também é uma reflexão da passagem do tempo e como ela nos afeta a aos que amamos. Kozelek se vale de suas próprias experiências, colocando-se como cobaia de seus próprios pensamentos e usando amigos, pais, namoradas, discos e ícones da cultura pop como testemunhas e referências, com resultado avassalador. Os momentos mais emocionantes são homenagens que faz à mãe a ao pai, reconhecendo amor e cuidado por ambos, revelando também a importância que eles têm, tiveram e terão em sua vida. Recorda da paixão pelo boxe transmitida pelo pai (o nome Sun Kil Moon é referência a um boxeador coreano, morto aos 23 anos) e dos cuidados de sua mãe quando era criança com o mesmo carinho e relevância, em um momento raro para alguém que costuma subir num palco e se apresentar diante do público (curiosamente, Sufjan Stevens, mais jovem que Kozelek, lançou seu novo álbum, Carrie e Lowell, há cerca de um mês, em homenagem aos pais).

Sendo assim, como uma conversa ao telefone ou Skype, Mark Kozelek segue estabelecendo diálogos com seus admiradores. O novo álbum, Universal Themes, já está no horizonte e traz a participação do baterista Steve Shelley, ex-Sonic Youth, que já participou de Benji, mais especificamente na faixa Richard Ramirez Died Of Natural Causes, sobre um serial killer que, após várias condenações, morre por complicações de saúde, ao contrário de suas vítimas de vários amigos de Mark, ao longo do tempo. Apesar de sombrio, o caminho das canções de Kozelek, seja com Sun Kil Moon ou em carreira solo, é totalmente verdadeiro, com zero maquiagem. E vale a pena você conhecer algo tão diferente, ainda que tão familiar, entre as suas possibilidades de ouvir música bela e emocionante.

Loading

ARTISTA: Sun Kil Moon
MARCADORES: Conheça, Novo álbum

Autor:

Carioca, rubro-negro, jornalista e historiador. Acha que o mundo acabou no meio da década de 1990 e ninguém notou. Escreve sobre música e cultura pop em geral. É fã de música de verdade, feita por gente de verdade e acredita que as porradas da vida são essenciais para a arte.