Supergrass: Muito Além de “Alright”

Banda encoberta por alegre hit dos anos 90 é quase sempre esquecida, podendo mostrar fases tristes e psicodélicas

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É inevitável. Ao escutar o nome Supergrass você, quase que automaticamente, se lembra de um dos mais famosos hinos dos anos 90: a faixa Alright (e caso sua nostalgia seja de um nível intenso, você pode até se lembrar do famoso comercial da Intel, que continha a música em questão). É indiscutível que a composição é uma das mais divertidas do Supergrass, entretanto, não se deve pensar que a banda é uma one hit wonder (ou seja, que emplacou apenas um sucesso e sumiu do mapa). Ao contrário dessa ideia, o conjunto lançou sete discos de estúdio, uma coletânea e um disco ao vivo, e portanto, o que todos julgam ser a única faixa que fez sucesso da banda, é, na verdade, uma mínima parcela de todo o trabalho produzido.

Dessa forma, pensando nisso e considerando que a banda, se estivesse na ativa, completaria duas décadas de existência, preparamos um guia pelos seus álbuns de estúdio, comentando os destaques que cada um deles tem para nos oferecer, ofuscados pelo grande sucesso da faixa Alright, de forma a ressaltar os melhores e evitando as faixas mais conhecidas.

O embrião da banda surgiu dois anos antes de seus integrantes se definirem como Supergrass. Fundado pelo vocalista e guitarrista Gaz Coombes e o baterista Danny Goofey, o conjunto se denominava The Jennifers e, após lançar um single, ganhou notoriedade na cena Indie britânica. O proto-Supergrass não durou muito tempo, mas em 1993, o baixista Mick Quinn se juntou ao duo para fundar Theodore Supergrass e, mais tarde, abandonar a primeira metade do nome ganhando o nome pelo qual eles ficaram conhecidos.

Estreando nas paradas britânicas na primeira posição, o primeiro disco, I Should Coco (batizado em homenagem ao Cafe Coco, onde os integrantes se encontravam) rendeu o maior sucesso da banda. O clima feliz e juvenil de Alright se mantém presente em praticamente todo o álbum, o que pode confundir um pouco os ouvintes, considerando-o um álbum infantil. Na verdade, esse é um dos trabalhos do Supergrass que mais rendeu singles, totalizando quatro (um número razoável para um disco de estreia). Portanto não se atenha ao suposto one hit wonder deles. Comece pelas divertidas faixas Mansize Rooster, Lose It e Lenny.

Dois anos depois, a banda mostra um disco que mostrou que o fato de suas músicas serem alegres, não necessariamente traduziam imaturidade. Portanto, ouvimos em In It For The Money ouve bastante exploração de novas estéticas e gêneros nesse trabalho. A primeira música já mostra um ar diferente, evidenciado pelo orgão pesado nos primeiros segundos da faixa que dá título ao álbum. Vêmos uma face que parecia tímida no primeiro registro, mas nesse ficou mais evidente: uma espécie de trip psicodélico. Ainda que esse elemento não se apresente nos mesmo níveis durante as treza faixas do registro, vemos que as experimentações já se elevam. Notamos isso principalmente nos solos viajantes de teclado na faixa Sun Hits The Sky e nas faixas de guitarras repletas do efeito wah-wah em Hollow Little Reign.

Também vale a pena escutar It’s Not Me, Going Out e Richard III. O álbum ganhou um disco bônus em uma edição especial lançada no mesmo nome. Nove faixas, que não entraram na versão oficial, rechearam de psicodelia e alegria o registro, das quais podemos destacar Odd, Sex e Je Suis Votre Papa Sucre. Lembrando que você deve encarar esses dois trabalhos citados como um só, sem pensar que as músicas da edição bônus ficaram de fora por serem ruins (muito pelo contrário, boa parte delas empolga mais do que as da versão simples do álbum). Da fase “alegria psicodélica” do Supergrass, também vale ressaltar o disco Life On Other Planets que ficou conhecido por trazer o single Grace para a televisão com seu divertido vídeo. O trabalho também rendeu excelentes faixas como Brecon Beacons (que talvez seja tão dançante quanto Alright), Can’t Get Up e Run (o auge psicodélico do Supergrass).

Quando tudo parecia caminhar para uma overdose de tanta psicodelia (e possível elevamento espiritual), o Supergrass atinge sua fase mais triste com seus dois últimos discos Diamond Hoo Ha Man, de 2008 e, principalmente em Road To Ruen, de 2005. Seja qual for o motivo dessa mudança brusca de proposta, o fato é que, embora isso possa ter chocado boa parte dos fãs, eles ainda permaneceram fiéis a banda, que conseguiu fazer excelentes composições nesses novos moldes menos alegres e psicodélicos. É claro que não foi possível eliminar o fatores lisérgicos e divertidos assim tão rapidamente, e portanto, encontramos faixas que ainda mantém estes elementos que trouxeram boa parte da fama do conjunto. Composições como Road To Ruen, Diamond Hoo Ha Man e Rebel In You traduzem bastante isso. Mas não é possível negar o fato de que músicas como St. Petersburg, Bad Blood, Fin e Tales of Endurance (parts 4, 5 & 6) causaram uma tristeza no espírito juvenil que víamos nas composições do grupo de outrora. O último disco mostra essa face triste mas de uma forma mais pesada, aparentando que a banda queria ser uma banda de rock bad-ass lembrando alguma coisa de The Subways.

A trajetória do Supergrass parece una jornada lisérgica adolescente. Você está lá feliz e faceiro com seus 15 anos, vivendo sua adolescência cheia de primeiros amores e experiências novas (primeiro disco). De repente você toma conhecimento da droga e os primeiros contatos te levam a incríveis filosofias e novas percepções da realidade (discos da fase psicodélica). Por fim, as ideias se esvaem e começa a fase de depressão pós-droga (ou bad trip), que pode até mostrar sinais de violência (os dois últimos discos, com destaque para a violência no último). Vale a pena mesmo experimentar essa viagem que foram os 17 anos de estrada do Supergrass (e lamentar um pouco o fim das suas atividades em 2010). Viu como não é uma banda de um hit só?

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ARTISTA: Supergrass
MARCADORES: Redescobertas

Autor:

Produtor, pesquisador musical e entusiasta de um bom lounge chique