Tiago Iorc na Estrada: O Caminho É Longo

Músico, com vinte datas confirmadas ao longo das cinco regiões do Brasil, prova que é possível produzir uma turnê independente por aqui

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Fotos: Mariana Marques

Dedicar quatro meses para estar na estrada é algo que nem toda banda consegue fazer no Brasil. No caso de Tiago Iorc, isso é uma realidade não por algum privilégio ou mesmo luxo, mas como fruto de muito trabalho. É que começou em 17 de agosto, em Belo Horizonte, o projeto de levar o show de seu terceiro disco, Zeski, às cinco regiões do país em uma turnê produzida de forma independente pelo próprio músico, com vinte datas já confirmadas até dezembro – um formato não muito comum, mas que se mostra de sucesso desde já.

Diferente da turnê anterior, que promovia o álbum Umbilical, ele viaja agora não só acompanhado da banda, mas conta ainda com dois técnicos, um de palco e um de áudio, para garantir uma qualidade ainda maior nas apresentações e um conforto maior para os músicos – que agora tem mais gente para dividir o peso de todo o equipamento e das responsabilidades. Ou seja, mesmo de forma independente, é uma organização de maior porte do que a vista antes.

Zeski Tour

“Muita gente acha que o Tiago, por ser de uma gravadora, tem uma grande estrutura por trás”, comenta Felipe Simas, empresário e gerente de carreira de Iorc, “e isso existe para os discos, uma estrutura privilegiada para os dias de hoje”, mas quem faz de fato os shows acontecerem é o músico e sua produção. Isso vai de encontro não só à ideia que as pessoas tem de como funciona a dinâmica de um cantor contratado no país, mas também é diferente da postura que muitas bandas e seus empresários tem na hora de marcar shows.

Na maior parte das vezes, os músicos esperam o contato de alguém interessado em levar sua apresentação a alguma cidade para então apenas negociar sua ida. “Eu vejo várias carreiras se esvaindo por conta do empresário ficar esperando o telefone tocar e falar pro contratante ‘não, meu artista só vai pra estrada se você me der tanto’”, conta Simas, “aí, a carreira do cara acaba, porque é na estrada que você ganha fãs e sente o feedback do público”.

”É na estrada que você ganha fãs e sente o ‘feedback’ do público”

Hoje em dia, são muitas as ferramentas facilitadoras para a realização de eventos culturais, desde alternativas como o financiamento coletivo (que não é o caso da turnê de Zeski), até plataformas de vendas de ingressos, como a brasileira Sympla, e a grande audiência conseguida por redes como o Facebook. Então, por que mais bandas não se dedicam à produção independente de seus shows?

Zeski Tour

“É preciso muito planejamento estratégico”, explica o produtor cultural Daniel Lima, nome por trás de diversos eventos com músicos brasileiros, que afirma também que “a maior dificuldade está em se produzir uma turnê rentável”. O público nem sempre percebe, mas existe por trás de cada apresentação os mais diversos custos: “desde a avaliação das necessidades técnicas e operacionais exigidas pela performance artística ao orçamento estimado para cumprimento do itinerário, passando pela formação, contratação e pagamento de equipe, negociação de datas e espaços adequados e toda a logística de transporte, hospedagem e alimentação, dentre muitos outros”, segundo ele, o que torna toda viagem um grande quebra-cabeças para minimizar gastos.

De modo geral, a melhor maneira de trabalhar a contenção de despesas é realizar o maior número possível de apresentações em uma determinada região, diminuindo os custos de deslocamento. É o que bandas como Nevilton fazem desde o início da carreira. “A necessidade”, diz o frontman Nevilton Alencar, “ainda era de fazer público, fazer o show girar, nos tornarmos conhecidos em outras cidades. A questão que tá acontecendo agora é de abrir o leque quanto ao formato, até pra mais shows acontecerem”. Segundo Nevilton, que costuma se apresentar em trio, a possibilidade de levar suas composições sozinho, ou com apenas um dos dois outros músicos, é válida por diminuir os custos e, dessa forma, ampliar as possibilidades de cidades visitadas.

Zeski Tour

No caso de Tiago Iorc, o mesmo acontece – tanto é que o segundo show desta turnê, feito em Recife no último domingo, foi realizado com o músico sozinho no palco. Por conta disso, ele poderá viajar a Manaus, por exemplo (onde se apresenta em 22 de setembro), levar suas músicas a mais pessoas e ter como lucro, além do retorno financeiro (e Simas afirma que todas estas noites são rentáveis), um ganho considerável de novos ouvintes. “A gente percebeu que a carreira de Tiago cresceu de Umbilical justamente pela estrada”, explica o empresário, “você chega e ganha publicidade, as pessoas que vão ao show compartilham foto no Facebook, o impacto na cidade é muito grande”.

Isso é importante para músicos com um comprometimento muito grande com a verdade de seus trabalhos, como é o caso tanto de Iorc, quanto de Nevilton. “Hoje em dia, muita gente produz e distribui pela Internet, não precisa se expor muito e estar na estrada”, diz o último, que continua: “A gente já é mais olho no olho, chega nos lugares e conversa com as pessoas”. O mesmo acontece com Tiago, que não costuma ir embora do teatro ou casa de shows antes de atender todo o público, construindo aquilo que é muito frequente nas conversas sobre a presença de bandas e artistas nas redes sociais: Relacionamento.

”Essa é a necessidade de se estar na estrada, senão a gente cria uma carreira irreal”

“Essa é a necessidade de se estar na estrada”, diz Felipe Simas, “senão a gente cria uma carreira irreal”. Daniel Lima afirma que isso é de muita importância para os músicos: “Atualmente, o maior desafio é justamente trazer para o plano físico esses espectadores virtuais, incutindo afetividade e pessoalidade nessa relação entre público e artista”. Aqueles que se contentarem com a distância segura da tela na relação com os fãs, uma atitude hoje em dia já antiquada, estão fadados à breve vida de uma virtualidade que nunca se concretiza.

“Eu vejo artistas que tem na Internet uma legião de seguidores e eles não tem agenda de show por que tem essa postura”, comenta Simas, “ficam esperando o telefone tocar com restrições pros contratantes”. Remando contra a maré do estrelismo, principalmente por acreditar na força e qualidade de sua arte, Iorc sabe quando arregaçar as mangas e carregar peso pras suas performances acontecerem onde puderem ser apresentadas.

“Nosso lema é trabalho”, brinca o empresário, “se a gente trabalhar e levar esse show para o maior número de cidades, a música vai acabar chegando para as pessoas. Não é da noite pro dia”. E o resultado de tanto suor será visto por milhares de pessoas até o 13 de dezembro, quando Tiago Iorc se despede da turnê em Florianópolis, após quatro meses nos lembrando que o ótimo trabalho visto no palco é consequência de uma também excelente organização nos bastidores.

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ARTISTA: Tiago Iorc
MARCADORES: Turnê

Autor:

Comunicador, arteiro, crítico e cafeínado.